Ataques a terreiros se espalham pelo Rio
Medo de que traficantes estejam por trás de violência impede que vítimas denunciem
Não é só na Baixada, onde sete casas de religiões afro foram depredadas nos últimos meses a mando do tráfico, que o problema existe. Além dos casos mostrados ontem pelo DIA, em vários bairros cariocas episódios assim se repetem.
Os atentados às casas de religiões de matriz afro-brasileiras, revelados na edição de ontem do DIA, vêm crescendo também fora da Baixada Fluminense. O Babalorixá Márcio de Barú, do centro Ilé Axé Obá Inã, na Penha, conta que seu terreiro tem sido alvo de ataques frequentemente.
De acordo com o religioso, todas as segundas-feiras, quando inicia a cerimônia chamada gira, grupos de pessoas começam com as agressões. “Jogam pedras portuguesas, ovos e legumes no telhado do barração. Tive de colocar até uma lona na parte que é aberta para proteger os frequentadores”, lamentou. Ele conta que, em abril, registrou queixa na 22ª Delegacia de Polícia, no bairro.
É justamente o registro em delegacias que as autoridades estão pedindo que as vítimas dessas agressões façam. Na Baixada, pelo menos sete casas de religiões afro-brasileiras foram depredadas nos últimos dois meses, conforme levantamento líderes religiosos locais, mas nem todas as vítimas registraram ocorrências, por medo de represálias.
O chefe de Polícia da Baixada Fluminense, Sérgio Caldas, disse que isso é necessário para início das investigações. “É fundamental que essas pessoas se dirijam à delegacia. Podemos colocar toda a investigação sob sigilo, ou seja, somente o delegado terá acesso aos depoimentos e dados das pessoas”, contou Caldas.
E não são só depredações de terreiros que vêm ocorrendo. Pessoas relatam perseguições. A dona de casa Lilian Souza, 43, que tem uma tatuagem em referência a uma entidade da umbanda, disse que teve de retirar seus filhos da escola no meio do ano passado, em Senador Camará, porque sofriam com xingamentos preconceituosos. “Agora na nova escola ele já voltou a sofrer perseguição. Não sei o que fazer.”
O secretário de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos, Átila Alexandre Nunes, acredita que esses ataques são orquestrados e pede que sejam
Jogam pedras portuguesas, ovos e legumes no telhado do barracão. Tive de colocar até uma lona na parte aberta para proteção MÁRCIO DE BARÚ, babalorixá
Para ter dado específico, deveria ser criada pela Secretaria de Segurança a subclassificação de injúria mediante elemento religioso
SÉRGIO CALDAS, chefe de Polícia da Baixada
Os comportamentos reprováveis só podem ter repressão penal se estiver escrito na lei. A intolerância sozinha é sentimento pessoal
ANTONIO PEDRO MELCHIOR, advogado
investigados mais profundamente. Como O DIA mostrou ontem, traficantes estariam por trás dos atentados. Segundo Nunes, há denúncias também de que o tráfico estaria se associando a falsas igrejas para lavar dinheiro e, por isso, não querem a presença de outras religiões nas áreas em que atuam.
Para protestar contra as agressões, no próximo dia 17, líderes de diversas religiões irão se reunir para a 10º Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa, na orla de Copacabana.