Eduardo Sanovicz Abear
Opresidente da Abear tem um grande envolvimento com o Turismo. Graduado em História, Mestre e Doutor em Ciências da Comunicação, Eduardo Sanovicz foi diretor de Turismo da Prefeitura Municipal de Santos, diretor de Operações do São Paulo Convention & Visitors Bureau, presidiu a Anhembi Turismo e Eventos da Cidade de São Paulo e a Embratur, e foi diretor da Reed Exhibitions Alcantara Machado. Está à frente da entidade do setor aéreo desde seu início, em 2012 – hoje, a associação é uma das mais atuantes do mercado, debruçando-se sobre questões como a competitividade do setor e o desenvolvimento da atividade turística com um todo.
Hotelnews: Dados recentes da Abear apontaram queda na demanda e na oferta da aviação doméstica. Como avalia o desempenho do setor aéreo em 2016?
Eduardo Sanovicz: A retração da demanda do transporte aéreo doméstico é reflexo da crise econômica, que impacta fortemente o setor aéreo. A desaceleração econômica tornou-se retração e, juntamente com as instabilidades políticas, passou a comprometer a demanda por voos. Como resultado, as pessoas estão viajando muito pouco a negócios, e os viajantes de lazer estão mais precavidos, consumindo menos viagens aéreas, apesar dos preços bastante econômicos que continuam a ser oferecidos. Com isso, se acentua para as companhias aéreas o risco que vinha se desenhando nos últimos anos e que se agravou na segunda metade de 2015: os custos, muito elevados no Brasil, permanecem em alta e as receitas apresentam tendência de queda.
HN: Quais os principais fatores que influenciam diretamente o desempenho e a competitividade do setor?
ES: O principal gargalo do setor são as regras que só existem no Brasil, encarecem o custo da aviação no país e afastam a conectividade internacional, além de prejudicar o ingresso de mais pessoas ao transporte aéreo brasileiro. O Código Brasileiro de Aeronáutica e as condições gerais precisam ser revisados para acompanhar os padrões da aviação internacional e para se adequar ao crescimento que a indústria teve na última década. A revisão viabiliza uma aviação com custos menores e estímulo à competividade, o que abre caminho para uma queda nos preços das passagens e serviços ainda melhores e de acordo com as necessidades de cada passageiro.
Um bom exemplo é o ICMS cobrado sobre combustível de aviação doméstico em cada Estado brasileiro – podendo chegar a 25% –, prática que vai contra todos estes princípios de equiparação aos padrões internacionais. Além do Brasil já ter um dos combustíveis mais caros de todo o mundo, o ICMS encarece os voos dentro do país e não encontra paralelo em qualquer outro mercado desenvolvido de aviação. Prejudica o turismo interno e onera demasiadamente um setor catalisador de atividade econômica, limitando a multiplicação dos efeitos positivos do transporte aéreo.
HN: Como avalia o desempenho do setor aéreo durante a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016? Que legado estes eventos deixaram para o setor?
ES: Como regra geral, nas cidades que recebem os grandes eventos esportivos, há uma tendência de estabilidade nos níveis de demanda em relação aos mesmos períodos do ano anterior. Isso foi verificado na prática na demanda doméstica nacional nos meses de junho e julho de 2014, época de realização da Copa, e se confirmou
no período de realização dos Jogos Olímpicos 2016. A razão é a retração da demanda regular do público corporativo, que normalmente predomina no cotidiano da aviação, que opta por reprogramar compromissos que possam conflitar ou disputar atenção com o evento esportivo.
Além das melhorias na infraestrutura aeroportuária, ficam a qualidade dos serviços e o aprendizado após as suas realizações. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Ministério dos Transportes, logo após os Jogos, o índice médio de satisfação do passageiro em relação aos aeroportos ficou em 4,24, numa escala de 1 a 5 pontos. As companhias aéreas brasileiras registraram pontualidade recorde de 94,8% durante as Olimpíadas, incluindo todas as decolagens domésticas realizadas entre 1 e 22 de agosto. Por longos períodos durante o evento não houve qualquer registro de atrasos. O resultado ficou acima do desempenho da aviação comercial durante a Copa do Mundo de 2014, quando esse índice foi de 91,2%.
HN: Falando em distribuição da malha aérea, que mercados secundários ou terciários hoje demandam mais atenção? Como desenvolver estes mercados?
ES: A condição básica para desenvolver a aviação comercial em uma localidade é ter a demanda para o transporte aéreo. Além disso, é preciso uma infraestrutura adequada para a operação aérea. Para estimular e desenvolver mercados, mais uma vez volto ao tema ICMS. A redução do imposto cobrado sobre o combustível nos Estados é uma iniciativa que reduz custos das aéreas e pode ajudar a ampliar a atuação da aviação naquele local.
HN: Como avalia a situação dos aeroportos hoje no Brasil, principalmente nestes mercados secundários?
ES: Antes de 2002, não se imaginava que a aviação se tornaria um transporte de massa tão rapidamente, o que revelou os problemas de infraestrutura. Quando as autoridades notaram, e só depois de superados os entraves burocráticos, os investimentos começaram a fluir. A Abear entende que a renovação e ampliação os aeródromos públicos garante a qualidade da prestação dos serviços e o aumento da eficiência operacional. Medidas como as concessões são formas de recuperar a defasagem dos investimentos em infraestrutura nos principais aeroportos brasileiros, que foram muito menores do que a expansão do mercado consumidor na última década.
HN: De que maneira o desempenho do setor e a expansão da malha aérea podem impactar outros segmentos do turismo, como a hotelaria?
ES: A Abear lançou recentemente o es
Voar por Mais Brasil, que mostra tudo o efeito da aviação comercial na economia brasileira e no impacto que ela tem no setor de turismo, que muitas vezes é viabilizado pelo transporte aéreo. Ele une os resultados da apuração econométrica realizada pela consultoria GO Associados a análises feitas pela Abear, permitindo a compreensão das condições de cada estado que facilitam ou dificultam o avanço do transporte aéreo. Para cada um deles são apresentados os efeitos diretos (produção do transporte aéreo de passageiros e cargas) e indiretos (demanda por produtos e serviços dos fornecedores da aviação), o efeito renda (consumo dos trabalhadores do setor) e o efeito catalisador no turismo (consumo da parcela da movimentação turística viabilizada pelo uso do avião) que a atividade desempenha.
Como exemplo, somente em 2015, a aviação impactou a produção do Turismo no Brasil em mais de R$193 milhões. Foram gerados cerca de 6,4 milhões de empregos e mais de R$59,2 bilhões em salários, com uma arrecadação de quase R$25,4 bilhões em impostos.
HN: Recentemente, os temas da cabotagem aérea e da política de céus abertos foram debatidos. A cabotagem é uma opção para ampliar a malha aérea brasileira? Como a Abear se posiciona em relação a isto?
ES: “O tema [cabotagem aérea] é vedado na maioria dos países. As companhias aéreas brasileiras poderiam sofrer com uma competição predatória por parte das empresas internacionais de maior capacidade econômica, e que não têm despesas como o ICMS, cobrado apenas em voos de empresas nacionais. A medida, além de abrir a um outro país o maior ativo que o Brasil tem, que é o mercado doméstico, sem que haja reciprocidade, afasta a aviação brasileira do ambiente internacional. Este nível de liberdade aérea acabaria comprometendo a capacidade de sobrevivência das empresas nacionais”.
O principal gargalo do setor são as regras que encarecem o custo da aviação e afastam a conectividade internacional