A difícil relação entre investidores e administradores hoteleiros
O relacionamento entre investidor e administrador hoteleiro foi, é e sempre será conflituoso, como de maneira geral é todo vínculo que envolve dinheiro, lucratividade e necessidade de valorização
Imagine a seguinte situação: um casal está passeando num final de semana em uma cidade de médio ou grande porte e se depara com uma obra com uma enorme placa os convidando a serem donos de um hotel. Curiosos, eles entram num estande de vendas e são abordados por um vendedor muito bem vestido, alegre e comunicativo, que os recebe com taças de espumante, aperitivos e muitas promessas de que o investimento que estão fazendo é seguro e rentável. Ainda indecisos, o casal prefere não assinar nenhum documento, mas, quando fica sabendo que quem vai administrar o tal hotel é uma conhecida bandeira, eles acabam assinando por força de conhecimento e reputação. A logomarca da bandeira no folder, com lindas perspectivas dos ambientes do futuro empreendimento, promete retorno acima de 1% ao mês sobre o capital investido, fatores decisivos para fechar o contrato de compra. E, na empolgação e euforia de que vão ser donos de um hotel, nem que seja de uma pequena parte, e com a garantia do vendedor que é um ótimo negócio, o casal acaba assinando uma pilha de
papéis contratuais sem ao menos ler. Saem do estande cientes de que fizeram um ótimo negócio e ficam ansiosos para contar aos parentes e amigos sobre a nova aquisição. Isso pode parecer uma ficção, mas é uma cena rotineira que acontece em grandes cidades do Brasil, assim como em cidades secundárias e terciárias de empreendimento que são comercializados no modelo do condo-hotéis.
Abusos das incorporadoras e construtoras
Na opinião do Consultor Hoteleiro Mario Cezar Nogalez, os abusos realizados pelas incorporadoras e construtoras são históricos, afinal de contas eles apenas visam o mercado de construção e não o mercado hoteleiro. “Historicamente, posso citar o exemplo dos flats na indústria (1990 a 2005) que elevou o número de UH’s e a disposição no mercado em mais de 400%, fazendo com que o mercado paulista passasse de uma taxa de ocupação média de 70% anual para parcos 25% em poucos meses. Hoje, temos uma nova sacada das incorporadoras e construtoras com a multipropriedade, afinal de contas uma fração pode ser vendida com muito mais rentabilidade à construtora do que uma unidade inteira. Da mesma forma que ocorreu com os flats, a promessa da construtora é um hotel funcional para uso próprio. A questão maior está na localização onde estão sendo construídos estes tipos de empreendimentos fracionais com 13 proprietários por unidades ou mais e, cada um, com quatro semanas de uso por ano. Eles têm pouca ou nenhuma infraestrutura para poder manter sequer o empreendimento funcionando (como água potável, energia etc.) ainda mais com a necessidade de funcionários que tais empreendimentos exigem (a cidade não tem nem a população necessária) e seu grau de conhecimento de operacionalização. Desta maneira, as administradoras contratadas para tais empreendimentos, apesar de terem a operação garantida, terão um enorme esforço para manter os serviços com a qualidade necessária e vendida”, destaca Nogalez.
Segundo ele, outro ponto é a maneira com que as unidades são vendidas quando se tratam de empreendimentos hoteleiros sem participação fracionada. “Eu mesmo recebi convite de uma incorporadora que prometia um aluguel de R$ 1.800,00 por mês com uma taxa de ocupação de 60% e uma diária média de R$ 230,00 (RevPAR 138,00), que obviamente é um aluguel impossível de ser atingido. O pulo do gato neste caso estava no valor do m² da unidade (que era em torno de R$ 35.000,00), mais do que o dobro do m² da região. Obviamente que desavisados não perceberam que a garantia do aluguel no primeiro ano estava atrelada a uma superinflação do m² que, com o investimento correto no mercado financeiro, garantiam este aluguel de primeiro ano. Obviamente que após este ano de operação o aluguel cairia e a culpa seria do mercado hoteleiro... Ou seja, o mesmo modus operandis na construção de flats”, lembra Mario.
