O Dia

Moradores colocam a mão na massa

Quem vive em Belford Roxo precisa fazer o trabalho da prefeitura quando o assunto é obra na rua

- GUSTAVO RIBEIRO gustavo.ribeiro@odia.com.br

Onde o poder público não oferece condições básicas para a qualidade de vida, a população precisa fazer o trabalho da prefeitura. O Parque Esperança, em Belford Roxo, é o retrato de um bairro estacionad­o no tempo, onde muitas ruas ainda são de barro e têm esgoto a céu aberto. Exausto do lamaçal e de ter a casa inundada sempre que chove há 40 anos, o aposentado Josias Barcelos, 70, se uniu a dois vizinhos para botar a mão na massa. Juntos, colocaram concreto na rua e abriram galerias para escoar a água. É o que mostra a segunda reportagem da série ‘Baixada pede socorro’.

Há cerca de dois anos, Josias e os vizinhos decidiram fazer a obra na rua, localizada às margens da Avenida Joaquim da Costa Lima, que tem trânsito intenso de veículos. Para comprar três caminhões de pó de pedra, gastaram R$ 2,4 mil. “Aqui passa uma cachoeira muito grande quando chove. Tem hora que a água sobe na altura do joelho. Eu abro essa tampa aqui para ela descer. Dá dor no peito quando cai chuva braba e começo a passar mal”, contou o idoso, apontando para uma galeria que construiu na porta de casa. Ainda assim, quando o toró é muito forte, a galeria transborda e não tem jeito: o aguaceiro invade o quintal.

O morador já arregaçou as mangas de novo e começou a erguer uma espécie de barreira de concreto na beira da estrada para evitar a enxurrada que desce da avenida em dias de temporal. “Já entrou muita água em casa de molhar o sofá e a gente ficar naquele desespero. Se começar a chover, meu marido fica em estado de nervos e levanta para tirar essas tampas que cobrem a galeria”, disse a doméstica Maria da Conceição Reis, 62, mulher de Josias.

“São décadas de promessas. É começarem as eleições que os políticos aparecem. Não tenho mais esperança, porque sai um prefeito, entra outro e a situação continua. Dizem que é falta de dinheiro, mas eu digo que é falta de vontade”, desabafou ela.

Coleta de lixo não passa pelo local e os moradores precisam levar seus resíduos até a avenida. Dificuldad­e também na saúde. Semana passada, Josias buscou atendiment­o no Hospital do Joca, recém-reaberto, mas desistiu porque estaria superlotad­o. “Tinha só um clínico e um pediatra”, relatou. VIOLÊNCIA DISPARA

Além dos transtorno­s com infraestru­tura, os moradores de Belford Roxo convivem com o descontrol­e dos índices de violência. De acordo com o aplicativo Fogo Cruzado, laboratóri­o colaborati­vo de dados sobre violência armada, aquela foi a cidade da Região Metropolit­ana que sofreu o maior aumento de tiroteios e disparos de armas de fogo nos 100 primeiros dias de 2018: um salto de 490%, passando de 30 para 177 o número de alertas emitidos em comparação ao mesmo período do ano passado. O município lidera o ranking na Baixada e aparece em terceiro lugar na Região Metropolit­ana, atrás apenas do Rio, com 1.443 ocorrência­s em 2018, e São Gonçalo, com 242 registros.

Na Baixada inteira foram registrado­s neste ano 510 tiroteios e disparos, com pelo menos 131 mortos e 82 feridos. A quantidade equivale a cinco situações por dia e a 21% das ocorrência­s no Grande Rio. Os homicídios de dois funcionári­os da prefeitura, vítimas de assaltos no dia 29 de março — o secretário de Ordem Pública, Marcos Wander Silva de Oliveira, e a professora Tânia Maria da Silva Lima —, ampliaram o foco sobre os problemas de segurança pública.

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FERNANDA DIAS ARQUIVO PESSOAL Josias Barcelos, morador do Parque Esperança, fez obra na própria rua para evitar alagamento­s em casa
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Na Avenida Joaquim da Costa Lima, em Belford Roxo, uma cachoeira se formou em meio ao asfalto
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