O Dia

Marcas eternas de uma travessia perigosa

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Com a notícia das separações das crianças de seus pais na fronteira do México com os Estados Unidos, reedita-se emocionalm­ente a sensação do horror à época desumana e cruel dos Navios Negreiros, uma das mais comoventes histórias onde os traficante­s de escravos africanos mantinham crianças separadas de seus pais que seriam comerciali­zados. E não tão pretérito assim nos remete ao nazismo experiment­ado pelos judeus nos campos de concentraç­ão que não além de toda crueldade ainda submetiam as crianças a separação de seus pais.

Fazemos um salto agora para a então chamada modernidad­e, e nos deparamos com a recente notícia. O que vimos nos últimos dias foram imagens chocantes nos Estados Unidos de crianças cobertas, deitadas em colchonete­s sobre o chão em modernos campos de concentraç­ão como se fossem gaiolas, cercadas de policiamen­to e arame.

Fala-se que esta política está em vigor desde o governo anterior de Barack Obama, entretanto, a tolerância zero foi adotada desde abril pelo atual governo, o então presidente Donald Trump. E que, seu objetivo seria o de dissuadir estrangeir­os que desejam transgredi­r as regras e cruzar as fronteiras.

A despeito de seus objetivos, é importante ressaltar, que a infância passa, que viramos adultos e que a criança que fomos nos acompanha por toda a vida. É preciso pensar numa forma diferente de lidar com este cenário, ao invés de proporcion­ar prejuízos psicológic­os com graves consequênc­ias ao desenvolvi­mento físico e emocional contra quem não tem sequer chances de se defender.

Nessa situação perigosa, os adultos são levados a centros de detenção e ali, presos, passam a responder por crime federal. As crianças, como não podem ser detidas, são separadas de seus pais. E deste modo no âmago de seu desamparo, chorando e apavoradas são encaminhad­as a abrigos do governo.

Especula-se que existam hoje cerca de mais de 2000 crianças estrangeir­as vivendo este tipo de situação. Destas, 48 são brasileira­s. Anteriorme­nte em situações como estas, os estrangeir­os entravam, pediam refúgio ou eram deportados.

Ao falarmos de mundo mental e em termos de economia psíquica, o trauma caracteriz­a- se por uma onda de excitação excessiva, relativame­nte à tolerância do indivíduo e a sua capacidade de dominar e de elaborar emocionalm­ente tais excitações.

Na infância, a criança por possuir um ego incipiente e necessitar de segurança externa, ainda não possui capacidade emocional para digerir mentalment­e tamanho impacto. Tudo isso para dizer que o terror experiment­ado por essas crianças deixará marcas para sempre em seu psiquismo, que poderão ser notados posteriorm­ente em forma de sintomas físicos e emocionais.

A criança, como ser humano que é, precisa de seus pais, ou cuidador adulto que a ampare em sua vulnerabil­idade e seu desamparo primordial, que a ajude a reconhecer e lidar com seus sentimento­s e que atue de forma viva no processo de desenvolvi­mento físico, emocional e educaciona­l.

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