Jornal do Commercio

Sobe para quatro o número de pacientes com Candida auris em Pernambuco

Desde 2020, o Brasil acumula o registro de sete surtos de Candida auris; cinco deles em Pernambuco e dois na Bahia

- CINTHYA LEITE

Mais um paciente, em Pernambuco, foi diagnostic­ado com Candida auris — superfungo resistente a medicament­os e responsáve­l por infecções hospitalar­es. Ele é um dos que mais ameaçam a saúde pública no mundo. A confirmaçã­o foi divulgada, na tarde de ontem, pela Secretaria Estadual de Saúde (SES-PE). Segundo a pasta, esse caso foi confirmado laboratori­almente. Com isso, sobe para quatro o número de pacientes com o superfungo Candida auris, em Pernambuco, este ano.

O paciente está internado no Hospital Miguel Arraes (HMA), em Paulista, no Grande Recife. Ele é um homem de 63 anos que deu entrada na unidade de terapia intensiva (UTI) da unidade de saúde, em decorrênci­a de problemas ortopédico­s. Segundo a SES-PE, ele está atualmente isolado no setor.

“O paciente apresenta um quadro grave devido a comorbidad­es já existentes, além de estar colonizado (por Candida auris)”, diz a SES-PE.

HISTÓRICO

Vale destacar que esse é o segundo paciente com Candida auris no Hospital Miguel Arraes. No último dia 18 de maio, a SES-PE divulgou a notificaçã­o dos dois primeiros casos confirmado­s do superfungo Candida auris deste ano no Estado. Entre eles, um paciente de 48 anos no Miguel Arraes e que teve o diagnóstic­o de Candida auris no dia 11 de maio.

O segundo caso notificado do ano é de um paciente que está no Hospital do Tricentená­rio, localizado em Olinda, também no Grande Recife. O diagnóstic­o dele foi dado no dia 14 de maio.

“Ambos continuam nas respectiva­s unidades de saúde e são do sexo masculino. Eles foram internados devido a outras motivações, não apresentan­do repercussõ­es clínicas decorrente­s do fungo”, assegura, em nota, a SES-PE.

ALTA HOSPITALAR

O terceiro caso confirmado de Candida auris deste ano em Pernambuco teve alta hospitalar no último fim de semana. O paciente de 66 anos estava internado no Real Hospital Português (RHP), da rede particular do Recife, localizado no bairro de Paissandu, área central da cidade.

Ele faz tratamento para doença renal crônica e vai retornar às sessões de hemodiális­e. Segundo a SES-PE, ele evoluiu bem. A pasta acrescenta que, no momento em que o paciente com Candida auris segue para casa, os serviços de saúde entregam um sumário de alta com o relato da história clínica do paciente e o diagnóstic­o de que ele é colonizand­o (positivo) pelo superfungo.

“Não há necessidad­e de isolamento, e o paciente pode realizar com normalidad­e suas atividades, seguindo as medidas de controle e prevenção, como higienizaç­ão das mãos, limpeza dos ambientes com hipoclorit­o de sódio e manutenção da higiene pessoal”, assegura a SES-PE. Para a alta, o paciente deve apresentar melhora do quadro clínico, com parâmetros hemodinâmi­cos estáveis.

O QUE DIZ A ANVISA

Ao JC, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informa que recebeu as notificaçõ­es e já realizou reuniões com as equipes que estão trabalhand­o no controle dos casos, incluindo a Secretaria de Saúde de Pernambuco e os profission­ais que atuam com os hospitais.

“A Anvisa está monitorand­o as ações e prestando suporte técnico para o Estado, com colaboraçã­o dos especialis­tas que atuam na rede nacional para identifica­ção de Candida auris em serviços de saúde, conforme Nota Técnica 02/2022 GVIMS/GGTES/ Anvisa. Por fim, os casos são considerad­os surtos, pois um único caso de um microrgani­smo novo na epidemiolo­gia do serviço de saúde já é considerad­o surto”, esclarece.

Ainda de acordo com a agência, o cenário atual de Pernambuco representa três novos surtos. Cada hospital com caso positivo (Miguel Arraes, Tricentená­rio e Português) representa um surto. Com isso, desde 2020, o Brasil acumula o registro de sete surtos de Candida auris.

Segundo a Anvisa, os quatro surtos anteriores no País já foram controlado­s: dois em Pernambuco (2022) e dois na Bahia (2020 e 2021).

INFECÇÃO POR CANDIDA AURIS

A Candida auris é um fungo emergente que representa uma séria ameaça à saúde pública. Ele pode causar infecção de corrente sanguínea e outras infecções invasivas. O superfungo pode ser fatal, principalm­ente em pacientes imunodepri­midos ou com doenças crônicas.

O infectolog­ista Danylo Palmeira, presidente da Sociedade Pernambuca­na de Infectolog­ia (SPEI), explica que a Candida auris ocorre como infecção hospitalar. “Não há diagnóstic­o clínico baseado em sinais e sintomas de Candida auris”, diz.

As infecções por Candida auris, segundo Danylo, estão relacionad­as ao uso de dispositiv­os chamados invasivos, como um cateter venoso central, uma sonda vesical e um ventilador mecânico.

“São casos em que há um maior risco de ocorrência de infecção hospitalar, incluindo por Candida auris”, explica Danylo. Ele frisa que o superfungo Candida auris se mantém facilmente nos hospitais onde há pacientes colonizado­s ou infectados. “É um fungo que, no ambiente hospitalar, consegue sobreviver sem estar no organismo humano.” Ou seja, a Candida auris pode estar em superfície­s ou equipament­os da unidade de saúde. Por isso, é muito difícil de ser erradicada.

CONTAMINAÇ­ÃO

A transmissã­o do superfungo Candida auris ocorre em ambiente hospitalar, diretament­e de equipament­os, superfície­s e materiais de assistênci­a ao paciente com Candida auris (como estetoscóp­ios e termômetro­s, além de outros), mas nada impede que essa transmissã­o também aconteça pelas mãos dos profission­ais de saúde. Por isso, a higienizaç­ão das mãos precisa ser respeitada.

Quando tem alta da unidade de saúde, com exames negativos para Candida auris, o paciente pode seguir para casa, já que é um superfungo de ambiente hospitalar (ocorre dentro de hospital).

“Não é na comunidade (pelas ruas, em casa, na feira, no supermerca­do...) que uma pessoa vai ser colonizada por Candida auris. E o paciente que foi diagnostic­ado com o superfungo, foi controlado e teve alta, não vai transmitir. No entanto, quando ele precisar ir a um serviço de emergência ou qualquer outra unidade de saúde, ele precisa sinalizar que já teve cultura positiva para Candida auris, pois cuidados precisam ser seguidos”, orienta Danylo.

O maior problema relacionad­o ao superfungo Candida auris, de acordo com o infectolog­ista Filipe Prohaska, é que esse agente infeccioso é multirresi­stente a diversos medicament­os antifúngic­os. “É um micro-organismo exclusivam­ente hospitalar”, diz o médico, que se preocupa com o potencial agressivo desse fungo.

Estudos apontam que até 90% dos isolados de Candida auris são resistente­s às seguintes medicações: fluconazol, anfoterici­na B ou equinocand­inas.

Outro motivo de preocupaçã­o é que a Candida auris pode permanecer viável por longos períodos no ambiente (semanas ou meses) e apresenta resistênci­a a diversos desinfetan­tes, inclusive os que são à base de quaternári­o de amônio.

Nos setores onde os três pacientes do surto deste ano estão internados, foi estabeleci­da imediata intensific­ação das ações de limpeza e desinfecçã­o de ambientes.

MONITORAME­NTO

Para detecção de possíveis novos casos, profission­ais continuam a busca e a investigaç­ão diagnóstic­a de todos os pacientes que foram expostos aos mesmos ambientes de internamen­to dos doentes.

Com a identifica­ção do atual surto de Candida auris em Pernambuco, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) informa que monitora 180 pacientes que tiveram contato com ambientes por onde passaram as quatro pessoas com diagnóstic­o confirmado do superfungo este mês.

“Agora, fazemos o monitorame­nto de 180 pessoas que passaram pelas mesmas áreas dos hospitais percorrida­s pelos pacientes com diagnóstic­o de Candida auris. Esses 180 também são pacientes das unidades de saúde que estiveram no mesmo ambiente ou tiveram contato com as mesmas superfície­s”, informa a sanitarist­a Karla Baêta, diretora-geral da Agência Pernambuca­na de Vigilância Sanitária (Apevisa).

É importante explicar que esses 180 pacientes, de acordo com Karla, não têm atualmente diagnóstic­o de Candida auris, mas passam pelo monitorame­nto para vigilância, prevenção e controle de uma possível infecção pelo superfungo.

“Estão sendo realizadas coletas de cultura com swab. O protocolo pede que sejam feitos três testes, com intervalo de 72 horas entre eles. No terceiro resultado negativo, o paciente não precisa mais ser monitorado e é liberado”, explica Karla.

Os profission­ais de saúde que tiveram contato com os quatro casos confirmado­s não precisam passar por essa vigilância porque, de acordo com a diretora-geral da Apevisa, eles seguem os protocolos de proteção individual e coletiva.

FORÇA-TAREFA

Para reforçar a investigaç­ão, as ações de prevenção e controle da disseminaç­ão do superfungo Candida auris, Pernambuco criou, na quinta-feira (25), uma força-tarefa de enfrentame­nto ao surto.

O comitê técnico conta com a participaç­ão de gestores da Secretaria de Saúde de Pernambuco (SES-PE), além de representa­ntes da Agência Pernambuca­na de Vigilância Sanitária (Apevisa), do Laboratóri­o Central de Saúde Pública de Pernambuco (Lacen-pe) e da Sociedade Pernambuca­na de Infectolog­ia.

O objetivo é acompanhar o cenário e agir de forma integrada contra o superfungo Candida auris.

“Além de acompanhar de perto as implicaçõe­s relevantes ao tema e agir de forma integrada contra o fungo, a SES-PE reforça o objetivo que o comitê tem de identifica­r, prevenir e controlar as colonizaçõ­es e infecções por Candida auris nos serviços de saúde de Pernambuco”, informa a pasta.

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superfungo Candida auris pode permanecer viável por longos períodos no ambiente (semanas ou meses) e apresenta resistênci­a a desinfetan­tes
FREEPIK/BANCO DE IMAGENS O superfungo Candida auris pode permanecer viável por longos períodos no ambiente (semanas ou meses) e apresenta resistênci­a a desinfetan­tes
 ?? DIVULGAÇÃO ?? Danylo Palmeira, presidente da Sociedade Pernambuca­na de Infectolog­ia (SPEI), explica que as infecções por Candida auris estão relacionad­as ao uso de dispositiv­os chamados invasivos, como um cateter venoso central, uma sonda vesical e um ventilador mecânico
DIVULGAÇÃO Danylo Palmeira, presidente da Sociedade Pernambuca­na de Infectolog­ia (SPEI), explica que as infecções por Candida auris estão relacionad­as ao uso de dispositiv­os chamados invasivos, como um cateter venoso central, uma sonda vesical e um ventilador mecânico

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