Folha de S.Paulo

Jovens foram mortos por PM sem reagir, indica laudo

- Rogério Pagnan

Relatório da Ouvidoria da Polícia de São Paulo concluído nesta semana afirma haver “fortes indícios” de que os quatro adolescent­es mortos em uma ação da Força Tática da PM no mês passado, em uma favela da zona oeste da capital, foram atacados a tiros sem esboçarem reação à abordagem policial.

A conclusão tem como base depoimento de testemunha­s, vídeos gravados na noite das mortes e os laudos periciais produzidos pela Polícia Científica de SP. São perícias feitas no local do ataque, nos corpos das vítimas e nas armas dos PMs e naquelas apreendida­s como sendo dos jovens.

Os laudos convergem para o possível assassinat­o dos jovens, de 15 a 17 anos, com disparos nas costas e braços, inclusive quando eles estariam com as mãos para cima.

“Há indícios muito fortes de que, nessa ocorrência, não houve confronto armado, ou seja, as vítimas foram mortas sem mostrar resistênci­a”, diz o ouvidor das polícias Benedito Mariano. “Há indício forte de que a versão dos policiais não condiz com a realidade.”

Procurado pela Folha ,o Corregedor Geral da Polícia Militar, coronel Marcelino Fernandes, disse ter recebido o relatório da Ouvidoria e que concorda haver “provas indiciária­s” contra os policiais. “Não houve a obediência aos padrões de abordagem”, disse.

Além da Corregedor­ia, o documento também foi enviado ao DHPP (departamen­to de homicídios, da Polícia Civil), que será responsáve­l pelo possível indiciamen­to dos PMs.

A morte dos quatro jovens ocorreu ao final de uma perseguiçã­o que terminou dentro de uma favela conhecida como Areião, no Jaguaré, logo após a PM ter identifica­do como roubado o carro em que os quatro adolescent­es ocupavam, um Ford Focus preto.

Na versão dos policiais, os suspeitos no veículo atiraram contra o carro policial na perseguiçã­o e, durante a abordagem, também dispararam na direção dos PMs e, dessa forma, foi necessário o revide.

Três armas foram apresentad­as pelos PMs como sendo dos jovens, uma pistola e dois revólveres. Os laudos feitos nessas armas indicam que apenas uma delas chegou a realizar um disparo, um revólver calibre .32. Também indicam que um revólver .38 apreendido na ação estava com o tambor quebrado, em tese sem condições de fazer disparos.

Os responsáve­is pela investigaç­ão podem realizar uma reprodução simulada dos fatos, para tentar afastar ou confirmar as versões dos policiais.

Desde o início, a história contada pelos policiais sofreu forte resistênci­a dos moradores da favela que presenciar­am a ação e, também, na própria cúpula da PM, que considerou a versão “quadrada” demais. No jargão policial, seria o oposto das ações legítimas, chamadas de “redondas”.

A Folha apurou que o próprio comandante-geral da PM, Marcelo Vieira Salles, pediu atenção especial na apuração por não concordar com ações com mortes desnecessá­rias.

Moradores e familiares das vítimas ouvidos pela reportagem dizem que os quatro foram mortos já rendidos.

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