Especialistas recomendam técnicas de reflorestamento para recuperar áreas incendiadas da Amazônia
A arte de devolver a vida à floresta
Para ter a recolonização da fauna local vai demorar mais do que a própria floresta. Nas condições que temos hoje é praticamente impossível RICARDO RODRIGUES, pesquisador
Foram registrados 26.795 focos de incêndio, que voltaram os olhos do mundo para o Brasil
As queimadas na Floresta Amazônica têm deixado o Brasil e o resto do mundo alarmados. Afinal, nos primeiros 26 dias do agosto foram registrados 26.795 focos de incêndio, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), índice acima da média dos últimos 21 anos. Os olhos do mundo se voltaram para o futuro do planeta e, claro, das imensas áreas incendiadas.
Para Ricardo Rodrigues, pesquisador da Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES), a reconstituição da chamada floresta de baixa qualidade — com menor número de espécies diferentes e compostas por árvores de pequeno e médio portes — pode começar entre cinco e dez anos. “Mas para voltar à reconfiguração original é possível que demore centenas de anos”, avalia.
Rodrigues acrescenta ainda que a melhor maneira de recuperar do ecossistema nativo é a restauração passiva. “O processo consiste na restauração do ambiente de
forma natural através de sementes trazidas por animais ou contidas em ‘bancos’ sob o próprio solo”, acredita.
Já Rogério Gribel, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), explica que, primeiro, surge uma floresta secundária — cobertura menos rica que a original. Segundo o pesquisador, sem a reincidência de novas queimadas, ela poderá ser recomposta em poucos anos.
Gribel ensina ainda que a intervenção humana deve ser vista com bons olhos. Isso porque “existe alternativa para o manejo econômico do ambiente que não sejam a pecuária”. Neste caso, com o cultivo da floresta secundária com árvores que, futuramente, possam ter grande valor econômico, como mogno e cedro. “O impacto ambiental vai ser menor e a população local ainda consegue ter uma fonte de renda”, conclui.
No caso de intervenção humana, o especialista do INPA recomenda que a plantação seja imediata. “Paradoxal ter uma floresta exuberante e ter um solo muito pobre em nutrientes”, informou. Segundo ele, a biomassa das queimadas, principal fonte de nutrientes do solo, é varrida do solo pelas chuvas fortes. O pesquisador recomenda que seja feito o planejamento do uso do solo.
Coordenador de projetos da SOS Amazônia, Adair Duarte, alerta para uma terceira forma de reconstrução. Nesse método, a ONG instrui famílias locais interessadas em ajudar no processo de reflorestamento, ensinando a forma correta de cultivar e cuidar para que, no futuro, componha a vegetação da Floresta Amazônica. “O SOS trabalha com públicos de vulnerabilidade social, como ribeirinhos, que passarão a ter um ganho com essa restauração”, complementou Alisson Maranho, diretortécnico da ONG. Nesse sistema, ele estima que precisa de 20 a 40 anos para parecer uma floresta.
As queimadas na Amazônia também comprometem, é claro, os animais que vivem na floresta. E como informa Ricardo Rodrigues, o processo de recolonização da fauna acontecerá “desde que mantenham os espaços naturais dos animais”: “Para ter a recolonização da fauna local, vai demorar mais que a reconstrução total da floresta. Nas condições que estamos hoje, é praticamente impossível”.