O Dia

Frio é uma dificuldad­e a mais para quem vive nas ruas do Rio

Prefeitura faz contagem da população de rua, estimada em 14 mil em 2016. Vagas de abrigos são 2.335

- RAFAEL NASCIMENTO rafael.nascimento@odia.com.br WILSON AQUINO wilson.aquino@odia.com.br

População de rua é bem maior do que o número de vagas nos abrigos da prefeitura. Para amenizar os efeitos dos dias gelados de outono, as campanhas para coleta de agasalho começam a se multiplica­r.

os últimos dois dias, quando chegou a madrugada, eu só chorei e pedi a Deus para que o dia clareasse e o frio passasse”. O relato é de Cristiane Quirino Tavares, 38 anos, que mora nas ruas da Lapa há cinco anos. Mas, poderia ser de qualquer morador de rua do Rio. O inverno começa, oficialmen­te, no dia 21 de junho, porém as baixas temperatur­as registrada­s— ontem a cidade atingiu recorde de frio no ano com 10,6 graus em Jacarepagu­á— já castigam os que não têm onde se abrigar.

A Prefeitura do Rio diz que mantém 63 abrigos na cidade, sendo 39 públicos e 24 conveniado­s, com 2.335 vagas para quem não tem um teto. O problema é que isso não basta. Afinal, a população de rua ultrapassa as cinco mil pessoas, segundo o último censo, realizado em 2013. Em 2016, a então secretária de Assistênci­a Social e Direitos Humanos, Teresa Bergher, afirmou que eram mais de 14 mil. Hoje, a prefeitura não sabe quantos são, alega que ainda está fazendo o levantamen­to.

Segundo o médico Alfredo Guarisch, membro da Câmara Técnica de Segurança do Paciente do Conselho Federal de Medicina, quando a temperatur­a do corpo, que normalment­e é de 37°, cai para menos de 35°, a pessoa começa a sofrer com a hipotermia, que pode ser fatal. E isso ocorre após uma exposição prolongada a ambientes frios. “O sujeito congela e tem coagulopat­ia (distúrbio de coagulação sanguínea). É uma morte complexa”, disse. “O risco de hipotermia aumenta se não tiver roupa suficiente para se manter quente, ou se não tiver a cabeça coberta, já que perdemos 20% do calor do corpo através da cabeça”, explicou Guarischi, salientand­o que as vítimas fatais, na maior parte das vezes, são dependente­s químicos e desnutrido­s. Na segunda-feira, dois moradores de rua morreram por causa do

frio em São Paulo.

Em muitos do Rio, quem vive nas ruas tem que buscar estratégia­s para driblar o frio. Os companheir­os de infortúnio se aproximam uns dos outros na hora de dormir, buscam refúgio em marquises e improvisam barracas com papelões. Os mais sortudos

têm cobertores e lonas para espantar o vento gelado.

“Quando chove aí tudo fica pior. Temos que ficar debaixo da marquise”, contou a ex -empregada doméstica Eliene Prates Santos, 52, que mora nas ruas da Lapa. E ela tem razão. Caso se molhe na chuva e não se seque de imediato, e

se vier um vento frio, a água, ao evaporar pela pele, leva a temperatur­a corporal a baixar. “Já fui para um abrigo da Ilha do Governador, mas é um sofrimento. Estou há um ano nas ruas por causa do alcoolismo. Não quero que meus filhos me vejam nesta situação”, lamentou Eliene.

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DANIEL CASTELO BRANCO
 ?? DANIEL CASTELO BRANCO ?? Nas madrugadas, moradores de rua improvisam lonas e lençóis sob as marquises do Centro para amenizar o frio. Rio teve a temperatur­a mais baixa do ano ontem, com 10,6 graus
DANIEL CASTELO BRANCO Nas madrugadas, moradores de rua improvisam lonas e lençóis sob as marquises do Centro para amenizar o frio. Rio teve a temperatur­a mais baixa do ano ontem, com 10,6 graus
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SEVERINO SILVA Moradores se juntam sob coberta para aquecer as noites

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