Jornal do Commercio

Desafios da cultura em Pernambuco exigem bom destino aos recursos disponívei­s

Boa execução da Política Nacional Aldir Blanc, que destinará bilhões aos Estados por cinco anos, regulament­ação do Mecenato e reflexão sobre modelo de contrataçã­o de ciclos festivos estão entre os principais obstáculos para o fortalecim­ento da cultura

- EMANNUEL BENTO

Do fervor das ladeiras históricas de Olinda à poesia do Sertão do Pajeú, Pernambuco é um referência cultural para o Brasil. A arte pulsa em cada mesorregiã­o, em cada manifestaç­ão, em cada traço da história.

Com tamanha diversidad­e, os desafios para esse setor não são simples. O Estado tem demandado ações efetivas do poder público, incluindo boas práticas e estruturaç­ões de equipes de órgãos - sobretudo com a grande demanda da Política Nacional Aldir Blanc (NAB), que vai injetar R$ 3 bilhões por ano para a cultura dos Estados até 2027.

Além disso, urge promover um “desafogame­nto” do Funcultura por meio de novas formas de captação de recursos, permitindo que os investimen­tos circulem de forma mais eficiente. Nesse sentido, desponta a implementa­ção do mecenato, concebido de maneira democrátic­a e transparen­te.

Essas iniciativa­s devem ser acompanhad­as por práticas transparen­tes, que transcenda­m as instabilid­ades políticas. As mudanças devem ser implementa­das como forma de promover um ambiente propício para o florescime­nto da economia criativa, catalisand­o o potencial cultural como fonte de desenvolvi­mento econômico e social sustentáve­l.

POLÍTICA NACIONAL ALDIR BLANC

Com a pandemia, os trabalhado­res da cultura tiveram experiênci­as inéditas com as Lei Aldir Blanc (LAB) e da Lei Paulo Gustavo (LPG), que destinaram recursos federais para execução de ações e projetos culturais em todos os Estados. Como legado dessa conquista, o Brasil agora vive a construção da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB).

Com esta política, a União entregará aos Estados, anualmente, parcelas de R$ 3 bilhões durante cinco anos. Essa será uma oportunida­de única de estruturar um sistema federativo de financiame­nto. Como Pernambuco irá se beneficiar dessa nova ferramenta?

Esse é um dos grandes dilemas para os próximos anos. A recente experiênci­a da LPG, que repassou ao Estado mais de R$ 100 milhões para a cultura, foi frustrante para boa parte dos trabalhado­res da área.

RECURSOS PODEM FAZER A DIFERENÇA

O Governo do Estado, através da Secult-pe e Fundarpe, adiou três vezes o resultado provisório da análise das propostas e atrasou em até quatro meses o início do pagamento dos projetos aprovados nos editais da LPG. Além disso, surgiram várias contestaçõ­es sobre os resultados, com muitas reclamaçõe­s sobre falta de transparên­cia.

Para os profission­ais da cultura, ficou evidente a urgência de uma reestrutur­ação eficaz nos órgãos e equipesres­ponsáveis por atender às demandas da PNAB. A chegada da LGP durante um período de mudanças nos quadros de secretaria­do parece ter impactado negativame­nte na execução da lei, acentuando ainda mais a necessidad­e de uma gestão estável e comprometi­da.

Por muito tempo, um dos principais problemas das pastas de cultura foi a “falta de dinheiro”. Nos próximos anos, os aportes federais irão encher as contas do Estado. Caso sejam bem distribuíd­os, esses recursos farão a diferença.

MECENATO NO SISTEMA DE INCENTIVO À CULTURA

Não é novidade que o Funcultura, principal instrument­o de fomento de Pernambuco, anda defasado e já não consegue comportar a diversidad­e de produtores interessad­os - além da velha reclamação de que os mesmos nomes emplacam projetos todos os anos.

Uma solução para essa questão, trazendo mais dinamismo para ose tor,éaimplemen­t ação do mecenato fomento em que instituiçõ­es privadas repassam recursos para projetos culturais em troca de renúncias fiscais.

Como isso ajudaria? Grandes eventos, como festivais de música, cinema e teatro, poderiam utilizar dos impostosde empresas que queiram atrelar as suas marcas aos eventos. Assim, sobraria mais recursos do Funcultura para acultura popular, patrimônio e artistas independen­tes, por exemplo.

É verdade que parte dos trabalhado­res da cultura veem com apreensão esta mudança, visto que os recursos poderiam ir apenas para grandes produtores, ou até minara liberdade criativa dos artistas em detrimento aos interesses das empresas. Contudo, tudo depende de como o mecenato será implementa­do.

MECENATO PRECISA SER REGULAMENT­ADO

O desenho, inclusive, já existe: há sete anos, foi criado o Mecenato Cultural de Pernambuco pela Lei do Sistema de Incentivo à Cultura do Estado de Pernambuco (SIC) - Lei Estadual nº 16.113/2017. Porém, a gestão anterior não decretou a regulament­ação da lei.

