Medicina, saúde e vida!
Triste ver pessoas acometidas de doenças restritas ao rigoroso repouso para, à Balzac, terem os seus mundos começando à cabeceira e acabando ao pé da cama.
Não há, entre nós brasileiros, uma educação para a saúde, entendendo-a não somente como ausência de doenças, e sim o completo bem-estar físico, mental e social. Cada pessoa de bem consigo mesma, de espírito leve, emocionalmente equilibrada.
Pior do que a doença, em várias ocasiões, está o doente, aquele que se deprime alquebrado por doenças criadas no âmago dos pensamentos, que veem males inexistentes ou, se existem, magnificados e frutificados pela imaginação doentia.
É clássica a frase: “Tenho todas as doenças do mundo, só não tenho hipocondria.” Eis aqui o ser humano debilitado nas suas fraquezas, na sua arte de chamar para si as mazelas das doenças do imaginário, mas corporificadas no pavor às causas nocivas à saúde, situações mórbidas que se nos apresentam em nosso cotidiano.
Por isso me alinho a William Osler, quando assegurou: “Tão importante quanto conhecer a doença que o homem tem, é conhecer o homem que tem a doença.” Assim, ao médico não incumbe apenas o conhecimento técnico e científico da Medicina. É preciso a consciência em sentir o emocional do doente. Tão fecundo esse mergulho nas camadas subterrâneas da alma humana que o médico português Abel Salazar foi levado a afirmar, com todas as letras: “O médico que só sabe de Medicina, nem de Medicina sabe.”
No Recife e em Pernambuco, o ativo da saúde pública e privada, hospitais e a tecnologia aplicada, encontra entre os que trabalham na arte e na ciência da cura essa dimensão humana de saber se colocar no lugar do paciente, aplicando-lhe os bens que remedeiam os males, através dos combates medicamentosos e de outras intervenções, mas sem a frieza de outros centros por este planeta onde não se aplica a vitamina do amor – tão necessária ao corpo e ao espírito.
Se Luís da Câmara Cascudo não tem deixado, já na 4ª série, o curso de Medicina na Bahia, que beleza de Doutor não teria sido quando trouxesse aos seus clientes o seu humor, as suas histórias/estórias do folclorista que jamais deixariam de existir no bacharel que foi, saído, no Recife, da Casa de Tobias Barreto.
A saúde, no sentido amplo, é um indutor do bem-estar e da felicidade. Estar de bem consigo mesmo é começo de vida feliz. Cabe às pessoas esse exercício de contentamento, de paz de espírito. Chamo o poeta excelso Fernando Pessoa: “Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido.” Dar sentido às horas é dar significado ao tempo, evitando que a vida seja apenas a batida de um coração, como indaga Gonzaguinha.
Ao paciente também cabem responsabilidades no que concerne à obediência ao receituário médico, às limitações que cada doença se lhe impõe. Não vale como exemplo a conduta do inigualável cronista e compositor Antônio Maria, quando, boêmio das noitadas intermináveis, se declarou portador de Cardiopliscência, isto é, detentor de cardiopatia, com displicência. Segundo Sêneca, é parte da cura o desejo de ser curado.
Triste ver pessoas acometidas de doenças restritas ao rigoroso repouso para, à Balzac, terem os seus mundos começando à cabeceira e acabando ao pé da cama. Este, sim, um aprisionamento doloroso, sugerindo que ao paciente sempre se lhe dê amor, que é o leite da ternura humana.
O poeta Mauro Mota exclama: “O grande médico é o que engana o desenganado.” Mais uma vez, a Psicologia clama pelos geólogos da alma humana, para que ele – o doente – não perca o ânimo da superação. Ao contrário, seja um guerreiro no embate entre a doença e a saúde, por vezes entre a vida e a indesejada das gentes, como se referia à morte, um outro poeta, Manuel Bandeira, num eufemismo admirável.