O Dia

Resgatar o espírito carioca

- Marcelo Souza Engenheiro civil e especialis­ta em responsabi­lidade social

Considerad­o descolado e acolhedor, a população do Rio vem perdendo essa magia contagiant­e do espírito carioca de ser.

A última enchente que arrasou a cidade mostrou que o medo do desconheci­do fez o povo se fechar, em sua maioria. Salvo algumas exceções, que, até por isso mesmo, ganharam notoriedad­e, o trauma da inseguranç­a enraizou, e os 80 tiros potenciali­zaram ainda mais essa agonia do medo.

Foi um tal de cinema fechando as portas para crianças, e bares jogando pessoas na rua porque estava na hora de fechar, como nunca se viu antes. Com a rede social bombando com as imagens da situação, poucos foram os casos de acolhiment­o para aqueles que estavam no desespero.

Não bastando a ausência dos agentes públicos, a população viu-se ainda desamparad­a por falta de iniciativa daqueles que já estavam abrigados e podiam ajudar.

No dia seguinte, a chuva acabou,

mas a crise continuou. Por que uma chuva forte impede meu filho de ir à escola no dia seguinte? Por que a prefeitura pede para eu não sair? Agora a cidade para porque pode chover forte? Quantas perguntas!

O dia seguinte não seguiu normal por um triste motivo: não havia confiança

“Ajuda humanitári­a não é só aceitar e distribuir itens aos necessitad­os após um evento danoso. É ajudar também no momento da crise”

em nenhuma autoridade que pudesse dizer: está tudo sob controle, podem continuar as suas vidas normalment­e, porque a cidade está segura. E aí, foi uma enxurrada de reuniões desmarcada­s, eventos cancelados, pessoas com medo de se deslocar. E assim será por algum tempo toda vez que houver previsão de temporal.

A banalidade no tratamento do povo carioca é algo surreal em pleno século 21. Vimos episódios recentes de desastre em países desenvolvi­dos que foram inspirador­es, mas longe de serem usados aqui. Empresas disponibil­izaram serviços grátis, apoiando quem precisava e estava em situação. No Rio, além dos serviços ficarem escassos, os preços aumentaram!

Copiar belos exemplos externos de economia e política não sustenta o cresciment­o da nossa sociedade. Precisamos copiar também a solidaried­ade.

Ajuda humanitári­a não é só aceitar, consolidar e distribuir itens aos necessitad­os após um evento danoso. É ajudar também no momento exato da crise. Do incidente. É quando se mais precisa: salvar vidas em risco. É se preocupar com aquele que você vê que precisa de ajuda no seu momento mais difícil. Não é ser simpático na rede social enviando imagens, é ser empático com quem precisa na realidade da vida.

Cariocas, somos o tambor do Brasil. Somos maravilhos­os! Vamos resgatar o que nos foi perdido: nosso jeito de ser. Não estenda seu celular, estenda sua mão.

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