O Dia

A luta do bem contra o mal

- Gabriel Chalita

Junior é bom. Junior é mau. Junior acorda cedo e ajuda a sua mãe que está em uma cadeira de rodas há algum tempo. Antes de sair, passeia com o cachorro, rega as plantas, conversa com uns passarinho­s que cantarolam primavera para a mãe.

Junior maltrata sua namorada. Trata-a como se fosse um objeto. Já a espancou algumas vezes. Depois se arrepende. Pede perdão. E, Julieta, a namorada, o recebe de volta.

Junior brinca com os filhos do seu irmão. É um ótimo tio. Nem um dia extenuante de trabalho tira dele a disposição para rolar no tapete da sala inventando todo tipo de estripulia­s.

Junior participa de rachas. Gosta da velocidade dos carros. Já foi alertado algumas vezes. Já viu amigos sendo presos por terem atropelado e matado pessoas que, inocenteme­nte, caminhavam em calçadas.

Junior ajuda quem dele precisa. Como pode. Basta alguém de sua comunidade pedir alguma coisa que lá vai ele para arrumar um desarrumo qualquer.

Junior tem pavio curto e, quando bebe, piora. Não poucas vezes arrancou sangue de alguém que o desafiou em algum bar. Se olham para sua namorada, então, ele é capaz de deixar desacordad­o o desavisado. Julieta não gosta das atitudes do namorado. Mas tem medo. De ficar com ele. E medo de largar dele.

A mãe de Junior pouco sabe dele. Só sabe do seu afeto, do seu cuidado com ela, da sua meiguice com a família. Quando contaram de alguns arroubos do filho, ela não acreditou. “Junior é bom”, repete a mãe. E se põe a falar das coisas boas que ele faz.

Uma vez, uma diretora de escola disse o contrário: “Ele é mau, me desculpe, mas o seu filho é mau”. A mãe de ombros e saiu sem qualquer decisão. Isso foi antes do acidente que tirou dela boa parte dos movimentos. Acidente causado pela imprudênci­a de Junior. Ele estava em alta velocidade, mas ela não percebeu, ele havia bebido e ela fez questão de não saber. O filho saiu ileso, a mãe ficou presa nas ferragens e, até hoje, em casa.

“A culpa não foi do Junior”, disse ela muitas vezes e, em outras vezes, quando alguma acusação era feita ao filho bom. “O problema é que ele é nervoso. Quando está calmo, é um anjo”. Era esse um outro texto que a mãe usava mais para a família. Para que compreende­ssem o menino.

O menino é um homem. E é dual. Tem atitudes generosas e atitudes perversas. Há teorias e teorias que tentam explicar essa luta no interior do ser humano. O bem e o mal. O homem nasce bom e a sociedade o corrompe? O homem nasce mau e a sociedade o melhora? O homem tem dentro dele dois lobos: um pacífico e um cheio de ódio. Cresce e domina o que ele alimenta mais? Qual a teoria mais correta?

Dona Amanda, mãe do Junior, não entende das filosofias. Nem percebe que excesso de proteção pode prejudicar. Julieta, a namorada, também não gosta de pensar muito. Se pensasse, se ouvisse alguns conselhos, se pesquisass­e, não ficaria com alguém que a desrespeit­a.

E Junior? Nasceu como? Foi ficando como? Tem conserto?

Respostas simplistas não resolvem grandes inquietaçõ­es. As perguntas sobre os outros talvez sejam um caminho para refletirmo­s sobre a nossa própria dualidade. Bondades e maldades, não sei por qual razão, estão em nós. Só sei que precisamos ser fortes o suficiente para decidirmos.

Prefiro continuar acreditand­o que o bem vence o mal. Sempre. Mesmo que demore um pouco...

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