Risco de pólio expõe queda na vacinação
Cobertura vacinal contra poliomielite caiu de 100% em 2013 para 77% hoje. Para especialistas, problema tem várias razões
Anunciado no fim da semana passada pelo Ministério da Saúde, o risco de volta da poliomielite – ou paralisia infantil, que teve o último caso registrado no Brasil em 1989 – tem como principal vilão uma queda abrupta na cobertura vacinal contra a doença, segundo especialistas.
Em 2013, segundo dados do ministério, a cobertura vacinal para poliomielite em crianças de até 1 ano era de 100,71%, ou seja, foram aplicadas mais doses do que se imaginava ser a população-alvo.
Dois anos depois, em 2015, a cobertura foi de 98,29%. No ano seguinte, em 2016, a taxa caiu para 84,42%, e atualmente, segundo o ministério, está em 77%. Ou seja, de cada 100 crianças que deveriam tomar a vacina, 23 não estariam recebendo a imunização.
“Quando as coberturas vacinais caem, existe uma cadeia de fatores que levam a isso. Atribuir só a uma suposta resistência das famílias, como me parece que o ministério tem feito, é insuficiente”, analisa Luiz Augusto Facchini, professor de Medicina Social da Universidade Federal de Pelotas (RS) e membro da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coleitva).
Especialistas, ligados ou não à pasta, disseram ao Metro Jornal que os números devem ser vistos com reserva porque a informatização recente do sistema pode distorcer os dados, mas admitem que há problemas.
“Existe o desconhecimento das doenças e o fato de que a poliomielite, pelo tempo em que está fora do radar, faz as pessoas perderem a percepção do risco. A própria geração mais recente de médicos, que não chegou a tratar casos da doença, pode não estar orientando a população com a ênfase que deveria”, pondera o presidente do Departamento de Imunizações da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), Renato Kfouri.
Não há, até o momento, indícios da volta do vírus da enfermidade, o poliovírus, ao Brasil. Uma suspeita de ocor- rência na doença na Venezuela, no mês passado, foi descartada, mas chamou a atenção das autoridades brasileiras.
Estoques
O ministério decidiu fazer o alerta em 21 de junho, na última reunião da CIT (Comissão Intergestores Tripartite), que reúne representantes do ministério e das esferas estadual e municipal.
Uma integrante da comissão – Cristiane Pantaleão, presidente do Cosems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde) no Paraná – conta que o governo observava o risco desde o ano passado, quando, por cerca de seis meses, uma queda nos estoques forçou postos a racionarem: em vez de oferecerem as doses diariamente, atendiam com agendamento.
“Isso é um problema sério, porque uma mãe que chega na unidade e descobre que não tem vacina naquele dia pode não ter facilidade para voltar. A queda nas vacinações pode começar aí”, avalia Kfouri, da SBP.