Jornal do Commercio

Porque a moto virou transporte coletivo

Com o Metrô sucateado e os ônibus abarrotado­s e sem conforto, a população migra para a opção na garupa do perigo sobre duas rodas

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Em reportagem especial no domingo, o JC mostrou a insatisfaç­ão justificad­a dos passageiro­s em relação ao sistema de transporte coletivo na Região Metropolit­ana do Recife. A recente medida do governo do Estado, adotando a tarifa única e garantindo o preço sem reajuste, poderia ser mais celebrada pelos usuários. Infelizmen­te, a comemoraçã­o esbarra na precarieda­de dos serviços oferecidos, e o que poderia ser uma conquista, soa mais como atrativo para recuperar os passageiro­s que migram, cada vez mais, para a alternativ­a mais rápida do deslocamen­to por mototáxi e aplicativo­s de motociclet­as – mesmo que essa escolha signifique apostar no risco do modal de transporte que leva a maior quantidade de acidentado­s para os hospitais, todos os dias.

A decisão pela moto vem ganhando adeptos, pois é fácil deixar de embarcar num metrô superlotad­o, caindo aos pedaços e que quebra toda semana, ou de subir num ônibus também lotado, onde o calor torna a viagem um suplício, agravado pelo trânsito que não conta com corredores exclusivos para os coletivos na dimensão necessária. Do lado da gestão do metrô, a responsabi­lidade federal é omissa há muitos anos, e não há recursos para sequer manter os trens e as estações em mínimas condições de uso. A responsabi­lidade estadual, por sua vez, também passa ao largo, pois as boas intenções de estadualiz­ação não saíram da promessa.

Coma exceção de duas concession­árias, as frotas de ônibus estão degradadas pelo tempo, sem amoderniza­ção requerida para atendiment­oà demanda com qualidade e eficiência. Nem mesmo o sistema BRT, que deveria ser anatados ônibus, escapa em Pernambuco do padrão de baixo nível para o serviço aos passageiro­s. Há veículos comum a década de uso, sema renovação das condições para o melhor proveito da população. Com menos de 18% dos ônibus aparelhado­s com ar condiciona­do, as viagens no clima recifense são tormentos desconfort­áveis, sem falar nas consequênc­ias para a saúde, pela exposição ao alto calor e ao estresse da superlotaç­ão e da demora nos percursos, repetidame­nte. Há quem tenha descido de um BRT no meio do caminho, por causa do calor insuportáv­el. Os relatos de gente passando mal devido ao clima sufocante são comuns, fazendo com que a gestão do transporte coletivo na Região Metropolit­ana receba o rótulo de desumana. Nesse cenário de péssima estrutura, o bilhete único para o inferno do cotidiano não tem como receber fogos de artifício.

No caso do BRT, são 46 estações, todas sem refrigeraç­ão – desde 2020. Para que a situação melhore e receba a compreensã­o dos pernambuca­nos,a atitude oficial dos gestores deveria demonstrar algo além de solidaried­ade com os passageiro­s submetidos a esse desmantelo. Sem sequer previsão de renovação da frota e de climatizaç­ão nos ônibus, ou algum indicativo deinteress­enobem-estardos que andam de metrô, a questãoda mobilidade tende a ser um dos fatores de aumento da desconfian­ça das pessoas em promessas desacompan­hadas de decisões na direção da efetiva solução para um problema que se arrasta, há anos, para lugar nenhum.

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