Ameaças ao sistema eleitoral
As eleições de 2020 foram as primeiras sem as coligações proporcionais. Constatou-se que houve expressiva redução do número de partidos com representação nos Legislativos dos 5.568 municípios brasileiros. De fato, entre 2016 e 2020 o total de cidades que tinham até três partidos com representação nas Câmaras sextuplicou, subindo de 262 para 1.565. As Câmaras que albergavam até seis partidos e representavam 50% dos municípios em 2016, agora são 82% do total.
Em contrapartida, caiu a quantidade de cidades com mais de seis legendas nos Legislativos locais: de 50% para 18%. Há também indicativos da diminuição do número de partidos que concorreram no pleito de 2020 vis-à-vis o de 2016. Em Pernambuco, numa pequena amostra, a média de disputantes em 2020 caiu de 31 para 23 em grandes colégios eleitorais e de 23 para 13 em outras cidades.
Por aí se vê que o fim das coligações está propiciando redução do número de partidos, seja com representação parlamentar, seja disputando as eleições. Engendra-se, dessa forma, salutar processo de compactação quantitativa de siglas (hoje são 33), ficando apenas as mais competitivas. Uma expectativa alvissareira, portanto, em direção a partidos mais sólidos e orgânicos.
Tal processo, todavia, afeta partidos de pouca ou média densidade de voto, incluindo alguns tradicionais e/ou ideológicos, que terão problemas em 2022 de lidar simultaneamente com o fim das coligações e com a cláusula de desempenho partidário. Esta última, estabelece regras para acesso ao Fundo Partidário e ao tempo de rádio e TV. Já em 2022 cada partido precisa obter, em resumo, pelo menos 2,0% dos votos válidos ou ter eleito ao menos 11 deputados federais. A julgar pelo desempenho na eleição municipal de 2020, entre 16 e 19 partidos teriam dificuldades de transpor os limites da cláusula de barreira em 2022 (JC, 21/02/21).
Na Câmara Federal já se busca “aprimorar” a legislação, tendo sido criado um Grupo de Trabalho para este mister. O real propósito, todavia, é o de preservar a existência de várias agremiações, incluindo algumas cartoriais e sem musculatura de votos.
É preciso deixar que a reforma eleitoral de 2017, que já mostrou promissoras perspectivas na eleição recém-finda, seja maturada no decorrer dos próximos anos, pavimentando caminhos para um sistema partidário-eleitoral de qualidade.
Maurício Costa Romão, é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos.