QUARTETO AFIADO
Ana Beatriz Nogueira, Regina Braga, Zélia Duncan e Luciana Braga fazem crítica social com humor em ‘Mordidas’, peça feita sem patrocínio. “Amor pelo meu ofício”, diz Ana.
No palco, uma história contada por quatro personagens. São amigas, da alta classe, de caráter duvidoso. Na vida, três atrizes e uma cantora-atriz, apaixonadas e leais aos seus ofícios, que se uniram para realizar um projeto. E remar contra a maré do difícil momento na cultura no país. Isso reflete um pouco o que vivem Ana Beatriz Nogueira, Regina Braga, Luciana Braga e Zélia Duncan, em cartaz com o espetáculo ‘Mordidas’, no Teatro Fashion Mall, em São Conrado, até 27 de maio. Em cena, as relações humanas.
“Fazemos mulheres ricas, cercadas de beleza e falta de sentido existencial, cada uma com características específicas, que se reúnem no intuito de preencher o vazio de suas almas. Mas são superficiais e não são capazes de perceber a própria monstruosidade de seus atos e de sua paralisia”, conta Luciana. “A peça lança um olhar impiedoso sobre a cegueira das ‘altas classes’. Mas com altas doses de humor, que é sempre o melhor caminho para a reflexão. E toca numa ferida delicada da sociedade brasileira, que é o abismo da divisão de classes. E a falta de autocrítica de uma parcela da sociedade”, completa.
Inédita no país, a comédia do argentino Gonzalo Demaria ganhou versão brasileira de Miguel Falabella e direção de Victor Garcia Peralta. A idealização é de Ana Beatriz, que produz a peça integralmente com recursos próprios.
Mas afinal, o que move Ana a querer estar no palco, mesmo sem patrocínio? “Amor pelo meu ofício. Meu compromisso com todos que cativei para que este projeto acontecesse. Resistência para que o teatro permaneça vivo e feito por profissionais, com seu registro profissional reconhecido”, desabafa. E continua: “Estamos fazendo muitos movimentos para defender nosso teatro, a arte e nossa cultura. O país está andando pra trás, na direção errada. É um grande retrocesso o momento que estamos vivendo”.
SINTONIA
O elenco está igualmente empolgado no desejo de colocar em cena algumas reflexões. Tanto que Regina celebra a bravura de Ana: “É coragem levantar uma produção assim por conta própria. E um privilégio estar nesse elenco, nessa hora, nessa cidade”.
Luciana salienta o acúmulo de funções da atriz-produtora, que batalha para estrear desde que comprou os direitos há um ano e meio. E dando uma de repórter, aproveita para perguntar se Ana Beatriz faria tudo outra vez. Faria? “Se preciso fosse, meu amor...”, garante Ana, cantarolando, bem-humorada.
Zelia Duncan, que já teve
outras experiências no palco, exalta a sintonia da amizade de longa data com Ana: “A mão dupla da nossa amizade vem do amor. Paciência, parceria e cumplicidade fazem parte do pacote que construímos!”
FORÇA MOTRIZ
Ana Beatriz admite se alimentar prazerosamente do trabalho.
“É meu ofício, meu sustento, minha festa, meu programa preferido, minha diversão, minha ligação com o mundo, minha saúde”, enumera.
No ar em ‘Malhação: Vidas Brasilei-
Estamos fazendo movimentos para defender nosso teatro, a arte e nossa cultura. O país está andando pra trás”
ANA BEATRIZ NOGUEIRA, Atriz
ras’, e em cartaz no teatro, ela vai sair direto do folhetim adolescente para a próxima trama de Aguinaldo Silva, com título provisório de ‘O Sétimo Guardião’.
“Essa coisa de emendar um trabalho no outro, já faço há uns dez anos. Mas estou muito animada porque vou trabalhar com um dos autores que mais admiro no mundo. É um sonho trabalhar com Aguinaldo”.
A atriz, que recentemente revelou ser portadora de esclerose múltipla há nove anos, diz que o tratamento não impõe limites na sua rotina.
“Sou uma sortuda. Já me acostumei com as reações colaterais e lido com elas da melhor forma possível. São coisas que fazem parte do quadro e é possível viver bem com elas”, diz Ana Beatriz, que decidiu compartilhar seu diagnóstico com o público no intuito de ajudar outras pessoas.
“Acho que ajuda o fato de tê-lo há tantos anos, e também estou durante todos esses anos sendo vista enquanto exerço um trabalho público. São as atitudes, os trabalhos realizados, com o diagnóstico, tratando. Com a doença totalmente controlada, mostrando que é possível e dando força pra quem está recebendo o diagnóstico agora”, conta a atriz, que criou um blog, o qualeopensamento.com, sobre o assunto. “Lá, respondo a todo mundo dentro do tempo que tenho, diretamente e com muito carinho”.
Atrizes interpretam mulheres ricas e superficiais em ‘Mordidas’, que aborda a divisão de classes e a falta de autocrítica da sociedade