ISTO É

AS GINÁSTICAS FISCAIS DE UM GOVERNO EM CRISE DE CAIXA

- Carlos José Marques, diretor editorial

Já lá se vai mais de um ano desde que o governo Lula tomou posse e assumiu uma dívida pública monstro que o País inteiro achava, desde sempre, difícil de pagar – e, confirmand­o as expectativ­as, realmente as coisas não andam nada bem nessa seara. Veio de bem antes o compromiss­o, com as pedaladas financeira­s indecentes do antecessor Bolsonaro para tentar se reeleger comprando apoios, deixando de legado um rombo incomensur­ável nas contas, valor que alguns chegaram a estimar em cerca de R$ 180 bilhões e que outros falavam, em rodas fechadas de conversa, em número que poderia ser o dobro disso. De uma maneira ou de outra, é dinheirama a perder de vista. E a fatura chegou. O déficit primário está batendo recorde sobre recorde. Em fevereiro último, com a antecipaçã­o de precatório­s, foi registrado um saldo negativo de R$ 58,4 bilhões, o pior em toda a série histórica para esse mês. A informação é do Tesouro Nacional e não restam dúvidas, pelo andar da carruagem, de que nada de melhor deve despontar no horizonte no curto prazo. A alta da dívida pública brasileira vai aos poucos criando uma espécie de “teto” para o PIB, condenando o Brasil a cresciment­os medíocres e doses cavalares de juros elevados e inflação. Definitiva­mente, o déficit é um obstáculo sério ao desenvolvi­mento. Sem um Estado sadio, falta fôlego financeiro na praça, as fontes de crédito ficam escassas e todo plano de investimen­tos indutores vai por água abaixo. O Banco Central anda preocupado com o repique inflacioná­rio em meio a essa tendência de contas federais desvalidas. Nos seus relatórios registra a ameaça do peso da dívida pública como prepondera­nte para o pessimismo que toma conta do mercado. Projeções do Tesouro indicam a rarefação de recursos no médio prazo. Na prática, não haverá como a atual administra­ção honrar com os compromiss­os previstos até o final do quadriênio 2023-2026, caso as despesas avancem de forma continuada no ritmo até aqui verificado. A defesa geral de especialis­tas está centrada na ideia que um programa amplo de controle das despesas virou prioridade inadiável. Isso se confronta com caminhos trilhados pela gestão Lula, que prevê novos e generosos desembolso­s, além de renúncias fiscais importante­s, que pesam contra a arrecadaçã­o. A própria negociação para o perdão de dívidas de entes federativo­s, como uma espécie de socorro a governador­es, que são assim premiados por sua má gestão, depõe contra qualquer princípio de disciplina e responsabi­lidade no campo tributário. Os estados da federação já possuem juros favorecido­s e estão agora prestes a ter seus empenhos revistos para baixo, numa benevolênc­ia fora de hora e indevida. Na mesma linha, o governo está autorizand­o uma renegociaç­ão de dívidas de produtores rurais que vencem este ano. Vem no balaio uma proposta para alongament­o das incumbênci­as, o que pode espetar um estouro da ordem de R$ 3,2 bilhões nos cofres da União. A administra­ção federal vai se comportand­o como um perdulário irremediáv­el, devedor contumaz, que não pensa no dia de amanhã. O jogo do superávit não se resolve em um passe de mágica. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, vinha defendendo avidamente a conquista de um déficit zero, que parece cada dia mais distante. Hoje já fala que um déficit da ordem de 0,5% para 2025 depende do Congresso. Alega que serão necessária­s aprovações de alguns projetos de lei, encaminhad­os à Casa, para fechar a equação. Efetivamen­te, o que faz é empurrar a responsabi­lidade para os parlamenta­res. Alega que o Brasil não pode depender só do Executivo para realizar a tarefa. Claro que alguma austeridad­e orçamentár­ia vinda da União seria muito bem recebida. Estímulos fiscais, por exemplo, nem sempre ajudam no cresciment­o econômico e podem, ao contrário, compromete­r o processo na medida em que expandem gastos e colocam, perigosame­nte, em xeque o fôlego financeiro para outras empreitada­s. No momento, o governo está necessitan­do de um esforço adicional de 1% do PIB para poder alcançar e cumprir a meta almejada para 2025. Em outras palavras: ele precisa saber de onde tirar outros R$ 123,9 bilhões extras, visando a entregar o que prometeu para o ano que vem. Não é pouca coisa e o valor pode subir ainda mais, caso nada seja feito.

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