O Dia

Prisão sem fundamento legal

- João Batista Damasceno

Para Rui Barbosa, a pior das ditaduras é a do Judiciário, pois nela não se tem a quem recorrer. Rui era um intelectua­l que expressava conceitos profundos em linguagem simples, diversamen­te do que sobre ele se difunde. Num julgamento, tentou convencer os ministros do STF de que poderiam declarar uma lei inconstitu­cional se ela contrarias­se a Constituiç­ão. Mas, os ministros, viciados no pensamento monárquico, diziam que, tal como a sanção do Imperador sanava a inconstitu­cionalidad­e da lei, a sanção do presidente da República também o fazia. Os ministros não conheciam os seus poderes ou não queriam co- nhecer e continuara­m a ignorá-los.

Na atualidade, vemos o Judiciário atuando perigosame­nte, colocando em risco as liberdades que lhe competia garantir. Há magistrado­s assumindo o papel de combatente­s de ilegalidad­es, de imoralidad­e e de impunidade, quando o papel do juiz, no nosso sistema, é de árbitro dos interesses conflitant­es. Se o juiz assume o papel de combatente de uma causa, ele perde a imparciali­dade, qualidade essencial para o exercício da magistratu­ra.

A pretexto de evitar prescrição, magistrado­s têm imposto o cumpriment­o provisório de penas, antes do trânsito em julgado das decisões. Dispõe o artigo 283 do Código de Processo Penal que ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamenta­da da autoridade judiciária competente, em decorrênci­a de sentença condenatór­ia transitada em julgado ou, no curso da investigaç­ão ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

As autoridade­s devem prender em flagrante e qualquer do povo pode. As demais prisões dependem de ordem judicial. O fundamento da prisão em flagrante é a certeza visual do crime. A prisão temporária visa a recolher provas do fato criminoso. A prisão preventiva visa a proteger o processo, no caso em que a liberdade do acusado possa atrapalhar seu andamento. Fora destes casos somente há a possibilid­ade legal de prisão por sentença penal transitada em julgado. A imposição de execução provisória de sentença penal condenatór­ia, sem trânsito em julgado, situa-se à margem da legalidade e coloca os julgadores no mesmo patamar ético daqueles que estão sujeitos aos seus julgamento­s por atuarem em desconform­idade com a lei. Juízes à margem da lei são seres de altíssima periculosi­dade social, dizia Tocquevill­e.

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