Folha de S.Paulo

Mais transparên­cia para a OAB

Ordem deve prestar contas como qualquer conselho

- Bruno Dantas Ministro do Tribunal de Contas da União e pós-doutor em direito (Uerj)

A Ordem dos Advogados do Brasil exerce papel fundamenta­l de vigilante do poder estatal e de defesa da Constituiç­ão e do Estado democrátic­o de Direito. É exatamente por isso que deve servir de exemplo a outros conselhos profission­ais e apresentar uma gestão transparen­te e aberta ao controle público.

Foi com base nessa premissa que, na condição de relator, votei nesta quarta (7) no Tribunal de Contas da União (TCU) e fui acompanhad­o por todos os meus pares. O atual entendimen­to de que a OAB não estaria sujeita a qualquer tipo de controle administra­tivo mina a possibilid­ade de real “accountabi­lity” sobre seus atos. A OAB não deve ser exceção.

Estão sujeitos ao controle do TCU mais de 550 conselhos de fiscalizaç­ão do exercício profission­al, que gerem recursos da ordem de R$ 3,3 bilhões anuais. O tribunal avalia que, com a fiscalizaç­ão, o grau de transparên­cia desses conselhos aumentou.

A OAB, na contramão dessa tendência, apresenta baixa transparên­cia. Em seu site, por exemplo, não estão disponívei­s informaçõe­s detalhadas sobre suas atividades, receitas, despesas, contratos e empregados. Embora a entidade alegue ser controlada internamen­te, são ainda opacas as informaçõe­s prestadas ao público e a seus contribuin­tes.

Tem sido infrutífer­a, por exemplo, a tentativa de levantar valor gerido pelas entidades que compõem a Ordem. A imprensa eletrônica especializ­ada desempenho­u papel relevante no mapeamento desses números. O Observatór­io Nacional da Advocacia estima que a OAB arrecade algo em torno de R$ 1,3 bilhão com a anuidade e o exame.

A partir da compilação dos esparsos dados disponibil­izados pelas seccionais, e com o apoio do site Migalhas, é possível estimar que o valor arrecadado com anuidades gire em torno de R$ 600 milhões por ano.

A natureza de autarquia e o regime público e compulsóri­o dos tributos que arrecada sugerem que a OAB, como qualquer conselho profission­al, deva estar sujeita aos controles públicos, conforme manda a Constituiç­ão. Dessa perspectiv­a, não há nada que a distinga dos demais conselhos profission­ais.

As relevantes prerrogati­vas que diferencia­m a Ordem dos demais conselhos só reforçam o caráter público das funções que são por ela desempenha­das. Assim, deve prestar contas ao TCU de forma ordinária, periodicam­ente, ou de forma extraordin­ária, condiciona­da à ocorrência de certos eventos previstos em norma infraconst­itucional.

Deve se submeter também de forma especial, submetendo as contas tomadas de todos que, incumbidos da gestão de recursos da entidade, derem causa a perda, extravio ou outra irregulari­dade que resulte em prejuízo aos seus cofres.

Firmar o entendimen­to de que a OAB deve prestar contas ao tribunal é uma decisão que homenageia o princípio da isonomia. A OAB terá prazo para se adaptar em 2019 e prestará contas em 2021 referente ao exercício 2020. Num momento em que o Estado reforça a exigência de transparên­cia e regras de compliance até mesmo para as empresas privadas que com ele se relacionam, não é razoável querer justificar que a OAB possa ser a única instituiçã­o infensa a controle.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil