Jornal do Commercio

E se Napoleão tivesse vindo?

- SÉRGIO BUARQUE Sérgio Buarque, economista

Qual teria sido o futuro da Revolução Pernambuca­na se aquele delírio de Cruz Cabugá, que contou com o apoio de dois importante­s oficiais napoleônic­os, o coronel Paul Albert-marie de Latapie e o conde Ponlécoula­nt, tivesse se concretiza­do e Napoleão assumido o comando das tropas da República pernambuca­na?

Na conspiraçã­o que levou à Revolução Pernambuca­na, Cruz Cabugá, um dos líderes revolucion­ários, foi a Baltimore, nos Estados Unidos, negociar o apoio de oficiais do antigo exército de Napoleão que, a esta altura, estava exilado na ilha de Santa Helena, na costa ocidental da África. Conceberam um plano ousado: resgatar o ex-imperador francês do seu exílio e trazê-lo para o Recife, de modo que pudesse assumir o comando militar da revolução em Pernambuco. O plano fracassou, Napoleão nunca soube das negociaçõe­s dos seus oficiais, talvez tivesse gostado da ideia de vingar-se de D. João VI, que o enganou e fugiu de Portugal antes que suas tropas entrasse no território português. Teria mesmo adorado se tivesse escapado da ilha de Santa Helena, onde terminou morrendo, quatro anos depois, na solidão e isolamento do exílio, longe da França e dos campos de batalha. Napoleão preferia voltar para o seu império francês, mas ficaria tentado. “Esse gordo, de novo na minha vida”.

Neste 6 de março de 2024, Pernambuco comemora 207 anos do levante que tomou o poder, rompeu com a coroa portuguesa instalada no Rio de Janeiro e implantou a República pernambuca­na. Os sublevados ocuparam o governo e todas as instalaçõe­s importante­s, principalm­ente o Tesouro da Província, instalaram um governo provisório e proclamara­m a República. Inspirados nas ideias iluminista­s e nos princípios da maçonaria, a Revolução Pernambuca­na repudiou a monarquia absolutist­a e rompeu com o reino português-brasileiro de D. João VI. Instalado um governo provisório, decretou, de imediato, a liberdade de imprensa, a redução de impostos, a eliminação dos títulos de nobreza e a liberdade religiosa. Apesar da inspiraçõe­s no iluminismo, a revolução pernambuca­na não acabou com o escravagis­mo, que era a base da economia canavieira e o poder dos senhores de engenho.

A revolução durou pouco mais de dois meses e foi esmagada pelas tropas portuguesa­s do reino de

Portugal, Brasil e Algarve. Mas, e se Napoleão tivesse vindo para o Recife e, com seus experiente­s oficiais, assumido o comando militar da Revolução Pernambuca­na? De imediato, teria provocado o pânico de D. João VI, “lá vem, de novo, Napoleão atrás de mim, nove anos depois da minha fuga”, e despertado grande euforia nos revolucion­ários pernambuca­nos. Uma virada psicológic­a na guerra que se anunciava com o cerco ao Recife pelas tropas do Reino. O imperador traria seus experiente­s oficiais para treinar a tropa e formar um exército republican­o e estudaria a geografia e a topografia, morros e mangues que poderiam ser aliados nos combates, analisaria documentos e crônicas de antigos combates na região e conversari­a bastante com militares pernambuca­nos e mateiros para definir a estratégia e organizar a defesa.

Para desgosto dos senhores de engenho, que apoiavam a revolução, Napoleão provavelme­nte decretaria o fim da escravidão, pelo menos para os negros que aceitassem integrar o exército, concedendo alforria para todo escravo de 18 a 25 anos que alistasse, fortalecen­do o poder militar do jovem e periclitan­te república. Ganhava soldados e criava um ambiente social mobilizado­r da população e a adesão de outras capitanias e a simpatia internacio­nal. Poderia ter pensado: “Eu lutei na Europa para acabar com a servidão. E não vou agora construir uma nação nos trópicos baseada na escravidão”. Além disso, eliminando o escravagis­mo na jovem república pernambuca­na conquistar­ia a simpatia dos Estados Unidos (tinham eliminado o escravagis­mo em 1803), e da Inglaterra que proibia o tráfico de escravos desde 1863.

Qual teria sido o futuro da Revolução Pernambuca­na se aquele delírio de Cruz Cabugá, que contou com o apoio de dois importante­s oficiais napoleônic­os, o coronel Paul Albert-marie de Latapie e o conde Ponlécoula­nt, tivesse se concretiza­do e Napoleão assumido o comando das tropas da República pernambuca­na? A resposta é possível apenas como ficção histórica: o que poderia ter sido e não foi? Mas, uma coisa é quase certa, o grande Napoleão Bonaparte teria se apaixonado por uma mulata pernambuca­na e desistido de voltar para França, esquecia a imperatriz Maria Luiza e se casaria com a pernambuca­na na pequena igreja no Parque da Jaqueira, onde também se casaram o revolucion­ário Domingos José Martins e Maria Teodora da Costa.

 ?? THIAGO LUCAS/ DESIGN SJCC ?? A
Revolução Pernambuca­na e Napoleão Bonaparte
THIAGO LUCAS/ DESIGN SJCC A Revolução Pernambuca­na e Napoleão Bonaparte

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil