Jornal do Commercio

As chantagens de Putin

- SÉRGIO C. BUARQUE

Qual a legitimida­de de um plebiscito realizado por tropas invasoras num território ocupado, como o que está fazendo agora a Rússia em áreas da Ucrânia? Nenhuma. Dificilmen­te algum país sério reconhecer­á os resultados de uma consulta mano militari, através da qual Vladimir Putin espera que a população dominada aprove a anexação dos território­s à Rússia. Mas Putin não está esperando reconhecim­ento do resultado do plebiscito.

Como fez com a Criméia, Putin vai declarar, unilateral­mente, que a região de Donbass será parte da Rússia e, portanto, a contraofen­siva ucraniana seria uma invasão ao território russo e não mais uma batalha pela liberação das áreas ocupados pelo agressor.

Ao mesmo tempo, diante do desespero da derrota militar e do isolamento internacio­nal, o presidente russo recorre, mais uma vez, à chantagem nuclear e ameaça usar todos os meios disponívei­s para proteger o território, que seria agora da Rússia. Ele está preparando uma nova grande ofensiva na Ucrânia com a convocação de 300 mil reservista­s e decretou que a deserção ou a rendição será condenada com penas de 10 anos de prisão. A repressão às manifestaç­ões em Moscou e a fuga de jovens russos para escapar de uma guerra que não escolheram, podem indicar uma nova fase da resistênci­a interna à aventura militar de Putin.

Com a chegada do inverno, a Rússia tenta sufocar os aliados europeus da Ucrânia com o corte do fornecimen­to de gás natural. O inverno, que ajudou a Rússia a derrotar Napoleão e Hitler, é utilizado como arma para quebrar a unidade da Europa no seu apoio à Ucrânia. Mas agora os invasores são os russos e os europeus estão se preparando para resistir ao frio. Dificilmen­te cederão à guerra do frio.

Putin está perdendo no campo de batalha e na opinião pública internacio­nal e ainda tem que lidar com a insatisfaç­ão interna na Rússia, que crescerá com a escalada da guerra. Mesmo países que vinham mantendo neutralida­de no conflito, como China e Índia, não parecem dispostos a conviver mais tempo com os impactos econômicos da invasão russa. O mundo tem pressa. As chances de vitória da Rússia são remotas, mas Putin não tem nenhuma disposição para a retirada. E quanto mais ele empurra a Rússia nesta guerra insana, maior a humilhação diante de uma provável derrota. E aí reside o grande perigo. O novo tzar, encurralad­o e humilhado, comanda um arsenal nuclear. Da última vez que ameaçou recorrer ao extremo, ressaltou: “Eu não estou blefando”. Será?

 Sérgio C. Buarque, economista

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