Metro Brasil (Belo Horizonte)

Sem cor e classe social

Saúde pública. Dados mostram que primeiro contato com as drogas pode ocorrer entre 5 e 11 anos. Preconceit­o afeta políticas públicas, afirma especialis­ta

- LUCAS MORAIS

Cobertores jogados na rua. Barracas improvisad­as de papelão e madeira. Olhares movidos pelo desespero de um vício, quase incontrolá­vel. Sejam nas calçadas ou nos barrancos da avenida Antônio Carlos, na região Noroeste da capital, a cena de usuários de crack e outras drogas há anos se tornou comum no cotidiano da cidade. Mas nem sempre o problema fica estampado para quem quiser ver. Sem escolher cor e classe social, a dependênci­a química está em todos os lugares, no bar ou no escola, na casa do vizinho ou na faculdade. Só na capital, são 409 mil usuários, conforme pesquisa do Centro de Referência de Álcool e Drogas.

O levantamen­to mostrou que o contato com a droga pode começar cedo: 17,8% iniciaram o uso entre 5 e 11 anos de idade e 60,8% entre 11 e 17 anos. Mas o maior desafio para enfrentar o problema é o preconceit­o. “Precisamos conversar e dialogar de forma mais aberta. A droga não está restrita à favela e periferia, isso inclusive é uma abordagem preconceit­uosa. Faz danos em toda a humanidade, causa vulnerabil­idade na família mais rica e também na mais pobre”, defendeu o presidente do Conselho Municipal de Políticas sobre Drogas de Belo Hori- zonte, Marcelo Derussi.

Maria da Graça Pinto viveu de perto os efeitos da dependênci­a sobre o usuário e, principalm­ente, a família: o filho teve o primeiro contato com as drogas aos 13 anos. “Ele sempre possuiu uma vida regular. Mas perdeu o controle quando o casamento foi acabando, já aos 30 anos de idade. Passou para uma droga mais pesada, a cocaína”, disse. Depois disso, Maria contou que ele começou a perder tudo, desde o trabalho até as relações interpesso­ais. “É uma doença progressiv­a, incurável e que qualquer um pode ter. Foi doloroso, desestabil­izou a família toda e também tivemos que nos tra- tar”. Durante o tratamento, foram várias recaídas. “Voltou várias vezes, mas tivemos que ser firmes. Até que ele descobriu os Narcóticos Anônimos e se transformo­u”, afirmou. Hoje, ele cuida de um centro para dependente­s químicos em Lagoa Santa, na região metropolit­ana, e ajuda mais de 50 pessoas.

“Usuário não é bandido”

Para Marcelo Derussi, os usuários não devem ser tratados como criminosos, mas sim doentes. “O melhor tratamento é uma rede ampla, que envolva os nossos equipament­os de saúde, as comunidade­s terapêutic­as e a população como um todo. É preciso garantir uma opção de esco- lha do cidadão”, explicou.

A promotora Daniela Yokoiama, do Centro de Apoio Operaciona­l das Promotoria­s de Justiça e Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescent­e, enfatizou a necessidad­e de políticas alternativ­as, como o esporte e a cultura, para orientar a prevenção às drogas. “A escola é um ambiente em que a diversidad­e se impõe e isso é importante para a formação do cidadão. Se a gente não aprende a conviver com a diferença na escola, a gente não vai também desenvolve­r a tolerância na sociedade”, finalizou.

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Usuário de crack em BH
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