O Estado de S. Paulo

Supremo contraria Congresso e barra doação oculta a partidos e candidatos

- Carla Araújo / Rubens Glezer e Eloísa Machado

Os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram ontem suspender as chamadas doações ocultas e determinar­am que os repasses eleitorais de pessoas físicas feitos a partidos e transferid­os para candidatos precisam ser identifica­dos. Com a decisão de caráter liminar, a Corte suspendeu o trecho da lei de minirrefor­ma eleitoral, aprovada pelo Congresso, que permitia doações sem a demonstraç­ão da origem dos recursos. A lei da minirrefor­ma foi sancionada em 29 de setembro pela presidente Dilma Rousseff.

A Ação Direta de Inconstitu­cionalidad­e foi ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que argumentou que o trecho da nova lei da minirrefor­ma eleitoral violava “o princípio da transparên­cia e o princípio da moralidade, e favorece, ademais, a corrupção, dificultan­do o rastreamen­to das doações eleitorais”. A decisão do STF ainda é provisória, já que os ministros, apesar de julgarem procedente o pedido da OAB e suspendere­m a lei, ainda não discutiram o mérito.

Na minirrefor­ma, o Congresso alterou trecho da lei eleitoral que havia definido que os valores transferid­os pelos partidos oriundos de doações seriam registrado­s na prestação de contas dos candidatos como transferên­cia das siglas e, na prestação de contas das legendas, como transferên­cia aos candidatos, “sem individual­ização dos doadores”. A norma valeria apenas para contribuiç­ões de pessoas físicas, já que neste ano, o STF declarou inconstitu­cional as doações de empresas para partidos e políticos.

Orelator do caso, ministro Teori Zavascki, argumentou que a transparên­cia nas contas eleitorais é “indispensá­vel” para se coibir as más relações “entre política A reforma votada no Congresso enterrou a transparên­cia na relação doadorcand­idato ao proibir empresas de doar diretament­e a candidatos – os recursos teriam de ir aos partidos, que depois os distribuir­iam entre campanhas. A manobra, revelada pelo Estado, impediria o rastreamen­to das doações a candidatos pelo TSE.

e dinheiro”. “É preciso, sobretudo, que os abusos de poder econômico e político tenham severa resposta sob pena de tornar ineficaz não só o modelo atual, mas também o que se tenha no futuro.”

Zavascki disse ainda que as doações ocultas criam uma “cortina de fumaça” sobre as declaraçõe­s de campanha, representa­m um retrocesso e impedem uma experiênci­a eleitoral democrátic­a. O ministro argumentou ainda que “é equivocado” pensar que a divulgação de nomes daqueles que contribuem com candidatos viola diretos de privacidad­e.

Ao acompanhar o relator, Luiz Fachin afirmou que no processo eleitoral a única coisa que deve ser secreta é o voto e citou música de Ney Matogrosso ao dizer que “o que a gente não quer fazer se faz por debaixo do pano”.

Crítica. O ministro Luiz Fux criticou o protagonis­mo do Congresso na reforma política. “Leis desse perfil comprovam os que os novos constituci­onalistas têm afirmado que às vezes o Parlamento não é o melhor protagonis­ta para implementa­r uma reforma política sem a participa- ção da jurisdição constituci­onal, que neste caso é fundamenta­l.”

Já o ministro Dias Toffoli destacou o caráter de transparên­cia das doações existentes nas eleições norte-americanas que, segundo ele, conseguem informar ao eleitor as afinidades com doadores que apoiam determinad­as candidatur­as. “Essa transparên­cia é inerente a democracia. Não pode o legislador, portanto, ocultar quem financia a democracia.”

O presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, esteve na sessão plenária e afirmou que “não pode haver espaço para mistério e clandestin­idade nesse momento delicado da vida democrátic­a de uma nação”.

Apesar de ter unanimidad­e no mérito,houve umadivergê­ncia sobre a validade da decisão liminar. Para a maioria, ela já tem efeitos desde a publicação da sanção presencial. Para oministro Marco Aurélio Mello, entretanto, a decisão teria de valer daqui para frente.

‘Ideal’ Contrariad­o, o relator da minirrefor­ma, Rodrigo Maia (DEMRJ), criticou a decisão do STF. “O Supremo vive num mundo ideal.”

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO-13/10/2015 Transparên­cia. O ministro do STF Teori Zavascki diz que doações ocultas criam uma ‘cortina de fumaça’

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