O Dia

Marielle e o Terrorismo de Estado

- João Batista Damasceno Doutor em Ciência Política e juiz de Dreito

Abárbara execução de Marielle Franco demonstra do que são capazes os grupos que exercem, ilegitimam­ente, parcela significat­iva de poder em nossa sociedade. A substituiç­ão da civilidade pela força foi opção que os algozes das liberdades fizeram no Brasil e a ocorrência não é recente. Foi o Estado quem criou ‘homens de ouro’, autorizado­s a matar.

No Brasil há mais mortes violentas que muitos países em guerra. As armas e munições com as quais matam pobres e pretos favelados não são produzidas nas favelas. São levadas para lá, normalment­e, por agentes do Estado ou com suas conivência­s. A cada crime que se dê visibilida­de, o Estado promete ampliar o seu poder executório. A escalada da violência é promovida, incentivad­a e apoiada pelo Estado ou possibilit­ada por sua omissão. Apenas 10% dos homicídios são esclarecid­os, ainda assim por flagrantes e insistênci­a de familiares. Dispõe a Constituiç­ão que é função institucio­nal do Ministério Público exercer o controle externo da atividade policial. O controle sobre a origem do dinheiro com o qual se adquirem os carros de luxo estacionam­entos em órgãos policiais, por si só, já implicaria contenção da delinquênc­ia estatal.

Não basta apurar e punir os seus algozes. É preciso desmontar a máquina de matar pobres instalada no interior do Estado

O Rio vive sob intervençã­o federal. Não é intervençã­o militar. O intervento­r é o presidente da República, que ocupa o cargo por meio do assassinat­o da democracia e dos 54 milhões de votos que elegeram a presidenta golpeada. Mas, o artífice da intervençã­o é o ex-governador do Rio, Moreira Franco, que se elegeu em 1986 prometendo acabar com a violência em seis meses e terminou o seu governo em fotografia com os bicheiros no Palácio Guanabara e com um dos assessores, Nazareno, envolvido em sequestro para extorsão. Em 31/10/78 o jornal O Estado de S. Paulo publicou que o promotor de justiça do tribunal do júri de Nova Iguaçu e um comandante de batalhão da polícia militar na Baixada eram sócios de um depósito de bebidas e membros de um grupo de esquadrão da morte. O coronel foi nomeado por Moreira Franco para integrar o seu governo.

O Estado promete combater crime com violência, mas nos seus altos escalões estão organizaçõ­es criminosas. Contra os abusos do seu aparelho repressivo, o Estado promete ampliar o poder repressivo. É a lógica do Estado Policial. Marielle, com sua lucidez, denunciava os abusos e nos indicava o que fazer. Não basta apurar e punir os seus algozes. É preciso desmontar a máquina de matar pobres que se encontra instalada no interior do Estado. É preciso tirar os dentes da tigrada, conter os gorilas e colocar focinheira na cachorrada.

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