Mas afinal de contas, o que é esse tal de condo-hotéis?
Quem explica é Kênio de Souza Pereira, Advogado e Presidente da Comissão de Direito
Imobiliário de Minas Gerais. “Nesse modelo de negócio, o adquirente abre mão do direito de uso, pois se obriga na convenção, no contrato de compra e venda e na escritura, a disponibilizar sua quota – que se baseia numa unidade do hotel – somente no pool de locação, o qual será administrado por uma empresa do ramo hoteleiro. Em troca, o adquirente recebe uma porcentagem do lucro ou arca com o prejuízo diante da baixa ocupação. Na verdade, o que o construtor vende não é uma propriedade, mas sim uma mera participação no hotel, em forma de uma unidade como se fosse um percentual ou quota de um negócio, sobre a qual o adquirente não tem qualquer atuação ou opinião. Deste modo, mesmo que o adquirente não tenha outro lugar para morar, não poderá residir ali, o que afronta o artigo 1.228 do Código Civil, que estipula: “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. Se tivesse realmente adquirido uma propriedade, obviamente, poderia, nela residir. Na maioria das vezes, quem está vendendo a unidade do condohotel nos estandes de vendas, não explica para o adquirente que ele não será proprietário, mas sim um investidor numa prestação de serviços. E que isso pode lhe trazer resultados positivos ou negativos, como se fosse, por exemplo, um fundo de investimento ou um fundo imobiliário. Ou seja, o negócio tem riscos”, explica Kênio.
Segundo ele, como se trata de um contrato de investimento coletivo, ele deveria ser previamente fiscalizado pela CVM — Comissão de Valores Mobiliários, conforme a Lei nº 6.385/76, mas ela demorou anos para se posicionar e, nesse período, muitas unidades hoteleiras foram vendidas com falsas promessas. “Somente em 12/12/2013, a CVM emitiu um alerta
ao mercado informando que os contratos firmados sempre conferem aos investidores o direito de participação nos resultados - positivos ou negativos - do empreendimento imobiliário. Esses resultados são oriundos de atividades como hotelaria, locações comerciais ou residenciais, dentre outras, configurando-se o que a Lei nº 6.385/76 chama de CIC — Contratos de Investimento Coletivo. Estabeleceu ainda que, por se tratar de investimento coletivo, deveria ser por ela aprovada a transação antes de ser oferecida aos possíveis investidores. E esse negócio está sujeito às regras do CDC — Código de Defesa do Consumidor”, esclarece.
Escolha da administradora
Feita a aquisição da unidade hoteleira e a obra entregue, agora vem outra fase na vida do investidor: a contratação da administradora hoteleira que pode ser ou não a que estava mencionada no folder de aquisição anos atrás. Esse novo contrato deveria estar definido e determinado todos os direitos e obrigações entre as partes do pool hoteleiro. Isto inclui a administração hoteleira, com seu plano de contas e forma de distribuição dos resultados, fundos de reserva, taxa de administração, entre os outros requisitos. Através do pool hoteleiro o comprador tem a garantia de participar de todos os resultados que o hotel distribuir para os proprietários, inclusive os resultados do restaurante, da locação das salas de convenções, tarifas de telefonia, entre outros. Mas nem sempre os contratos são formulados de forma tão clara e objetiva. Na maioria das vezes o investidor recebe um contrato engessado através do incorporador/construtor, mas quem vai gerir o negócio é a operadora hoteleira, que herda expectativas que não foram validadas por ela. Com isto, o conflito torna-se inevitável quando as expectativas não são atendidas. A maioria dos contratos que o investidor recebe é típico contrato de adesão. Ou assina ou não fecha o negócio. Não há alternativa nem negociação.
