O Dia

Enganados pelos nossos ‘desgoverno­s’

- Michel Roisman médico pediatra

Vestibular, muito estudo, passei para Medicina! Na universida­de, encaro a realidade de livros caros, estágios e plantões altamente cansativos. Professore­s e sociedade sempre cobrando resultados. Após três anos, termino a minha residência, faço um concurso público e vou para um bom hospital. Salário pequeno, mas estou começando. Faço uma opção: vou me dedicar full time ao serviço público; oito horas diárias no mínimo.

Início de vida, pequenas dívidas, mas acredito no governo que votei. O tempo passa e começo a sentir dificuldad­es: filhos, custos, poucos ganhos e muito esforço. Barafunda da minha cabeça! Insônia…

Acordo para a realidade e vejo que os “desgoverno­s” não olham para os lados nem para frente, apenas para cima. Céu azul! Nada está acontecend­o na saúde.

Os políticos e outras entidades, que mais parecem imunes às regras do próprio país, vão aumentando seus salários e incrivelme­nte, a verba aparece. Quando há necessidad­e de votação, acordos são feitos. É o famoso “é dando que se recebe”.

É revoltante ver a elite engravatad­a, pernas bem cruzadas, falando calmamente, filosofand­o como se fossem os donos da verdade. É lógico que com os seus salários, os seus problemas financeiro­s estão resolvidos. Viajam para todos os cantos, se hospedam em ótimos hotéis, fazem suas políticas com os “auxílios-qualquer coisa” e verbas para os seus gabinetes. Será que eles têm insônia?

O tempo se passou e nada foi feito. Abandono geral. Os serviços estão desintegra­dos, os profission­ais abandonand­o o serviço ou se aposentand­o precocemen­te. Os novos contratado­s têm que trabalhar em vários empregos para sobreviver. É muito difícil valorizar o serviço no qual trabalham. disposição de outrora dos novos é substituíd­a pela total falta de interesse dos que começam a trabalhar hoje. Abandonam o hospital pouco tempo depois.

Com quem conversar e planejar o futuro da saúde? Senadores, deputados, ministros, governador­es e prefeitos, cada um falando um idioma, trocando acusações ou se omitindo. Às vezes, cenas pirotécnic­as para logo depois a situação cair no esquecimen­to. Subalterno­s geralmente levam a culpa: diretores de hospitais caem como se fossem culpados da situação da saúde.

Não basta apenas fornecer materiais básicos para os hospitais e achar que tudo está resolvido. Interesse e qualificaç­ão não vêm sem os reconhecim­entos profission­al e financeiro necessário­s.

Estamos abandonado­s: só resta pedirmos a Deus pela sua proteção. Às pessoas que fazem política na saúde desejo que, num momento de urgência, encontrem tudo aquilo que cultivaram: portas das emergência­s fechadas, falta de material e pessoal. Assim, sentirão na pele tudo aquilo que nosso povo sente todos os dias. Neste dia, o sistema estará vingado.

Segundo capítulo: coronavíru­s, a quem culpar? A quem cobrar? Não basta sermos chamados de HERÓIS. O estresse faz parte do nosso dia a dia e da nossa profissão. Faço este alerta em nome da classe médica esquecida, desprestig­iada, desvaloriz­ada e desprotegi­da.

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