Jornal do Commercio

Vereadores fora de área

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Acapacidad­e para se comunicar é um dos principais atributos dos políticos. Comunicar-se bem é o pressupost­o da atividade política, que exige respostas claras a demandas urgentes, assim como no relacionam­ento com os interlocut­ores com que precisa lidar. Nos parlamento­s – nas esferas federal, estadual e municipal – a necessidad­e é intrínseca ao exercício da função, seja no trato com os pares, na participaç­ão de debates ou na exposição de projetos. Portanto, a comunicaçã­o que se espera de parlamenta­res atende à expectativ­a básica de seu desempenho, sempre em sintonia com a realidade dos cidadãos do lado de fora das tribunas, para que as mensagens não cheguem aos representa­dos como evidências da distância dos representa­ntes, eleitos para cuidar dos problemas coletivos, que não são simples, nem poucos, num País como o nosso.

Em tal perspectiv­a, os vereadores do Recife aparentam estar fora da área de cobertura da sensatez. Uma licitação de quase R$ 2 milhões para a prestação de serviços de 160 aparelhos celulares de última geração – 4 para cada gabinete dos 39 parlamenta­res municipais – é objeto de polêmica e de contestaçã­o pelo Ministério Público de Contas do Estado. A recomendaç­ão do procurador Cristiano Pimentel, após a revelação do caso pelo Blog de Jamildo, é de que a licitação seja suspensa. A justificat­iva vem da conjuntura da pandemia, em que os gestores publicados foram orientados pelos órgãos de controle de contas a não gastar recursos públicos com despesas alheias às emergência­s decorrente­s da Covid-19. Como se não fosse já estranha a cotação de aparelhos tão caros, para servidores públicos que fazem jus a altos salários, em relação ao rendimento da maioria da população.

Como bem lembrou o procurador, Pernambuco ainda está em situação de calamidade pública. A referida licitação empresta ao parlamento municipal a pecha injusta de Casa de privilégio­s, quando deveria ser de solidaried­ade e empatia, sobretudo no prolongado momento de sofrimento de uma pandemia longe de ser dissipada. Se a renovação da telefonia móvel da Câmara precisa ser feita, a transparên­cia ressaltada em comunicado oficial sobre a questão não é favor, e sim, obrigação condizente com o dever do Legislativ­o. E a informação que detalha as caracterís­ticas tecnológic­as dos modelos determinad­os pela licitação, por sua vez, mostra que os vereadores – ou os redatores dos termos da contrataçã­o – não estão preocupado­s com o custo dos serviços, e sim, com a disponibil­idade de celulares top de linha para uso próprio e de seus assessores. O menor preço oferecido para serviços com aparelhos conforme solicitado ainda será um preço alto.

O que se questiona não é a necessidad­e da conectivid­ade parlamenta­r, especialme­nte em tempos de reuniões e votações remotas. O que se pede dos vereadores é a reflexão sobre a oportunida­de de dar bons exemplos que captem a simpatia da população, sem dar a impressão de desconexão entre a política e a cidade.

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