Algo muito importante que a grande maioria dos investidores desconhece é que, para que um contrato clássico de franquia possa ser firmado, a administradora em questão precisa ter registro na ABF – Associação Brasileira de Franquias - cujos critérios de adoção e inclusão são extremamente rígidos, exigindo, inclusive, lastros financeiros de relevante porte. Por essa razão, são usualmente adotados modelos contratuais alternativos que dão outra roupagem à gestão. Em mercados recessivos (caso atual de inúmeras capitais e cidades secundárias do Brasil) o modelo de autogestão (tanto com a adoção de bandeiras hoteleiras pertencentes a administradoras ou quando o próprio hotel cria sua marca) o resultado financeiro auferido em prol dos investidores tem se revelado vantajoso. Muitos chamados “custos das operadoras hoteleiras” são suprimidos em especial os rateios de despesas corporativas.
Relação difícil
O relacionamento entre investidor e administrador hoteleiro é, foi, e sempre será conflituoso, como de maneira geral é todo vínculo que en-
volve dinheiro, lucratividade e necessidade de valorização. Na hotelaria, por vezes, este conflito é acentuado em função de ser um mercado bastante específico, com peculiaridades na sua operação que muitas vezes fogem do entendimento e da compreensão do investidor. Os principais problemas evidenciados nesta zona de conflitos referem-se à apresentação de resultados, prestação de contas e atribuição das funções de cada um destes atores no decorrer do processo de gestão.
E, para evitar que isso ocorra, a escolha do administrador é fundamental. O primeiro filtro deve ser identificar qual administrador melhor se enquadra para o perfil do negócio, levandose em consideração o Tipo (lazer, eventos ou negócios), Localização (Aeroporto, Urbano, Suburbano, Praia, Montanha etc), Classificação (luxo, superior, mediano, econômico ou supereconômico). O segundo passo é, dentre essas administradoras, buscar aquelas que possuam boa reputabilidade no mercado, sendo indispensável uma boa “due diligence” sobre a bandeira prospectada de amplo escopo (corporativa), a qual consiste resumidamente em verificar/determinar: a) conformidade com os governos (Federal, Estadual e Municipal); b) histórico financeiro: incluindo ativos, falências, processos judiciais fiscais e garantias, afiliações corporativas e até mesmo contribuições políticas. Havendo algum ponto de atenção, recomenda-se então uma segunda etapa da “due diligence” (investigativa), realizada por meio de uma análise mais aprofundada de todos os registos da empresa em questão, seguindo por verificações de quaisquer discrepâncias ou omissões.
Contratos padrões
Uma vez escolhida a administradora, se faz necessária a elaboração de um contrato. Para a advogada Márcia Rezeke, Sócia do escritório Rezeke & Azzi Advogados, os contratos de administração seguem certa padronização, considerando que as empresas hoteleiras, que fazem a administração de muitos empreendimentos, necessitam desse formato para uma melhor gestão contratual e, por consequência, dos empreendimentos administrados. “Contratos padronizados são comuns no mundo contemporâneo, não só na operação hoteleira, como em qualquer relação jurídica que envolve uma rede fornecedora de produto ou serviço de forma massificada. Penso que em um contrato de administração de um empreendimento hoteleiro o investidor deve estar suficientemente esclarecido quanto às atividades que serão prestadas pela operadora hoteleira, bem como quanto à forma como os orçamentos serão apresentados e aprovados, e a prestação de contas será feita”, diz Márcia.
No parecer da especialista, não existe uma postura intencional de inserção de cláusulas abusivas nos contratos, mas, por vezes, elas existem. “Acredito que em um contrato de administração de um hotel, a existência de cláusulas que limitem o acesso do investidor ao organograma de cargos e salários de empregados por ele contratados, de gastos com partes relacionadas da operadora hoteleira, que o impeça de questionar determinados gastos que não estão claramente previstos em contrato; ou, ainda, que limitem as informações que serão objeto de prestação de contas poderiam ser enquadradas como cláusulas abusivas”.
Cláusula de performance
Essa é uma forma que muitos investidores encontram para evitar amargar relevantes prejuízos por longos períodos. Muitas operadoras hoteleiras aceitam a inserção desse tipo de cláusula para a administração de determinados empreendimentos, mas isso não é uma regra. “Observo que a aceitação desse tipo de cláusula pela operadora hoteleira depende de sua prévia análise do mercado, da economia do País e do posicionamento existente ou que se pretende dar ao empreendimento”, enfatiza.
“A existência desse tipo de cláusula, no meu sentir, traz conforto ao investidor de que a operadora hoteleira buscará a melhor performance possível para o empreendimento (não que a sua ausência não leve uma operadora hoteleira profissionalizada e bem posicionada no mercado a não fazê-lo), mas isso não me parece que garantirá ao investidor a desnecessidade de aporte. Digo isso porque, normalmente, esse tipo de cláusula traz condições que permitem a rescisão do contrato caso a performance não seja alcançada, seja por uma eventual ineficiência da operadora hoteleira ou por condições de mercado, o que é algo diferente da garantia de desnecessidade de aporte”, revela Márcia.
Transparência na prestação de contas
Essa é a posição de seu colega advogado Camillo Ashcar Neto, Vice-Presidente da InnVestidor – Associação Brasileira de Investidores de Condo-Hotel. Para ele, os contratos que não tenham transparência no tocante à prestação de contas, controle de custos e cláusulas de performance sejam os principais fatores que levam investidores a amargar prejuízos indevidos. Ele destaca as cláusulas mais fundamentais na elaboração de um contrato hoteleiro são: marca, taxas e prazo. “No entanto, a realidade não poderia estar mais distante do que isso, uma vez que os contratos de operações hoteleiras são de grande complexidade e envolvem diversas variáveis, não sendo possível limitar-se a esse tripé de cláusulas como sendo apenas as principais. Além delas, entendo que devem ser alvo de profunda análise cláusulas que tratem sobre:
1. Estrutura jurídica do negócio (Condotel, SPE, Fundo Imobiliário, etc);
2. Orçamento e prestação de contas (processo de aprovação, incentivar planejamento constante, sistema de eliminação de conflitos – Especialista);
3. Empregados (quem empresa, quem paga, quem comanda);
4. Seguros (formação das apólices, custos); 5. FF&E (como funciona, provisão, gestão, conflito de interesses);
6. Capital de Giro (responsabilidade pela manutenção, hipóteses extraordinárias);
7. Licenças (quais licenças, custos, responsabilidades);
8. Multa rescisória (reciprocidade, sistema de eliminação de conflitos – Especialista);
9. Prazo e territorialidade;
10. Hipóteses de indenização (uso do ativo do proprietário em benefício próprio, uso indevido da marca por parte do proprietário);
11. Direitos de término (tem de haver reciprocidade, operador agir contra interesses do proprietário, compromissos de performance, desrespeito aos padrões de qualidade, negligência no processo orçamentário, interferência na atividade alheia);
12. Remuneração das partes (está intrinsecamente relacionado a todos os assuntos acima, principalmente à estrutura jurídica, que deve trazer equilíbrio)”.
E ele alerta que é de fundamental importância ter a supervisão e auxílio de um bom advogado, enquanto o investidor negocia o contrato, considerando os riscos inerentes a qualquer investimento. “Antes de efetivar o investimento, deve-se estudar a fundo o contrato, procurar conhecer bem a construtora/incorporadora, assim como o operador hoteleiro. O investidor deve atentar-se a questões como padrões de qualidade, qual o tipo daquele empreendimento (lazer, eventos ou negócios), pesquisar se sua localização é compatível com a classificação à qual se propõe (econômico, superior, luxo), entender a concorrência da bandeira na cesta primária e secundária de modo a poder melhor projetar futuros resultados. Todos os nossos associados contam com amplo e irrestrito apoio em todos os campos relacionados a investimentos hoteleiros. Sejam dúvidas na fase de prospecção, apoio em relações já estabelecidas, denúncias de situações irregulares ou fraudes. O associado da InnVestidor tem na Associação seu veículo para defesa de interesses difusos. O objetivo da InnVestidor é de oferecer ao associado a orientação que precisa”, lembrou Camillo.
Como são estruturados os modelos de administração de unidades hoteleiras?
Quem esclarece é o Consultor Hoteleiro e Asset manager, Maarten Van Sluys. “O mercado hoteleiro brasileiro, já há algumas décadas, desenvolveu seus próprios mecanismos para viabilizar a administração de empreendimentos hoteleiros. Uma adequação dos moldes mais tradicionais e engessados usados nos mercados amadurecidos como Estados Unidos e Europa deu lugar a diversificações necessárias e customizadas as características dos modelos de gestão que aqui proliferaram. Com o advento dos apart-hotéis e dos posteriores condo-hotéis, estes onde se apresentam os modelos de multi-propriedade (onde o investimento que dá vida ao negócio é pulverizado) surgiu a criativa ideia de modelar a adoção da administração direta tradicional nas hoje consagradas formatações jurídicas denominadas: SCP-Sociedade em Conta de Participação e em menor escala adotando-se a composição de uma SPE Sociedade de Propósito Específico. Nestes dois modelos, dada a pulverização patrimonial do ativo hoteleiro, fez-se necessário dar a roupagem de uma sociedade a atividade, na qual via de regra a administradora é sua sócia-ostensiva (controladora) e os investidores (pessoas físicas ou jurídicas) seus sócios-participantes (outrora chamados de: ocultos, nome pouco apropriado e até suspeito para tal denominação)”, explica Van Sluys.
Ele lembra que esses modelos são comumente adotados em adendo ao contrato de administração através de termos de adesão individualmente firmados entre a sócia-ostensiva e todos os sócios-participantes individuais. O mesmo pode também ser adotado onde, ao contrário dos condo-hotéis e apart-hotéis (outrora chamados de flats) onde o investidor tem a propriedade da unidade hoteleira (apartamento) eles individual- ou coletivamente possam ser
donos de cotas do negócio como um todo. “No Brasil esta modalidade ainda encontra resistência, pois como falamos em nosso dia a dia, os investidores brasileiros priorizam serem donos de tijolos (escrituras) ao invés de papéis (cotas)”.
Como aspectos importantes referentes à modalidade de administração sob forma de sociedade julgo de vital necessidade a adoção de prazos contratuais ajustados a cláusulas de performance. Através delas os investidores poderão avaliar a qualidade da gestão proposta (e raramente bem definida nos termos contratuais) e assim garantirem portas de saída na relação com sua administradora. “A tendência atual são os prazos de três anos (anteriormente víamos contratos de até 15 anos. Isso é uma eternidade para a realidade brasileira!) e as taxas de administração incidirem essencialmente sobre os resultados líquidos (o que vai para o bolso do investidor) e não mais sobre receitas ou resultados operacionais (GOP). Para os condohotéis inclusive as taxas de administrações condominiais vêm caindo em desuso visto que a administração da massa condominial é correlata a administração do pool hoteleiro e normalmente gerida pelos mesmos executivos alocados na operação do referido hotel. Nos últimos anos alguns grupos de investidores têm contratado a administração de redes hoteleiras por poucos anos como uma espécie de “transferência de tecnologia”. Findo o primeiro ciclo contratual no qual através de uma gestão participativa representantes dos investidores (conselhos com o auxílio fundamental de asset managers especializados em hotelaria ou gestores de investimentos contratados). Esses grupos investidores apostam na auto-gestão de seus respectivos hotéis, os resultados têm sido positivos e para suprir uma lacuna de vital importância optam em contratar uma marca reconhecida (das próprias administradoras existentes) pagando seus royalties (taxas de uso da marca), remunerando percentuais sobre reservas advindas das plataformas destas administradoras. E por vezes também fazendo uso mediante remuneração da estrutura comercial das redes. Esse modelo é uma espécie de intermediário entre a administração direta e a franquia como a conhecemos em outros segmentos de negócios”, concluiu Van Sluys.
Cuidados com seu patrimônio
Mario Cezar Nogalez deixa uma dica preciosa: “Os investidores e proprietários devem ter um extremo cuidado ao transferir a administração a terceiros. Muito mais com relação a seu patrimônio do que com resultados, pois resultados financeiros dependem de mercado, infraestrutura nacional e da estabilidade governamental. Como o brasileiro não tem hábito de planejamento, os planos de negócio não passam de estratégias anuais ou bienais e que são apresentadas aos investidores como certa. Outros pontos são certas garantias que são colocadas como pagamento de dividendos de operação e que, na verdade, são dividendos de aplicações financeiras. E quando o contrato chega ao seu fim o empreendimento se encontra totalmente desgastado e defasado com relação a tecnologias, decoração e estrutura predial. Outro ponto são as exorbitantes taxas de cancelamento exigidas pelas administradoras. Não há, em nenhum caso, cancelamento de contrato a custo zero já que um contrato com este tipo de cláusula de cancelamento estaria atrelado diretamente aos resultados obtidos pela própria administradora. Afinal de contas, nenhum investidor trocaria seu administrador que vem tendo excelente desempenho por outro que ainda não conheça (a não ser que seja ludibriado com vantagens que nunca existirão). O que deve então um investidor ou proprietário exigir em seu contrato são as seguintes garantias: Manutenção e atualização da propriedade de forma a manter o produto de acordo com as necessidades tecnológicas e de mercado; Manutenção da qualidade do empreendimento exigindo uma classificação de avaliação da hospedagem nos patamares próximos a nove pontos de classificação nos diferentes meios e redes sociais (como booking.com, tripadvisor etc)”, revelou Nogalez.
Rompimento de contrato
Como a pressão por resultados é muito grande por parte dos investidores e muitas vezes eles não podem ser alcançados em razão de um dado momento econômico, trocar a operadora pode ser a solução encontrada numa assembleia de investidores. Mas, na
maioria das vezes, existem despesas elevadas e desnecessárias. Não são raros casos de passivos trabalhistas gerados de maneira estranha pelas administradoras/bandeiras, além de não realização de manutenções necessárias para que tenham maior lucratividade. O problema é que há casos da edificação se deteriorar a ponto de a administradora deixar o prédio em péssimo estado ao romper o contrato, tendo os adquirentes ou investidores que arcar com altos custos com reformas.
E alguns rompimentos contratuais têm se mostrado verdadeiros casos de polícia. Não obstante já houve casos de administradoras levarem todos os computadores do hotel na calada da noite, incluindo os da recepção, e quando os hóspedes chegaram para fazer o check-in, a nova administradora que havia entrado minutos antes estar sem informação alguma. Outro fato que já aconteceu várias vezes é a administradora que está saindo levar todo o fundo de reposição de produtos e deixar o empreendimento completamente sucateado. “O que vejo, por vezes, é que nem todas as informações constantes da base de dados são disponibilizadas ao investidor, por serem consideradas como elementos componentes do fundo de comércio e clientela da administradora. Isso me parece equivocado por parte da administradora, haja vista que uma administradora integrante de uma rede de marcas e outros empreendimentos têm uma clientela não só ligada a um hotel específico, mas aos seus demais empreendimentos. O que me parece é que precisa estar claro no contrato quais informações serão disponibilizadas ao término dos contratos e a forma como serão. Eu não tenho conhecimento de administradoras que levaram os recursos do fundo de reposição pertencente ao investidor. O que pode ocorrer é que ao término do contrato existam créditos em favor da administradora e as partes ajustam que os recursos existentes no fundo serão destinados total ou parcialmente para a liquidação desses créditos, evitando, assim, a necessidade de aporte pelo investidor para liquidar as relações jurídicas. Por vezes, em operações estruturadas em contratos de sociedade em conta de participação os recursos do fundo, ou parte deles, ficam retidos temporariamente para que
a administradora possa promover a liquidação das obrigações da sociedade, distribuindo o que sobejar aos investidores, sócios participantes de tal sociedade”, ressaltou a advogada Márcia.
