O Dia

ESCOLAS DE CAXIAS TÊM COZINHAS SUJAS E DESPENSAS VAZIAS, REVELAM FISCAIS

Caxias pagou mais de R$ 60 milhões a empresas, mas fiscalizaç­ão achou cozinhas sem condições de uso, despensas vazias e erros nas contas

- CÁSSIO BRUNO cassio.gomes@odia.com.br

Empresário­s investigad­os na Lava Jato receberam mais de R$ 60 milhões da prefeitura para fornecer merenda a alunos do município. Fiscalizaç­ão encontrou diversas irregulari­dades nos contratos.

Os empresário­s Marco Antônio de Luca e Antônio Carlos Monteiro, donos da Masan Serviços Especializ­ados e da Home Bread Indústria e Comércio Ltda (atual HB Multiservi­ços), respectiva­mente, são investigad­os pela Operação Lava Jato. Ambas as empresas têm contratos milionário­s com prefeitura­s para fornecer comida a crianças em escolas da rede municipal.

Mas em pelo menos um município, Luca e Monteiro atuam juntos desde 2014: Duque de Caxias, cidade com 178 unidades e 77 mil estudantes. Naquele ano, os dois empresário­s arrematara­m licitações que somaram quase R$ 45 milhões para prestar o serviço.

Além disso, os contratos previam a manutenção de equipament­os e mão de obra nas unidades. Os empresário­s também se beneficiar­am com aditivos em acordos firmados com o prefeito Washington Reis (MDB) e o seu antecessor, Alexandre Cardoso (PSD). Os valores ultrapassa­m os R$ 20 milhões.

A reportagem faz parte da série ‘Merenda Nota Zero’, que O DIA publica desde domingo. No Ministério Público, há 74 inquéritos abertos para investigar irregulari­dades em 33 prefeitura­s. Já o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) apura problemas em 14 municípios, alguns deles são os mesmos que estão na mira do MP.

Apesar dos milhões de reais destinados à Masan e à Home Bread, o Conselho de Alimentaçã­o Escolar (CAE) encontrou problemas graves nas escolas de Duque de Caxias. Em vistorias feitas nos últimos meses, o órgão, que fiscaliza o repasse de recursos federais à merenda e as boas práticas sanitárias e de higiene dos alimentos nas escolas, detectou cozinhas sem condições de uso. E mais: despensas vazias e erros nas prestações de contas junto ao Fundo Nacional de Desenvolvi­mento da Educação (FNDE).

“Há uma dificuldad­e de acompanhar as licitações feitas pela prefeitura. Ainda são uma caixa-preta. Se a gente não acompanhar, a prefeitura dá quentinha para as crianças igual à dos presídios”, afirma Sidney Campos Neves, presidente do CAE e representa­nte da Associação de Pais e Amigos das Escolas Públicas de Duque de Caxias.

Nas imagens registrada­s durante as vistorias do CAE, é possível ver alimentos dentro de panelas enferrujad­as; fogões em péssimas condições; prateleira­s sem comida; iluminação precária; vazamento nas pias e falta de tampas nos ralos das cozinhas; tetos com infiltraçõ­es e rachaduras; entre outros.

Em algumas unidades de ensino do município, o caso é crítico, como nas escolas municipais Ruy Barbosa, Carlota Machado e Pedro Paulo, e nas creches Laura Menezes e professor João de Oliveira.

Marco Antônio de Luca foi preso em junho do ano passado e solto seis meses depois. Na Lava Jato, o empresário responde por corrupção e organizaçã­o criminosa. É suspeito também de pagar propina ao ex-governador Sérgio Cabral (MDB), preso em Bangu 8, para ser favorecido no fornecimen­to de merenda para escolas e quentinhas para presídios. Luca era um dos integrante­s do grupo no episódio que ficou conhecido como “Farra dos Guardanapo­s”, em Paris, ao lado de Cabral e secretário­s estaduais.

Antônio Carlos Monteiro é investigad­o na Operação Inópia, braço da Lava Jato. Em outubro do ano passado, a Polícia Federal realizou uma ação contra os suspeitos. Os policiais disseram que houve formação de cartel por parte de algumas empresas para desviar R$ 20 milhões destinados à merenda escolar na Baixada Fluminense.

Enquanto isso, crianças e jovens dependem de comida para estudar e não prejudicar o desempenho dentro de sala de aula. Caso dos irmãos Lucas e Júlia, de 13 e 11 anos, filhos da empregada doméstica Jurema Pereira dos Santos, de 36, mãe de outros três. A família mora em Santa Cruz da Serra.

“Eu sou divorciada. Sustento os meus cinco filhos sozinha. A merenda da escola é essencial para a alimentaçã­o deles. Não tenho condições de bancar tudo. Se a comida estiver ruim, eles vão ficar com fome”, desabafou Jurema.

Empresário­s investigad­os na Lava Jato venceram licitações de R$ 45 milhões para o serviço

Sustento cinco filhos. Não tenho condições de bancar tudo. Se a merenda estiver ruim, eles vão ficar com fome

JUREMA PEREIRA DOS SANTOS, mãe de alunos

 ?? ARMANDO PAIVA DIVULGAÇÃO DIVULGAÇÃO ?? Na Escola Ruy Barbosa, foram encontrado­s alimentos em panelas enferrujad­as, um perigo
ARMANDO PAIVA DIVULGAÇÃO DIVULGAÇÃO Na Escola Ruy Barbosa, foram encontrado­s alimentos em panelas enferrujad­as, um perigo
 ?? DIVULGAÇÃO ARMANDO PAIVA ?? Prateleira­s vazias, apesar do montante pago a empresas para mantê-las abastecida­s
DIVULGAÇÃO ARMANDO PAIVA Prateleira­s vazias, apesar do montante pago a empresas para mantê-las abastecida­s
 ??  ?? Em unidade municipal de Caxias, fogão vistoriado estava em péssimas condições
Em unidade municipal de Caxias, fogão vistoriado estava em péssimas condições
 ??  ?? Sidney: licitações são ‘caixas pretas’
Sidney: licitações são ‘caixas pretas’
 ??  ?? Lucas e Júlia: merenda é essencial
Lucas e Júlia: merenda é essencial

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil