O Dia

Não existe mágica

- Tatiana Roque Professora de Matemática e Filosofia da UFRJ

Vamos imaginar que a polícia prenda, de uma só vez, todos os jovens envolvidos com furtos e venda de drogas no Rio de Janeiro. Mesmo nessa situação, obviamente impossível, o enorme problema da inseguranç­a não estaria resolvido.

Ainda que houvesse vagas nas prisões, no dia seguinte estaríamos enxugando gelo, começando de novo. Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), em sete anos o número de roubos aumentou 91%. Veja que curioso: o desemprego subiu 96,2% de 2014 para 2017. Não é mera coincidênc­ia.

Agora vamos imaginar que todos os jovens que estão no crime decidam procurar emprego. Sabemos que não haverá vagas. Na melhor das hipóteses, um emprego pessimamen­te remunerado, sem garantias mínimas ou condições dignas. A triste realidade é que as escolhas do governo Michel Temer jogam mais jovens no mundo do crime.

Por outro lado, quem diz que vai resolver o problema na base do “prende e arrebenta” mente descaradam­ente para iludir a população. Com tantos jovens sem perspectiv­a de futuro, não há prisão que dê conta. O Brasil precisa é de uma política firme e contínua de criação de empregos. O resto é conversa para enganar ingênuo em ano eleitoral.

Para caminhar na direção da paz social, pelo menos duas ações são fundamenta­is, e elas são complement­ares. A primeira é distribuir renda. Quando as pessoas têm mais dinheiro, consomem mais. Quanto mais pobre é o cidadão, mais imediato é o consumo, o que faz a economia crescer. Se eu recebo um pouco mais de dinheiro, penso em consertar algo na casa, compro material de construção, e o dono da loja pode contratar mais um vendedor, que terá dinheiro para consumir mais.

A economia funciona assim, a partir da demanda por produtos. É por isso que programas de transferên­cia de renda como o Bolsa Famí- lia, o aumento do salário mínimo e o microcrédi­to foram tão importante­s para o cresciment­o. O governo atual, infelizmen­te, vai na direção contrária. Ele está tirando o ar da economia brasileira, e assim o país respira com dificuldad­e.

Tão importante quanto estimular o investimen­to na produção de bens de consumo é adotar políticas duradouras de geração de empregos para os jovens e os mais pobres, mas sem repetir as velhas estratégia­s centraliza­das que só favorecem poucos setores da economia. É preciso levar em conta o potencial e a vocação de cada local, criar oportunida­des de cresciment­o para todos. Grandes indústrias são importante­s para integrar o Brasil ao mercado internacio­nal, mas não serão suficiente­s na geração dos empregos necessário­s para recuperar o tempo perdido.

Os países que deram saltos para o desenvolvi­mento avançado investiram pesadament­e no ensino, na ciência e na tecnologia. Essa é a única pavimentaç­ão possível para o nosso caminho, ligada a ações culturais e estímulo a pequenas empresas. O desafio é imenso, complexo, e exige ações integradas. A paz só será alcançada quando os políticos deste país entenderem que é preciso criar para os jovens oportunida­des de trabalho digno e perspectiv­a de futuro. Qualquer outra solução é conversa mole para o eleitor dormir.

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