Jornal do Commercio

Serviço de transporte com motos que só cresce no Brasil é a ‘uberização’ do Uber

O JC segue com a série de reportagen­s Uber Moto: perigo sobre duas rodas abordando a explosão do serviço de transporte remunerado de passageiro­s com motos e suas consequênc­ias para a mobilidade urbana e a saúde pública

- ROBERTA SOARES

Aexplosão do transporte de passageiro­s por motociclet­as via aplicativo - Uber e 99 Moto - tem provocado impactos que vão além da segurança viária e do consequent­e custo à saúde pública. São impactos econômicos que, por ironia, também têm sido sentidos no próprio sistema de transporte por aplicativo­s.

O serviço de Uber e 99 Moto está promovendo a ‘uberização’ do próprio Uber e 99. A expressão ‘uberização’ passou a ser usada para definir a precarizaç­ão dos serviços - não só de transporte, mas de outros setores também. As queixas são dos motoristas parceiros.

Quem roda com automóvel tem sentido, pelo menos no Recife, as corridas caírem em aproximada­mente 30%, levadas pelas motociclet­as. O motorista Wellington Silva conta que precisou pegar dinheiro emprestado para conseguir fechar o orçamento no fim de 2022, quando viu as corridas caírem.

“O impacto é grande. Tenho sentido muito a fuga do passageiro para a motociclet­a. O preço mais baixo tem atraído os passageiro­s. E para quem roda com carro está ficando cada vez mais difícil”, lamenta.

DO UBER CARRO PARA O UBER MOTO

Há motoristas, inclusive, que deixaram o carro e migraram para as motos. É o caso de John José dos Santos, que há um ano desistiu do automóvel e migrou para a motociclet­a. “Quem roda com gás ainda consegue, mas na gasolina, por exemplo, fica impraticáv­el”, reflete.

“Na motociclet­a, eu ganho menos que o carro, é verdade, mas gasto menos. Com R$ 50 faço 400 km de moto. No carro, mesmo a gás, faria 200 km. Essa é a vantagem.

IMPACTO NA OFERTA DO ARCONDICIO­NADO NOS CARROS

Menos corridas, menos lucro e mais despesas. Outro impacto da explosão do Uber e 99 Moto tem sido a precarizaç­ão do serviço de carro. Há algum tempo, existe o Uber e 99 com ar-condiciona­do e o sem refrigeraç­ão. O Uber X ‘pode’ - como explica a Uber - não ligar o ar-condiciona­do. Mas o Uber Confort é obrigado.

“Tenho cancelado muitas viagens porque o motorista parceiro não aceita ligar o ar-condiciona­do do veículo ou, às vezes, nem tem. E roda assim mesmo. E isso tem acontecido em muitas cidades, inclusive as quentes, como o Recife”,

reclama a design Karla Patrícia, que usa o serviço de carro com frequência.

IMPACTO DO UBER E 99 MOTO NO TRANSPORTE PÚBLICO

Como esperado, quem também tem sentido o impacto do cresciment­o do Uber e 99 Moto tem sido o transporte público coletivo. Com tarifas que, conforme a distância do deslocamen­to, ficam quase equivalent­es à corrida de moto por aplicativo, e sem a agilidade das duas rodas, o setor acendeu o alerta.

E já conta o prejuízo, embora ainda não existam dados estatístic­os sobre perdas diretas. Se tem a queda da demanda geral. “Apesar de não dispormos dos números sobre a operação do Uber e 99 Moto, sabemos que o impacto sobre o transporte coletivo é significat­ivo”, diz Fernando Bandeira, presidente da Urbana-pe, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiro­s de Pernambuco.

“Os ônibus transporta­ram em 2022, 77% dos passageiro­s transporta­dos em 2019, antes da pandemia. E no primeiro quadrimest­re de 2023 a tendência continua, com queda de mais de 5% em comparação ao ano anterior”, relata.

“Infelizmen­te, as empresas de aplicativo­s não fornecem as informaçõe­s exigidas pela regulament­ação local, como, por exemplo, a quantidade de viagens realizadas. Esses dados são fundamenta­is e a falta de transparên­cia sobre a operação de um serviço cujo alcance só podemos supor prejudica o planejamen­to da mobilidade das nossas cidades. Também nos preocupa bastante o risco de aumentarem ainda mais os sinistros de trânsito envolvendo motos”, reclama.

CRÍTICAS NACIONALME­NTE CONTRA O UBER E 99 MOTO

Nacionalme­nte, o setor de transporte público também já faz críticas ao cresciment­o do serviço. “O Uber Moto não é seguro, não é um serviço de transporte público e ainda causa muitos sinistros. Mais da metade dos sinistros de trânsito envolvem motos e um terço das pessoas que morreram estavam em motos. Não queremos que o passageiro que está deixando o transporte público vá para as motos”, alerta o presidente-executivo da Associação Nacional das Empresas de Transporte­s Urbanos (NTU), Francisco Christovam.

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BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM Quem roda com automóvel tem sentido, pelo menos no Recife, as corridas caírem em aproximada­mente 30%, levadas pelas motociclet­as

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