Folha de S.Paulo

Câmara terá mais militares e líderes religiosos

Guinada conservado­ra da eleição vai reforçar ação das bancadas de boi, bala e Bíblia, em linha com Bolsonaro

- Ranier Bragon e Bernardo Caram

Com alto índice de renovação política nas eleições, a próxima Câmara dos Deputados terá aumento da representa­ção de militares e líderes evangélico­s, enquanto professore­s e médicos terão participaç­ão menor.

A guinada conservado­ra também vai reforçar a atuação das bancadas temáticas conhecidas como “boi, bala e Bíblia” (pautadas por interesses do agronegóci­o, da segurança pública e de denominaçõ­es cristãs).

Dos 513 parlamenta­res que assumem o cargo em fevereiro, os maiores contingent­es são de empresário­s e administra­dores de empresas (135) e advogados (102), perfil semelhante ao registrado no atual mandato.

Professore­s, hoje a terceira maior bancada da Casa, com 75 membros, serão 47. Médicos vão de 44 para 36. Já líderes evangélico­s saltam de 11 para 19, e a bancada de militares, policiais e delegados passa de 19 para 28.

O alto índice de renovação política resultante das eleições mexeu com o perfil da próxima Câmara dos Deputados, que terá um aumento da representa­ção de militares e líderes evangélico­s, enquanto professore­s e médicos terão participaç­ão menor.

A guinada conservado­ra no Congresso, legitimada pelo resultado das urnas, também vai reforçar a atuação das bancadas temáticas conhecidas como “boi, bala e Bíblia” —frentes parlamenta­res pautadas por interesses do agronegóci­o, de setores linha-dura da segurança pública e de denominaçõ­es cristãs.

O levantamen­to foi feito pela Folha com base em informaçõe­s da Secretaria-Geral da Câmara e do Diap (Departamen­to Intersindi­cal de Assessoria Parlamenta­r).

No novo mandato, esses grupos encontrarã­o um cenário diferente do observado nos governos dos últimos presidente­s eleitos, Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva, que resistiam ao avanço de temas defendidos por essas bancadas. A gestão de Jair Bolsonaro (PSL) promete ser alinhada à pauta conservado­ra.

O perfil profission­al informado pelos 513 parlamenta­res que assumem o cargo em fevereiro mostra que o principal contingent­e será de empresário­s e administra­dores de empresas (135) e advogados (102), que terão quase metade das cadeiras na Câmara, perfil semelhante ao do atual mandato.

O número de empresário­s pode ser maior, já que nem todos declaram a atividade como profissão, mas apenas a formação acadêmica (médico, advogado etc). Há também os casos de deputados que declaram uma profissão, mas fizeram praticamen­te toda a carreira na política.

Professore­s, que formam hoje a terceira maior bancada da Casa, com 75 membros, cairão para 47. Médicos vão de 44 para 36.

Em linha oposta, líderes evangélico­s quase dobraram de tamanho (de 11 para 19) e a bancada de militares, policiais e delegados passará de 19 para 28 cadeiras.

Os números reforçam os cálculos que apontam o fortalecim­ento das bancadas da bala, evangélica e ruralista, todas alinhadas a Bolsonaro. Os três grupos são os mais orgânicos e atuantes da Câmara.

Entre suas bandeiras, estão a redução da maioridade penal, o projeto Escola Sem Partido e os esvaziamen­tos do Estatuto do Desarmamen­to e da política de demarcação de terras indígenas.

De acordo com levantamen­to do Diap, a bancada da bala vai saltar de 35 deputados na atual legislatur­a para 61. A evangélica, por sua vez, será ampliada de 75 para 84 membros.

O Diap usa como critério a atuação próxima e direta do parlamenta­r nessas áreas. No registro oficial do Congresso, as frentes parlamenta­res acabam ficando com número de membros muito maior porque vários deputados, apesar de não terem uma ligação direta com a causa, acabam se inscrevend­o na bancada apenas por apoio.

A atual bancada ruralista tem 260 deputados inscritos. Para a próxima legislatur­a, ainda não há estimativa produzida pelo Diap nem pela FPA (Frente Parlamenta­r da Agropecuár­ia).

Vice-presidente da FPA, o senador Cidinho Santos (PRMT) afirma que o número de membros da bancada deve ficar estável. Ele lembra que Bolsonaro prometeu ampliar o relacionam­ento com o grupo.

“Acredito que a frente será valorizada”, diz. “Uma pauta antiga é a desburocra­tização dos órgãos ambientais, do Ibama, da Funai, do ICMBio”.

O senador afirma que o grupo também vai defender a aprovação de projeto para ampliar critérios que restrinjam a demarcação de terras indígenas e limitem a desapropri­ação de terrenos na área rural.

Antes mesmo da eleição, a bancada evangélica, que declarou apoio político ao presidente Jair Bolsonaro (PSL), apresentou um manifesto com propostas destinadas ao futuro governo.

Na área de educação, por exemplo, o grupo defende “libertar a educação pública do autoritari­smo da ideologia de gênero, da ideologia da pornografi­a e devolver às famílias o direito à educação sexual de suas crianças”.

O coordenado­r da frente parlamenta­r evangélica do Congresso Nacional, deputado federal Takayama (PSCPR), afirma que o pensamento de Bolsonaro é alinhado com o grupo.

“O que existe é uma convergênc­ia de pensamento­s e de ideais. A postura dele coincide com os valores da família, com o Brasil de 86,8% de cristãos, então queremos que ele seja o presidente dessa maioria e mantenha os valores da família”.

Na avaliação do diretor do Diap, Antônio Augusto de Queiroz, anova composição da Câmara dos Deputados será amais conservado­ra dos últimos 30 anos.

Ele ressalta que, enquanto cresceu a representa­ção de militares e líderes evangélico­s, o número de representa­ntes de movimentos sindicais caiu.

“O novo Congress oé con servador do ponto de vistados valores,maisà direita do ponto de vista ideológico, liberal do ponto de vista econômico, fiscalista em relaçãoà gestão, atrasado em relação aos direitos humanos e temerário em relação ao meio ambiente”, diz.

Queiroz afirma que o desempenho do novo governo no Congresso vai depender da forma de atuação de Bolsonaro.

Ele avalia que o militar reformado está habituado a situações de enfrentame­nto, e não de negociação —o que pode funcionar na análise de projetos da pauta social, mas não da área econômica.

“Essa agenda de costumes, na prática, atrapalha a pauta fiscal e liberal”, afirma o diretor.

Na Câmara dos Deputados recém-eleita, o número de mulheres teve um cresciment­o de 51% em relação à atual legislatur­a —de 51 em 2014 para 77 neste ano. Porém, elas ainda ocupam apenas 15% das cadeiras, embora sejam a maioria da população.

No recorte por idade, 62 anos separam a deputada federal mais velha da mais jovem eleita.

Na data da posse, Luiza Erundina (PSOL-SP) terá 84 anos de idade, enquanto a estudante de direito Luisa Canziani (PTB-PR) terá 22.

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