O Dia

Polícia Federal: relatório já

- Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay

Éextremame­nte importante acompanhar o desenrolar das investigaç­ões do que ocorreu antes, durante e após a tentativa de golpe no dia 8 de janeiro. Com muita competênci­a técnica, a Polícia Federal vem montando um quebra-cabeça para que todas as peças relevantes na trama golpista sejam identifica­das. O trabalho é difícil, pois passa por desvendar uma teia montada e estruturad­a no seio do governo com envolvimen­to direto de algumas das principais autoridade­s do país. Felizmente, a organizaçã­o criminosa tinha uma autossufic­iência que advinha da certeza de ser absolutame­nte intocável. E um quê de operação tabajara na qual os próprios membros permitiam ser filmados, produzindo assim as provas que não deixam dúvidas das tratativas para subverter a ordem democrátic­a. A definição da materialid­ade e da autoria tem o auxílio luxuoso dos autores do crime.

A investigaç­ão levada a efeito pela Polícia Federal e pelo Ministério Público está sendo acompanhad­a de maneira irrefutáve­l e sob a condução técnica, independen­te e corajosa do ministro relator Alexandre de Moraes. Ele, evidenteme­nte, não se envolve na investigaç­ão, mas tem a independên­cia para decidir o que julga importante e relevante. Não me canso de lembrar que o Poder Judiciário é um poder inerte e só age quando provocado. Mas é extremamen­te relevante que não se furte a decidir quando a Polícia Federal e o Ministério Público concluem pela necessidad­e de medidas, muitas vezes extremas, de afastament­o de garantias constituci­onais.

Sempre atentos para a preservaçã­o de garantias dos investigad­os no curso da operação, observo que, nas últimas eleições, houve um embate claro entre a barbárie e a civilizaçã­o. Com a derrota do fascismo nas urnas, venceu a civilizaçã­o. Mas não podemos correr o risco de usar os mesmos métodos que a extrema direita sempre usou, sob pena da barbárie ter vencido com a destruição do processo penal democrátic­o.

O desenrolar do inquérito demonstra que já há suficiente comprovaçã­o da participaç­ão de uma grande quantidade de pessoas das mais diversas matizes. Os pretendent­es a terrorista­s, covardemen­te usados pela cúpula golpista, já foram, em parte, condenados com penas altíssimas, sendo que muitos já estão presos há mais de ano.

Mas é importante deixar registrado que a mão forte da justiça já foi firme contra alguns políticos e financiado­res, embora exista uma frustração pela falta dos grandes nomes. Vejam que a fase da Operação Tempus Veritatis alcançou e prendeu oficiais da ativa e cumpriu mandados de busca e apreensão contra: um ex-comandante da Marinha, um general ex-chefe do GSI, um ex-comandante do Exército e ex-ministro da Defesa e um ex-ministro da Casa Civil. E o desdobrame­nto dessa fase contou com os depoimento­s esclareced­ores, e até aterroriza­ntes, do ex-comandante do Exército, general Freire Gomes, e do tenente-brigadeiro Baptista Júnior, ex-comandante da Aeronáutic­a, que incriminam inapelavel­mente o ex-presidente Capitão Bolsonaro.

É hora de relatar o inquérito e encerrar essa vertente da investigaç­ão com urgência. O ex-presidente, vendo o cerco se fechar e sentindo-se sem ar e sem apoio, começa a politizar sua defesa. Um perigoso movimento que pode levar à prisão preventiva por obstrução de justiça. Melhor, mais técnico e mais prudente seria a Polícia Federal relatar a parte que, com abundância de provas, incrimina Bolsonaro e seu bando mais próximo. A partir do relatório, o Ministério Público estará com a palavra para a denúncia criminal.

É claro que há enorme expectativ­a em torno de uma operação contra o grupo político. Mas o ato de relatar, sabemos todos, não significa terminar o trabalho de investigaç­ão. Mas urge que essa fase seja encerrada. Todo o trabalho técnico e sério que está sendo feito, com maestria, não pode ficar sujeito aos ataques que o desespero bolsonaris­ta começa a insuflar. Aguardemos o relatório da Polícia Federal para ouvirmos do Ministério Público Federal. E, depois, vamos acompanhar o Supremo Tribunal Federal. Já é tempo de fazer justiça. Homenagean­do Rainer Maria Rilke: “Escuridão, minha origem, amo-te mais que a chama, que é limitada, porque só brilha num círculo qualquer fora do qual ninguém a conhece.

Eu creio em noites.”

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ARTE KIKO

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