Os equilibristas
Para o deputado Eduardo Cunha acabou-se. Ele certamente tem consciência disso, perspicaz que é nas coisas da política. Quando apareceram os documentos sobre contas correntes não declaradas no exterior, que alegava inexistentes, sua defesa ruiu. Salvo o imponderável – cuja presença em cena tem sido constante –, o afastamento é questão de tempo.
Sustenta-se ainda na Presidência da Câmara por força da representação que exerce como a encarnação oposicionista a um governo amplamente repudiado. Este trunfo, porém, o deputado vai perden- do na medida em que aparecem novas evidências no âmbito da operação Lava Jato. O fato de não ter perdido o cargo não quer dizer que esteja inteiro. Suas cordas vocais, por exemplo, foram fatalmente atingidas. Sua voz não tem mais o alcance de outrora.
Cunha detém o poder formal, mas já não tem autoridade para comprar brigas com questões relativas a quebras da legalidade e/ou decoro parlamentar. Denunciado ao Conselho de Ética, não tem condições de comandar processos de cassação. Seria questionado de modo constrangedor. Já ocorreu com outros em situações parecidas. Também entraram resisten- tes na crise e terminaram derrotados pelos acontecimentos.
O presidente da Câmara não tem mais condições de comandar votações da forma como vinha fazendo. Estará sempre correndo o risco da contestação.
Outro risco que desaconselha sua permanência é o de que por algum motivo precise assumir a Presidência da República. Basta Dilma ou Michel Temer não estarem disponíveis. No míni- mo, um embaraço.
Dito isso, convém acrescentar que a fragilização de Eduardo Cunha não corresponde ao fortalecimento da presidente Dilma. Ambos têm contas a ajustar na opinião pública e na Justiça. São colegas numa corda cada vez mais bamba. Mas enfrentam problemas de natureza, dimensão e complexidade diversas e por isso um não depende do outro. Os ataques mútuos não alteram a situação deles, bem como seriam inúteis quaisquer tentativas de prestação de socorro recíproca.
Cunha já não é figura central na questão do impeachment. Com ele ou sem ele à frente, se tiver de ser, será. Se não tiver, não será. Os fatos ganharam pernas; neles ninguém manda, a não ser as circunstâncias. O governo ganha algum fôlego com as decisões preliminares no Supremo Tribunal Federal sobre o rito do processo de impeachment na Câmara. Uma pausa para respirar, mas é só. Ninguém tem força para sustentar urdiduras.
Eduardo Cunha já não tem poder para comandar a tropa do Congresso. Dilma Rousseff tampouco dispõe da matéria em quantidade suficiente para influir nas ações da polícia, na atuação do Ministério Público, nas decisões da Justiça e muito menos na vontade das ruas. Politicamente alquebrados, tentam se equilibrar como podem.
Vai sonhando. O governo não pode estar falando sério quando cogita a hipótese de o deputado Leonardo Picciani vir a substituir Eduardo Cunha na presidência da Câmara. O rapaz é praticamente um novato, não lidera a própria bancada, tem contra ele os caciques do PMDB e, razão definitiva, conta com o aval do Planalto.
Cunha foi eleito por ser adversário combativo e, pelo mesmo motivo, ainda está na cadeira.
Alquebrados, ‘presidenta’ e presidente (da Câmara) estão juntos na corda bamba
Pimenta é refresco. O ex-presidente Lula não se cansa de aconselhar Dilma a se “aproximar do povo”. Ele mesmo, porém, não se atreve a circular em ambientes públicos não controlados.