A Lei aponta três modalidade­s, sendo o mecenato uma delas. O artigo 20, inclusive, diz que as empresas deverão fazer aporte adicional, não dedutível doic ms, de valor variável consoante como tipo do projeto, ao programa CREDCULTUR­A.

Ovalo ré de 10% para projetos Tipo I( ocupações, aquisições, reformas, restauros ou manutençõe­s de acervos ou de espaços e equipament­os culturais, mapeamento de grupos e expressões culturais e ações de salvaguard­a ); e 15% para objetos do tipo II e III, que englobam projetos cujo objeto compreenda os ciclos culturais tradiciona­is do Carnaval, Semana Santa, São joão e natal, promovidos pelo Poder Público, festivais promovidos pelo Poder Executivo estadual e demais categorias.

Neste sentido, oCRE D CULTURA podes er considerad­o como um fatorl imitador para o financiame­nto de projetos de grandes produtoras e ou grandes eventos.

CICLOS FESTIVOS

Uma questão que tem gerado desconfort­o entre os profission­ais da cultura há bastante tempoéo atual modelo de contrataçã­o dos ciclos festivos. Apesar de ser um tema simples, muitos produtores e artistas ainda o encaram como um tabu, pois todos almejam participar dessas festividad­es.

Qual o problema? Atualmente, o Governo lança as convocatór­ias com o objetivo de habilitar propostas de artistas e grupos para compor as programaçõ­es do município.

No entanto, as contrataçõ­es ocorrem via Prefeitura. A gestão de cada município atua junto ao Governo para garantir um determinad­o valor de recursos para a festa. A Fundarpe também oferece os artistas aprovados e a própria Prefeitura irá selecionar quais deseja.

Assim, o modelo acaba se transforma­ndo em um balcão de negócios entre as gestões, como uma espécie de ferramenta política. omo deloé ótimo para os gestores, mas péssimo para os artistas, que precisam fazer pressão dos dois lados para serem convidados.

Além disso, muitas vezes as prefeitura­s estão interessad­as no impacto da festividad­e perante os eleitores, sem necessaria­mente fortalecer acultura. Por par tedo Estado, fica o desafio de garantir o espaço para acultura popular nos municípios, além de aumentara transparên­cia nessas contrataçõ­es - caso o contrário, o viés de balcão de negócios se acentua.

O QUE DIZ O ESTADO

Em nota sobre o PNAB, a Secult-pe afirma que formulou um Plano de Ação em 2023 e, no começo deste ano, elaborou um Plano Operativo com trabalho de técnicos especializ­ados da secretaria, focados exclusivam­ente na PNAB.

“Essas propostas foram divulgadas nas escutas públicas, promovidas entre Fevereiro e Março. As escutas presenciai­s foram realizadas em todas as macrorregi­ões de Pernambuco”, diz.

“As informaçõe­s obtidas nesses encontros estão sendo sistematiz­adas para a validação de editais e programas, processo crucial para a formulação do Plano Anual de Aplicação de Recursos (PAAR), divulgado pelo Ministério da cultura ”, informa.

Anota acrescenta que parte do recurso do PNAB pode ser utilizado com contrataçã­o de equipe técnica para demandas finalístic­as, garantindo assim a efetiva implementa­ção das políticas públicas.

MECENATO JATEM PREVISÃO, DIZ SECULT

Sobre o Mecenato, a comunicaçã­o da Secult-pe/ Fundarpe afirma que A atual gestão está comprometi­da em realizara entregado programa devidament­e regulament­ado, criando um desenho do funcioname­nto da política, estando atualmente em fase de validação interna na Secult-pe, com posterior envio aos demais órgãos que compõem a administra­ção pública.

A previsão de lançamento do programa, com chamamento público, é para o primeiro semestre de 2025.

“Caberá à Secretaria de Cultura de pernambuco, unidade gestora do Mecenato, estabelece­r, por meio de instrução normativa, critérios objetivos para admissão de proponente­s e respectivo­s projetos, evitando a alta concentraç­ão, tanto no contexto da região de desenvolvi­mento, bem como no porte dos projetos, adotando políticas afirmativa­s que tornam os processos de seleção democrátic­os, acessíveis e inclusivos. Além disso, haverá a necessidad­e de instrução e sensibiliz­ação do setor empresaria­l, como estratégia de fomento aos projetos aprovados ”, diz anota.

“Assim, o setor cultural será impactado positivame­nte em diferentes dimensões: social, simbólica, cidadã e econômica, gerando oportunida­des de emprego e renda, circulação de bens e serviços culturais, além de ampliar os atrativos turísticos e ativar novos negócios.”

Uma questão que tem gerado desconfort­o entre os profission­ais da cultura há bastante tempoéo atual modelo de contrataçã­o dos ciclos festivos. Apesar de ser um tema delicado, muitos produtores e artistas ainda o encaram como um tabu, pois todos almejam participar dessas festividad­es.

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Reamar de Maracatu em fotografia do Concurso de Fotografia Pernambuco Nação Cultural
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Ciclo Junino de Pernambuco

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