O Dia

Sequência que distrai ou aliena

- Ana Cecília Romeu Publicitár­ia e escritora

Oser humano tende a acompanhar sequências, se deleitar ao assistir às histórias dos outros como quem desfruta em capítulos, sejam elas fictícias ou verídicas.

No Brasil, desde o final do século 19, os folhetins - romances ou novelas publicadas em capítulos nos jornais -, alcançaram atenção da sociedade. Uma narrativa dinâmica, instigante e que aflora a curiosidad­e caíram no gosto popular.

Hoje, as telenovela­s, filhas dos folhetins, prendem a atenção da maioria dos brasileiro­s.

Infelizmen­te, a leitura de um livro, mesmo que repleto de eventos e suspense, não possui demanda dentro da cultura do brasileiro, mais conformado em assistir do que elaborar reflexão.

O apelo dos fatos em capítulos se percebe, por exemplo, quando as redes de televisão se valem de curiosi- dades a fim de despertar sequências dentro de um campeonato esportivo.

E a Copa do Mundo de Futebol, que por si tem o atrativo do futebol, paixão mundial; da “guerra” entre países e continente­s; e a batalha por si só dos jogos, ainda pode servir de cenário para novelas paralelas: o jogador que cai e simula faltas, e logo todos querem ver se ele seguirá fazendo isso e como; o atacante benfeitor; o craque que sempre faz gol ou aquele que passa imperceptí­vel e cuja invisibili­dade gera audiência.

Também as tragédias nacionais ou internacio­nais recebem o devido trato de roteiro televisivo: a calmaria, o desastre, tentativa de resgate, o ápice que é o próprio resgate, novamente a calmaria até o desfecho.

O que pode ser terrível armadilha ao estimular que ignoremos as tragédias próximas como quando paramos o carro no semáforo e uma criança pedinte vem até nós. O que não parece ser uma sequência, pois todos os dias é a mesma história banalizada..., de capítulo único. Enquanto isso, as nossas crianças seguem morrendo por “bala perdida”; são abusadas, exploradas; trabalham ao invés de estudar e brincar.

O limite entre distração e alienação é fina parede de vidro. O senso crítico se faz essencial para que não se perca o gosto pela brincadeir­a, mas se saiba distinguir o que deve ser levado a sério.

A vida é uma sequência, na maioria das vezes, sem grandes espetáculo­s ou cenas de blockbuste­r. Com personagen­s pouco pitorescos e heroicos, mas ainda assim é a nossa vida, o roteiro que escrevemos às cegas.

“O senso crítico se faz essencial para que não se perca o gosto pela brincadeir­a, mas se saiba distinguir o que deve ser levado a sério.”

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