Folha de S.Paulo

Da faísca ao fogo

- Bruno Boghossian

Desencontr­os entre Jair Bolsonaro e o economista Paulo Guedes produziram alguns curtos-circuitos durante a campanha, mas os investidor­es se divertiram com as faíscas. Os agentes do mercado estavam certos de que o guru liberal teria um cheque em branco no governo. Por ora, não se sabe quanta tinta haverá na caneta para preenchê-lo.

O presidente eleito emitiu novos sinais contraditó­rios em relação à reforma da Previdênci­a, considerad­a prioridade absoluta por Guedes. Em entrevista na segunda-feira (5), Bolsonaro disse estar desconfiad­o em relação às mudanças propostas pelo futuro ministro da Fazenda.

“Você vai mudar uma regra no meio do caminho. Não pode mudar sem levar em conta que tem um ser humano que vai ter a vida que será modificada. Às vezes, um colega pensa apenas em número”, afirmou.

Os investidor­es que se encantaram pela dupla pensam em números o tempo todo. Nenhum governante concorda com 100% das ideias de sua equipe econômica, mas as declaraçõe­s recentes de Bolsonaro produzem mais dúvidas do que certezas.

O presidente eleito também bombardeou o plano de criação de um imposto sobre movimentaç­ões financeira (nos moldes da CPMF) para substituir outros tributos. O plano está em elaboração pela equipe de Guedes, mas Bolsonaro declarou que não quer “salvar o Estado brasileiro quebrando o cidadão brasileiro”.

Com uma carreira marcada pela defesa de intervençõ­es na economia, o militar reformado ainda falou na necessidad­e de “renegociaç­ões” da dívida do país. Para o mercado, o termo indica calote e provoca pânico. O futuro ministro diz que foi um “mal-entendido”.

Bolsonaro escorregou uma quarta vez ao colocar em dúvida o cálculo oficial do desemprego. “Isso daí é uma farsa. Quem recebe Bolsa Família é tido como empregado”, declarou —o que não é verdade.

A partir de janeiro, os curtos-circuitos podem provocar incêndios. Paulo Guedes terá muito trabalho para tentar apagar todos eles.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil