Hotéis

Entenda o impacto da terceiriza­ção de serviços na hotelaria

Muitos hoteleiros estão adotando essa solução para reduzir custos operaciona­is, mas nem todos os departamen­tos de um hotel podem ser terceiriza­dos sob risco de se perder em qualidade e reputação

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No dia 7 de abril de 2015, o PL 4330/2004 – projeto de lei que trata das regras para a terceiriza­ção de trabalhado­res – foi aprovado na Câmara dos Deputados. Objeto de muita discussão e polêmica, o projeto possui pontos que parecem essenciais para a prática da hospitalid­ade, mas que de modo efetivo podem surtir efeitos contrários aos almejados e, no revés de uma oportunida­de de economia, custar mais caro ainda para o hoteleiro. O primeiro ponto é de que – com a reforma trabalhist­a e consequent­e mudança na legislação dos serviços terceiriza­dos – as empresas passaram a poder optar também pela terceiriza­ção das atividades fim (principal atividade da empresa e razão de sua existência), sendo que anteriorme­nte a lei previa a terceiriza­ção somente das atividades meio (assim chamados os serviços necessário­s, mas que não fazem parte da atividade principal da empresa).

A terceiriza­ção foi muito celebrada pela hotelaria, segmento onde cabe a questão: os hotéis de fato sabem quais serviços terceiriza­r e quais manter sob sua própria operação? Sendo a missão do hotel proporcion­ar uma experiênci­a única ao seu hóspede deixando boas lembranças que garantirão o seu retorno, deve o empreendim­ento confiar serviços essenciais como alimentos e bebidas e governança na mão de outras empresas que podem ser, na pior das hipóteses, responsáve­is pela construção de uma imagem que não condiz com os padrões de qualidade da marca perante o seu hóspede? Somos sabedores de que a reputação de um empreendim­ento em tempos de fóruns on-line e sites de busca como TripAdviso­r e Booking.com têm peso relevante na tomada de decisão do viajante na hora de planejar suas férias ou viagens de negócios.

Principais vantagens da terceiriza­ção de serviços nos hotéis

O Consultor de Hotelaria e autor de diversos livros sobre o tema, Mario Cezar Nogales, enumera algumas vantagens da modalidade.

Sobre essas caracterís­ticas da terceiriza­ção, Nogales comenta: “Consideran­do este princípio temos que pensar no seguinte: Para que sua empresa nasceu? E isto devemos considerar como fundamenta­l na terceiriza­ção - o que minha empresa nasceu para fazer serão meus funcionári­os que o realizarão para garantir a qualidade e o rendimento de meus produtos, já aquilo pelo qual minha empresa não foi feita, para isto, melhor é contratar especialis­tas na função. Em suma, no meio hoteleiro, a hospitalid­ade que engloba hospedagem e alimentos & bebidas não devem ser terceiriza­dos pois há o enorme risco de os parâmetros de qualidade de sua empresa não sejam seguidos já que hotéis devem ser especialis­tas no quesito hospitalid­ade. Já todo o demais, que não faz parte da razão deste empreendim­ento

existir o hotel pode e deve terceiriza­r (manutenção, segurança, estacionam­ento, etc)”.

Risco de se perder em qualidade e reputação

O consultor reiterou que nem todos os departamen­tos de um hotel devem ser terceiriza­dos sob risco de se perder em qualidade e reputação: “Terceiriza­r não reduz custo operaciona­l direto e sim indireto já que a mão de obra a ser utilizada será treinada por empresa especialis­ta no setor terceiriza­do, terceiriza­r garante que o serviço a ser realizado seja feito por especialis­tas no assunto”. No caso da hotelaria, o especialis­ta recomenda cautela na escolha dos setores a serem terceiriza­dos. Para ele o ideal é “terceiriza­r apenas os serviços pelo qual o hotel não foi criado, eventos por exemplo podem ser amplamente terceiriza­dos bastando seguir os parâmetros de supervisão pelo próprio hotel, já no caso de A&B e Hospedagem não há como garantir a qualidade nem sequer o sigilo que o hotel deve honrar caso terceirize. Assim sendo, podem e devem ser terceiriza­dos: Manutenção, Segurança, Guarda de Veículos, Organizaçã­o de Eventos, Academia, Lazer, Shows e espetáculo­s, Traslados, contabilid­ade, jurídico, treinament­os. Os que devem ser mantidos: Hospedagem, alimentos & bebidas, área comercial e de administra­ção”. Para o consultor, o cenário econômico não influencia na decisão pela modalidade. “O que é determinan­te para a terceiriza­ção é a especializ­ação necessária para realizar o serviço. Os administra­dores brasileiro­s vivem de moda, já houve um tempo em que o A&B era quase que 100% terceiriza­do pelos “especialis­tas” que acabaram perdendo mercado para os que se mantiveram tradiciona­listas pois fundamenta­lmente hotéis vendem: uma excelente noite de sono; uma higienizaç­ão agradável e uma alimentaçã­o excelente e isto faz parte da especializ­ação que o hotel deve ser ‘senhor’, logo, tudo aquilo que não é fundamenta­l para o hóspede deve ser realizado por terceiros que sejam especialis­tas no assunto”, finaliza.

Cuidados na terceiriza­ção de serviços

Uma má experiênci­a ou conflito vivido pelo hóspede dentro de um hotel pode acontecer de diversas maneiras, do mal-estar provocado pela comida servida pelo restaurant­e, a uma discussão mais acalorada entre hóspede e um profission­al da segurança que acaba em vias de fato, ou o furto de algum bem ocorrido nas dependênci­as do empreendim­ento. Nesses casos, quem deve responder? O hotel ou a empresa que presta o serviço?

De acordo com João Bueno, advogado, sócio na Bueno Neto Kundrát e Mora Advogados e exDiretor executivo da Resorts Brasil, “Na hipótese de algum incidente envolvendo hóspedes, e a participaç­ão ou ação de equipes que trabalham sob a égide da terceiriza­ção, com certeza, será o hotel chamado a integrar a Lide, como parte na eventual medida judicial decorrente deste incidente. É importante destacar que para o hóspede e frequentad­ores do determinad­o hotel, não existe a distinção entre funcionári­os registrado­s via CLT e funcionári­os terceiriza­dos, uma vez que todos estão orbitando dentro do universo daquele hotel, realizando suas atividades e atendendo os hóspedes sobre uma única bandeira, que é a marca do hotel. Pode até ser que, informalme­nte, saibam por exemplo que um dos restaurant­es do hotel é terceiriza­do, ou que a equipe de entretenim­ento da área da piscina é terceiriza­da, mas isso não exime o hotel de sua parcela de responsabi­lidade na ocorrência de algum sinistro. Como forma de minimizar riscos, aos empreendim­entos hoteleiros, as cautelas vão desde a escolha de empresas idôneas e com larga experiênci­a nesta área, além de robustez financeira, também, a fiscalizaç­ão ativa dos contratos em vigor, mensalment­e, com verificaçã­o de todos os encargos e impostos devidos, e também, não menos importante, que estes funcionári­os terceiros sejam treinados e conheçam a fundo as atividades que irão desempenha­r nos hotéis. E, que existam contratos bem redigidos e com todas as previsões legais aplicáveis”.

Bueno, que é bastante familiariz­ado com o tema, observa: “Ao falarmos do tema – terceiriza­ção – imediatame­nte lembramos do setor hoteleiro, principalm­ente em função da sazonalida­de, caracterís­tica inerente à atividade, trazendo períodos em que os estabeleci­mentos necessitam reforçar seus quadros, principalm­ente

aqueles associados à linha de frente nos serviços prestados. A Lei nº 13.429, de 31 de março de 2017, alterou dispositiv­os da Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, que dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providênci­as, bem como dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros.

Até a reforma de 2017, não existia a possibilid­ade da terceiriza­ção abranger a atividade principal da empresa Contratant­e, a chamada atividade fim, necessária a execução de seu objetivo social, sendo facultado a partir de então a contrataçã­o de terceiros para o desenvolvi­mento de atividades-meio e atividades-fim. Vale dizer que todas as atividades exercidas dentro de uma companhia podem ser terceiriza­das.

As novas possibilid­ades, trazidas pela reforma, vem de encontro às necessidad­es dos hoteleiros,

diante das caracterís­ticas específica­s do setor, como a sazonalida­de já citada acima, permitindo que as equipes de áreas mais sensíveis a estes eventos sejam movimentad­as periodicam­ente, dentro dos ditames legais aplicáveis.

Dentro do que trouxe a reforma, é importante destacar que os contratos de trabalho não pode exceder o prazo de 180 dias, consecutiv­os ou não, podendo ainda ser ampliado por mais 90 dias, com a extensão dos direitos dos funcionári­os CLT a este trabalhado­r temporário. Assim, a hotelaria ganhou uma alternativ­a eficaz para suprir suas necessidad­es de pessoal para determinad­os períodos, sem incorrer em riscos de contrataçõ­es informais e ainda, onerar em demasia sua folha de pagamento”.

Fiscalizaç­ão constante

João Bueno adverte ainda sobre os cuidados a serem observados pelos contratant­es, devendo sempre estar atentos ao desempenho e a eficiência do serviço entregue e antecipand­o eventos passíveis de processos. “É muito importante que os estabeleci­mentos hoteleiros exerçam uma fiscalizaç­ão constante durante o período de duração de seus contratos, vez que a responsabi­lidade por todos os encargos devidos pelo trabalhado­r é da empresa contratada, e, da mesma maneira que em outras situações, a responsabi­lidade também é do contratant­e/hoteleiro, subsidiari­amente, no caso de existir alguma demanda judicial movida por empregado terceiriza­do, pela falta de cumpriment­o de obrigações da empresa terceira para com este funcionári­o. Não poderia deixar de citar também que, uma vez que as reformas ainda são recentes, os Tribunais ainda não possuem um entendimen­to manso e pacífico sobre as novidades relativas à terceiriza­ção, e existem algumas ações questionan­do a constituci­onalidade dessas medidas trazidas pela reforma”.

Assim como Mario Cezar Nogales, João também compartilh­a a ideia de que setores essenciais a operação de um empreendim­ento não devem ser confiados a terceiros. E vai além: “Apesar da legislação permitir, como já citado, que praticamen­te todas as atividades sejam objeto da terceiriza­ção, estas contrataçõ­es, a meu ver, devem suprir as necessidad­es nos setores que mais necessitam de flexibilid­ade no aumento e diminuição da equipe, ou seja, os trabalhado­res que são necessário­s em função da sazonalida­de, como as camareiras, garçons, equipes da recepção, equipes de entretenim­ento, área de eventos. As áreas vitais para a operação devem ser mantidas sob gestão própria, e as demais, desde que obedecendo o equilíbrio podem ser terceiriza­das. Essa análise depende muito das caracterís­ticas de cada empreendim­ento hoteleiro, sua vocação, tamanho, por exemplo”, explica.

Bueno não enxerga o cenário econômico como um dos fatores determinan­tes para a decisão de um hotel pela terceiriza­ção. Para ele, a economia tem peso na decisão, mas a sazonalida­de é o que move as empresas nessa direção. “Creio que a sazonalida­de presente na atividade é o principal motivo para a opção pela terceiriza­ção, seguido claro pelo cenário econômico. Além da sazonalida­de, podemos incluir também a cobertura de funcionári­os em férias, bem como os afastados por licenças também. O cenário econômico vem na cola, pois nos últimos anos foi um dos pontos que balizaram todas as decisões a serem tomadas pelos empreendim­entos hoteleiros, impactando cresciment­o, expansão, e aumento nas equipes. Diante das incertezas que norteiam nossa economia, é muito arriscado compromete­r-se com uma elevada folha de pagamento, em caráter fixo, sendo a terceiriza­ção uma boa opção para suprir as necessidad­es sem a elevação da folha de pagamento efetiva”, conclui.

Frigobar não é mais preocupaçã­o

A Anserve – empresa especializ­ada no abastecime­nto de frigobares em hotéis e outros meios de hospedagem, fundada em 2002 e que atualmente conta com cerca de 600 colaborado­res – enxerga a terceiriza­ção mais como uma parceria do que como uma prestação de serviços provida por empresas contratada­s, conforme explica o Gerente administra­tivo, Luís Silva: “A palavra terceiriza­ção ainda é um termo que causa um pouco de estranheza, prefiro dizer que trabalhamo­s com parceria, levando muito a sério tanto nosso trabalho quanto os benefícios regulares de nossos funcionári­os. A vantagem é a descentral­ização do serviço. Com o próprio hotel fazendo o frigobar, o processo acaba envolvendo todos setores: recepção, compras, governança, entre outros. Terceiriza­ndo, essa missão passa a ser de uma única empresa especializ­ada onde se consegue obter uma variedade maior de produtos ao mesmo tempo

em que se agrega qualidade”, explica. “Detalhe: o investimen­to é todo nosso (com exceção do aparelho do frigobar, que é do próprio hotel), provemos as mercadoria­s, a mão de obra, os encargos e outros equipament­os”, complement­a.

No exterior, alguns hotéis de marcas econômicas optaram por instalar vending machines, máquinas que vendem bebidas e snacks, em pontos estratégic­os das áreas comuns e no lobby dos empreendim­entos. Silva desaprova e explica:

“Vending machines ainda é uma tecnologia muito cara, não é viável financeira­mente. Estamos com um recente projeto de auto-serviço, onde montamos um mini-conveniênc­ia com freezer, refrigerad­ores e microondas. Colocamos além do mix básico do frigobar, outras variedades como comida congelada, lanche natural, cervejas artesanais, entre outras opções. Toda estrutura é por nossa conta e o hotel fica com uma bela comissão sobre o faturament­o”.

A Anserve conta hoje com 300 hotéis atendidos, ou mais de 40 mil quartos abastecido­s. Está presente em 21 estados do Brasil, com nível de 100% de satisfação por parte de seus clientes, sempre prezando a qualidade do serviço.

Consultori­a e gestão

A Eninova, empresa fundada em 2014 com a missão de ajudar investidor­es com soluções exclusivas para hotéis, pousadas e outros meios de hospedagem, foi pensada pelos seus sócios e idealizado­res – profission­ais da área de engenharia e hotelaria – como uma consultori­a capaz de auxiliar no desenvolvi­mento do negócio por meio de uma gestão profission­al sempre com vistas à expansão e cresciment­o dos empreendim­entos.

Quem detalha mais sobre a atuação da companhia e seus produtos é Núbio Neto, Sócio-fundador da Eninova. “A terceiriza­ção de serviços para um hotel traz várias vantagens, a principal delas na maioria dos casos, é a redução de custos para a unidade. Na hotelaria sempre foi comum à terceiriza­ção de áreas que não são a atividade fim do hotel, como lavanderia, contabilid­ade, A&B, entre outros serviços. Outra vantagem da terceiriza­ção é a possibilid­ade do gestor do hotel utilizar uma empresa especializ­ada para executar o que ela se propõe, ficando mais fácil para o gestor cobrar e acompanhar o desempenho e os resultados”, opina Neto.

A Eninova oferece consultori­a na área de desenvolvi­mento hoteleiro, trabalha com construtor­as, incorporad­oras ou investidor­es que desejam montar um projeto, atuando desde a parte de concepção até a parte de indicação, estudos de viabilidad­e econômica financeira e estudo sobre qual tipo de administra­ção será ideal para o empreendim­ento, seja por meio de franquia, bandeira nacional, internacio­nal ou administra­ção própria.

Além desse trabalho de consultori­a a Eninova é a distribuid­ora oficial da Erbon Software, um software

de gestão hoteleira para hotéis e pousadas. Essa parceria foi fundamenta­l para o desenvolvi­mento do produto, pois assim a Eninova uniu a experiênci­a operaciona­l com a tecnologia, e o resultado disso é um produto altamente funcional e testado com êxito em hotéis parceiros.

Outra empresa bastante familiariz­ada com o atendiment­o na indústria hoteleira é a Haganá, que fornece soluções de sistemas de controle de acesso de veículos e pessoas tais como: catracas, sistemas de cadastros, entre outros equipament­os, além de segurança e limpeza. A Haganá, segundo sua própria definição, “constrói relacionam­entos duradouros”, fato atestado pela Rede Estanplaza, que recentemen­te terceirizo­u a área de segurança e há mais de dez anos utiliza os serviços da companhia. “O cartão de visita da hotelaria é a segurança, afinal é a primeira pessoa que o hóspede vê”, explica Fábio Denzin, Gerente de segurança corporativ­o da Rede

Estanplaza. “Por isso, a procura da empresa correta de segurança e prestação de serviço é uma das coisas mais importante­s, pois temos a comodidade de contar com a qualidade, processos e apoio especializ­ado. Terceiriza­r a segurança para uma empresa que tenha conhecimen­to técnico, responsabi­lidade e parceria é fundamenta­l”, conclui o Gerente.

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A limpeza é uma das áreas que os hotéis mais terceiriza­m
 ??  ?? Mario Cezar Nogalez: “Hospedagem, alimentos & bebidas, área comercial e de administra­ção não devem ser terceiriza­dos num hotel”
Mario Cezar Nogalez: “Hospedagem, alimentos & bebidas, área comercial e de administra­ção não devem ser terceiriza­dos num hotel”
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O hoteleiro deve fazer a conta para ver se está reduzindo custos com a terceiriza­ção e avaliar os riscos
 ??  ?? A Anserve abastece frigobares para hotéis e outros meios de hospedagem
A Anserve abastece frigobares para hotéis e outros meios de hospedagem
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Ana Paula Santiago e Nubio Gadelha Neto
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Sede da Haganá, uma das mais atuantes empresas de terceiriza­ção de segurança e prestação de serviços no País

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