Quem é o verdadeiro cliente da administradora? O investidor ou o hóspede?
Esta é uma relação algumas vezes conturbada e se constitui numa zona nebulosa. Além disso, outra questão também pode ser levantada: o hóspede é cliente só da administradora ou é também cliente do investidor? O que existe aí é uma grande diferença deste entendimento dentro da hierarquia de uma administradora hoteleira. Para aqueles que estão envolvidos diariamente na operação de um hotel, ou seja, os funcionários internos daquele empreendimento, o cliente é o hóspede e ponto final. Agora, aqueles que têm cargos mais relacionados à administradora como um todo, que não estão dentro de um hotel e respondem por setores que englobam vários empreendimentos são, em geral, mais próximos dos investidores do que dos hóspedes. Há diretores e até gerentes de administradoras que sequer têm contato com o hóspede. Nestes postos é comum que se trabalhe mais pela satisfação do investidor do que pela satisfação do hóspede.
O fato de a operadora não ter hotéis próprios para servir de exemplo de administração de resultados ou mesmo recursos próprios aplicados no setor influencia de alguma maneira a aplicação do investidor? Quem explica é um hoteleiro que pediu para não ser identificado e que possui um hotel que era independente e lucrativo, mas, como os filhos não queriam tocar o negócio, ele passou para uma conhecida administradora nacional. Não obtendo lucro, passou a administração para uma `grife internacional’ como ele mesmo intitulou, entretanto o lucro também não ocorreu. “Tem muito hoteleiro que perde o emprego, não consegue outro e então resolve montar uma administradora. Através de uma fala mansa, segura, apresentando gráficos e estatísticas do mercado, descrevendo conhecimento em relação ao negócio e vestindo um terno impecável, consegue convencer numa reunião o dono de um hotel que ele é a solução para que seu negócio seja lucrativo. E tudo o que foi feito anteriormente era uma gestão familiar, amadora e que o negócio seria agora administrado por quem tem uma visão profissional e mercadológica. Com este argumento, tivemos uma administradora hoteleira que explorou o quanto pôde nosso hotel, sem apresentar resultados e, para quebrar o contrato, a multa era pesadíssima. No término do contrato só ela teve lucro e tivemos um gasto enorme para repor todo o mobiliário. Confiamos posteriormente a administração de nosso hotel a uma grife internacional que também só deixou prejuízos, pois na verdade eles são meras franquias de marcas internacionais e muito hoteleiro acredita que isto é fator de sucesso, o que não é. Depois de tantas desilusões resolvemos contratar um gestor para administrar nosso hotel, sob nosso olhar atento, e, hoje, ele é muito rentável”, garante a fonte que pediu para não ser identificada e que deixou a pergunta para quem pensa em sair da administração própria para a terceirizada de seu negócio. “Se a administradora não possui um único hotel ou sequer um único centavo investido na hotelaria ela vai conseguir dar rentabilidade ao seu capital aplicado? O risco de avaliação é todo seu”.
Papéis claros na administração
O consultor Luiz Arthur Medeiros, Diretor da Concierge Hotelaria, não vê nenhum problema de uma administradora não ter hotéis ou mesmo recursos próprios e mesmo assim administrar investimentos de terceiros. “Mais uma vez eu bato na tecla da clara atribuição de funções. Papéis claros nas relações comerciais; administradora administra, investidor investe. Simples, não? O que o investidor precisa investigar antes de colocar seu dinheiro na mão de uma administradora é sua idoneidade. Investigar outros empreendimentos nos quais a administradora atua, pesquisar o nível de satisfação de outros investidores, analisar o contrato detalhadamente, pesquisar os empreendimentos que foram da administradora e não são mais. Ou seja, por qual motivo ela saiu do empreendimento, investigar o contrato social da administradora, capital social, enfim, refinar ao máximo a busca por informação para ganhar segurança na hora de assinar o contrato com a administradora”, concluiu Medeiros.