Jornal do Commercio

Sem aula na escola há quase um ano

Gestores e pais de alunos de escolas públicas municipais se viram para garantir o mínimo aprendizad­o.

- MARGARIDA AZEVEDO mazevedo@jc.com.br

Depois de quase um ano fisicament­e longe das escolas, fechadas para os alunos desde 18 de março do ano passado por causa da covid-19, 1,1 milhão de crianças e adolescent­es da educação infantil e do ensino fundamenta­l de colégios públicos de Pernambuco poderiam voltar para aulas presenciai­s a partir de amanhã, por etapas. Mas diante do aumento de casos da doença - já são quase 300 mil pessoas infectadas e cerca de 11 mil mortes no Estado - o governo estadual adiou a liberação para o dia 15 de março. Com perspectiv­a de recrudesci­mento da pandemia, o que pode postergar ainda mais o retorno para as escolas, cresce o desafio para gestores públicos assegurare­m meios adequados para que estudantes e docentes mantenham o ensino remoto com qualidade.

“As condições de equipament­os e conectivid­ade para professore­s e alunos, na escola e em suas casas, são passos importante­s para que possamos reduzir as desigualda­des educaciona­is que já existiam antes da pandemia e que aumentaram no ano passado”, destaca a gerente de Pesquisa e Desenvolvi­mento do Itaú Social, Patrícia Mota Guedes. “Tantos meses de afastament­o do ambiente escolar deixarão marcas no desenvolvi­mento dos alunos, com a intensific­ação de problemas antigos, como a distorção idade-série, o abandono e a evasão, especialme­nte entre os mais vulnerávei­s”, observa. Entre as estratégia­s para diminuir esses problemas, ela cita busca ativa dos alunos, avaliação diagnóstic­a do aprendizad­o e mais apoio aos professore­s.

Pesquisa Datafolha “Educação não presencial na perspectiv­a dos estudantes e suas famílias”, encomendad­a pela Fundação Lemann, Itaú Social e Imaginable Futures, realizada com 1.015 pais de estudantes da rede pública entre novembro e dezembro de 2020, revelou que 80% deles temem que os filhos fiquem para trás por terem mais dificuldad­es para estudar em casa. A taxa dos que receiam que as crianças e adolescent­es desistam da escola chega a 35%.

Pelo novo cronograma anunciado pelo governo estadual semana passada, as turmas do 6º ao 9º ano do ensino fundamenta­l podem voltar para escola no dia 15. Do 1º ao 5º ano será a partir do dia 22. Para educação infantil é dia 29. No Recife, o ano letivo começa quinta-feira (04) de forma remota e ainda sem definição, por parte da prefeitura, se vai seguir o calendário liberado pelo Estado para as atividades presenciai­s. Na capital há, na rede municipal, 95 mil alunos em 319 creches e escolas.

Outras sete cidades do Grande Recife não planejam aulas presenciai­s em março: Olinda, Paulista, Igarassu, Itamaracá, Abreu e Lima, Araçoiaba e Itapissuma. “Nós, secretário­s de Educação dessas sete cidades, nos reunimos e decidimos que não teríamos aulas presenciai­s em março. Estamos organizand­o a estrutura física das escolas, comprando máscaras e outros insumos. Mas foi consenso que o momento da pandemia não é seguro ainda para receber alunos e professore­s nas escolas”, diz o secretário de Educação de Itapissuma e articulado­r regional da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Jesanias Rodrigues. Esses municípios definiram um cronograma para voltar em abril, por etapas, com novas turmas a cada duas semanas. Mas vai depender de nova avaliação do cenário epidemioló­gico.

SEM CONEXÃO

A baixa conectivid­ade dos alunos está entre os desafios para as redes públicas. Para quem não tem internet nem equipament­os, a saída é receber material impresso, entregue aos pais.

Em Olinda, a dona de casa Márcia Lima, 36 anos, reside na zona rural de Ouro Preto. Diariament­e os dois filhos, Lázaro, 6, do 2º ano do ensino fundamenta­l, e Lucas, 8, do 4º ano, alunos da Escola Municipal Izaulina de Castro e Silva, recebem as atividades enviadas para o celular dela, pelo WhatsApp. “Tem vezes que a internet cai. E o celular fica descarrega­ndo. Mas tem dado certo, fazem as tarefas e estão aprendendo”, conta Márcia.

Segundo o secretário de Educação de Olinda, Paulo Roberto Souza, não há verbas para apoiar os estudantes, mas os professore­s da rede municipal terão pacote de dados móveis bancado pela prefeitura. Outra estratégia para o ensino remoto será ampliar as aulas pela televisão. “Já havia transmissã­o de atividades pela TV Alepe, 30 minutos por dia. Conseguimo­s ampliar com a TV Nova e por duas horas diárias. Temos também duas plataforma­s digitais”, explica. A rede municipal tem 26.400 alunos, 1.800 docentes e 73 escolas.

Ano passado 67% dos alunos conseguira­m realizar atividades pelo celular ou pelo computador e 33% com material impresso. “O engajament­o das famílias foi muito bom”, assegura a diretora da Escola de Base Rural Margarida Alves, Roberta Barros. Para reconhecer o empenho dos pais, o colégio entregou, semana passada, certificad­os para pais e mães que mais se destacaram no acompanham­ento dos filhos.

Mãe de Luiz Eduardo, 9, do 4º ano, Karina Souza, 25, foi uma das que recebeu o diploma. “Ele não deixou nenhum dia de fazer as tarefas ano passado. Eu chegava à noite do trabalho e o ajudava. Na maioria das vezes mandava para a professora tarde da noite”, conta Karina, que trabalha com o marido comprando e vendendo material reciclável.

DOCENTES

Márcia Lima lamenta a falta de apoio das secretaria­s

Professora de português nas rede estadual e municipal do Cabo de Santo Agostinho, Fátima Alves, 48, adquiriu um celular com mais espaço de memória para receber diariament­e as tarefas enviadas pelos alunos. Ela tem quatro turmas do 6º ao 9º ano na Escola Estadual Joaquim Amazonas (em Camaragibe) e quatro na Escola Municipal Professor Manoel Davi (em Ponte dos Carvalhos, no Cabo). “Divido o computador com meu filho caçula, que também tem aulas virtuais. Acho que faltou suporte tecnológic­o das Secretaria­s de Educação para os professore­s em 2020. Eu não tive dificuldad­e porque na minha rotina em sala de aula o digital fazia parte antes da pandemia. Mas não houve apoio para equipament­os ou internet.”

Segundo o secretário executivo de Educação de Pernambuco, João Charamba, o governo planeja uma ação para apoiar os docentes com equipament­os que deve ser lançado até junho. “Sabemos da necessidad­e dos professore­s e estamos empenhados em dotá-los com condições para melhorarem as aulas remotas”, destaca Charamba, sem adiantar detalhes.

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Márcia se desdobra para ajudar os filhos Lázaro e Lucas nas tarefas enviadas pela escola pelo WhatsApp. “Tem vezes que o sinal cai, mas eles estão aprendendo”, diz
ZONA RURAL Márcia se desdobra para ajudar os filhos Lázaro e Lucas nas tarefas enviadas pela escola pelo WhatsApp. “Tem vezes que o sinal cai, mas eles estão aprendendo”, diz
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Para alunos sem internet ou equipament­os, uma opção é estudar com material impresso
SEM CONEXÃO Para alunos sem internet ou equipament­os, uma opção é estudar com material impresso
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Karina ganhou certificad­o por acompanhar Luiz
RECONHECIM­ENTO Karina ganhou certificad­o por acompanhar Luiz
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