UMA MENTIRA
O Supremo Tribunal Federal (STF) deveria tomar providencias para que o sigilo de justiça não se desmoralize tanto como vem ocorrendo nesse processo em que se investiga superfaturamento, propinas e outras excrecências no escândalo da Petrobras. Já não se fala mais, por desnecessário, nos tais vazamentos seletivos. Os vazamentos agora são de depoimentos inteiros. Antes, tiravam-se duas ou três frases de uma delação premiada e alguém, que ninguém nunca soubesse quem, passava para um jornal ou uma rede de televisão. Agora, não. Pega-se o depoimento inteiro, edita uma parte ou outra, e entrega a quem se quer. Uma desmoralização completa.
Ontem, o fato voltou a se repetir, no depoimento do empreiteiro Marcelo Odebrecht ao ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Herman Benjamin, em Curitiba. O ministro foi lá para colher provas de que a chapa Dilma-Temer, teria cometido abuso do poder econômico e político para derrotar o candidato Aécio Neves. A reclamação foi do próprio PSDB que fez uso de um direito seu. Até aí, nada demais. Ocorre que pouco mais de duas horas depois do depoimento de Marcelo Odebrecht, parte de seu depoimento já estava em algumas redações privilegiadas a contar, parcialmente, claro, o que o maior empreiteiro do país havia dito ao ministro Benjamin. Pelo que vazou, Marcelo confirmou uma reunião mantida no Palácio do Jaburu com o então vice-presidente da República Michel Temer para tratar de doação da empreiteira ao PMDB - “de maneira legal, claro” – mas que as conversas foram genéricas. E aí o empreiteiro cai em contradição com um seu ex-diretor, Claudio Melo Filho, que também fez sua delação e revelou que nesse encontro houve o acerto para que a empreiteira passasse para o vice-presidente R$ 10 milhões para a campanha de seu partido. Repasse que foi também parcialmente confirmado pelo ex-assessor de Temer, José Yunes, de que recebeu em seu escritório um envelope com R$ 4 milhões das mãos do doleiro Lúcio Funaro para ser entregue ao hoje ministro de Temer, Eliseu Padilha, para o PMDB.
No depoimento, Marcelo não deu maiores detalhes da operação, embora fizesse questão de dizer que o dinheiro acertado, via o então ministro Guido Mantega, era para a campanha de Dilma e não necessariamente para a chapa Dilma-Temer, como se isso fosse possível. Esses detalhes vazados ontem batem com uma operação que se monta no TSE para que se separe a prestação de contas de 2014, ou seja, que Dilma recebeu uma parte e Temer outra, esperteza que está sendo repelida pelo ministro Benjamin sob a argumentação de que é da jurisprudência do TSE o julgamento das contas da chapa completa e não fatiada como se pretende agora. Em outras palavras, tem alguém mentindo nesse processo.
Carlos Lindenberg é colunista do Metro Jornal. Escreve neste espaço às quintas.