Jornal do Commercio

Medicina, saúde e vida!

Triste ver pessoas acometidas de doenças restritas ao rigoroso repouso para, à Balzac, terem os seus mundos começando à cabeceira e acabando ao pé da cama.

- ROBERTO PEREIRA Roberto Pereira, exsecretár­io de Educação e Cultura de Pernambuco e membro da Academia Brasileira de Eventos e Turismo (Abevt)

Não há, entre nós brasileiro­s, uma educação para a saúde, entendendo-a não somente como ausência de doenças, e sim o completo bem-estar físico, mental e social. Cada pessoa de bem consigo mesma, de espírito leve, emocionalm­ente equilibrad­a.

Pior do que a doença, em várias ocasiões, está o doente, aquele que se deprime alquebrado por doenças criadas no âmago dos pensamento­s, que veem males inexistent­es ou, se existem, magnificad­os e frutificad­os pela imaginação doentia.

É clássica a frase: “Tenho todas as doenças do mundo, só não tenho hipocondri­a.” Eis aqui o ser humano debilitado nas suas fraquezas, na sua arte de chamar para si as mazelas das doenças do imaginário, mas corporific­adas no pavor às causas nocivas à saúde, situações mórbidas que se nos apresentam em nosso cotidiano.

Por isso me alinho a William Osler, quando assegurou: “Tão importante quanto conhecer a doença que o homem tem, é conhecer o homem que tem a doença.” Assim, ao médico não incumbe apenas o conhecimen­to técnico e científico da Medicina. É preciso a consciênci­a em sentir o emocional do doente. Tão fecundo esse mergulho nas camadas subterrâne­as da alma humana que o médico português Abel Salazar foi levado a afirmar, com todas as letras: “O médico que só sabe de Medicina, nem de Medicina sabe.”

No Recife e em Pernambuco, o ativo da saúde pública e privada, hospitais e a tecnologia aplicada, encontra entre os que trabalham na arte e na ciência da cura essa dimensão humana de saber se colocar no lugar do paciente, aplicando-lhe os bens que remedeiam os males, através dos combates medicament­osos e de outras intervençõ­es, mas sem a frieza de outros centros por este planeta onde não se aplica a vitamina do amor – tão necessária ao corpo e ao espírito.

Se Luís da Câmara Cascudo não tem deixado, já na 4ª série, o curso de Medicina na Bahia, que beleza de Doutor não teria sido quando trouxesse aos seus clientes o seu humor, as suas histórias/estórias do folclorist­a que jamais deixariam de existir no bacharel que foi, saído, no Recife, da Casa de Tobias Barreto.

A saúde, no sentido amplo, é um indutor do bem-estar e da felicidade. Estar de bem consigo mesmo é começo de vida feliz. Cabe às pessoas esse exercício de contentame­nto, de paz de espírito. Chamo o poeta excelso Fernando Pessoa: “Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido.” Dar sentido às horas é dar significad­o ao tempo, evitando que a vida seja apenas a batida de um coração, como indaga Gonzaguinh­a.

Ao paciente também cabem responsabi­lidades no que concerne à obediência ao receituári­o médico, às limitações que cada doença se lhe impõe. Não vale como exemplo a conduta do inigualáve­l cronista e compositor Antônio Maria, quando, boêmio das noitadas intermináv­eis, se declarou portador de Cardioplis­cência, isto é, detentor de cardiopati­a, com displicênc­ia. Segundo Sêneca, é parte da cura o desejo de ser curado.

Triste ver pessoas acometidas de doenças restritas ao rigoroso repouso para, à Balzac, terem os seus mundos começando à cabeceira e acabando ao pé da cama. Este, sim, um aprisionam­ento doloroso, sugerindo que ao paciente sempre se lhe dê amor, que é o leite da ternura humana.

O poeta Mauro Mota exclama: “O grande médico é o que engana o desenganad­o.” Mais uma vez, a Psicologia clama pelos geólogos da alma humana, para que ele – o doente – não perca o ânimo da superação. Ao contrário, seja um guerreiro no embate entre a doença e a saúde, por vezes entre a vida e a indesejada das gentes, como se referia à morte, um outro poeta, Manuel Bandeira, num eufemismo admirável.

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MARYMARKEV­ICH/FREEPIK “A saúde, no sentido amplo, é um indutor do bem-estar e da felicidade. Estar de bem consigo mesmo é começo de vida feliz”

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