Jornal do Commercio

Álbum consistent­e reflete a pandemia

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McCartney III abre com um instrument­al, de cinco minutos,

Long Tailed Winter (McCartney tem também um instrument­al, Kreen-Akarore, inspirado por uma tribo descoberta na época na Amazônia). Um tema que pode cair bem na animação para o qual foi composto, mas se não estivesse no disco não faria falta. Parte das canções foi criada quando gravou o álbum anterior, Egypt Station, de 2018.

Pretty Boy, uma das onze faixas de McCartney III soa na linha melódica e sonora de Egypt Station (um dos melhores álbuns de McCartney em anos). Tanto esta quanto FindMy Way, a segunda faixa, são pop no estilo forjado Paul, nada que surpreenda, é ele sendo ele. Não na letra.

Find My Way

nasceu no início do lockdown, e Paul confessa que sentia medo de contrair o vírus. Pessoas conhecidas suas adoeciam, estavam no hospital: “Foi um período assustador. Já houve outras doenças, feito a gripe aviária, mas estas coisas atingiam outras pessoas, mas esta todo mundo estava pegando”. Os versos iniciais da canção dizem: “A gente não costumava ter medo de dias assim/Mas agora está estupefato/por suas ansiedades”.

Uma das melhores baladas do álbum, Seize the Day também reflete o clima da pandemia: “Os velhos dias estão acabando/Não haverá mais sol/E a gente queria que houvesse”, a música é envolta por um arranjo sofisticad­o. A estas alturas, aos 78 anos, Paul

McCartney domina os estúdios, e os instrument­os. Aqui ele usa do jurássico mellotron ao não menos antigo contrabaix­o de pau, que pertenceu a Bill Black, integrante do primeiro trio de Elvis Presley. O contrabaix­o que se escuta em, por exemplo, Heartbreak Hotel, foi um presente que Paul ganhou de Linda McCartney.

Lavatory Lil é um esporro que dá em alguém, cujo nome não revela. Deep Deep Feeling éa mais burilada, ele experiment­a com timbres, andamentos, com momentos que surpreende­m, em que torna a voz mais um instrument­o. São 8 minutos e 23 segundos de uma música com uma sonoridade contemporâ­nea, mas sem ir na onda alheia. Seu dedilhado no violão é preciso, tem um estilo bem particular.

Em The Kiss of Venus são usados pouco overdubs, é Paul e violão, com filtros nos vocais. Lembra canções menos conhecidas do Álbum Branco. A sequência das faixas também segue um conceito. Vão ficando mais empolgante­s à medida que o disco se aproxima do final. As três últimas são muito boas, Seize the Day, Deep Down, culminando com

Winter Bird/When Winter Come.

A evolução dos estúdios facilitou com que se faça um disco sozinho, ainda mais sendo um músico com 60 anos de carreira. McCartney III não tem nenhuma canção à altura de Maybe I’m Amazed, do primeiro álbum do grupo do eu sozinho, mas tampouco tem vinhetas e canções incompleta­s, ou enjeitadas pelos Beatles. É um álbum tão consistent­e quanto Egypt Station.

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