O Estado de S. Paulo

Comentário de Tombini satisfaz o governo e o PT

Planalto trabalha com alta de 0,25 ponto porcentual nos juros; para senador petista, Selic mais alta trará mais desgaste para o governo

- Vera Rosa Ricardo Brito

O movimento feito ontem pelo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, agradou ao Palácio do Planalto. A avaliação de auxiliares da presidente Dilma Rousseff foi a de que Tombini fez um aceno para a “ancoragem” do mercado ao divulgar uma nota alertando para mudanças “significat­ivas” das projeções do Fundo Monetário Internacio­nal (FMI), com previsão de retração de 3,5% neste ano, no Brasil.

A expectativ­a do governo é que essa reviravolt­a no cenário sirva como argumento para o Comitê de Política Monetária (Copom) decidir hoje aumentar “ligeiramen­te” a taxa básica de juros, em 0,25 ponto porcentual, ou mesmo mantê-la no atual patamar de 14,25% ao ano.

Até ontem, a maior parte do mercado financeiro apostava em um aumento de 0,5 ponto porcentual na taxa Selic. Há muitas dúvidas no Planalto sobre a eficácia da alta de juros no combate à inflação nesse momento de crise, com a economia estagnada, aumento do desemprego e queda no grau de capacidade produtiva da indústria.

No PT, o comentário inédito de Tombini, feito após a divulgação do relatório do FMI, foi visto como um sinal de que pode haver uma reorientaç­ão da política monetária. “A nota divulgada por ele não foi qualquer coisa”, afirmou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). “O FMI disse que o Brasil estará à frente da maior recessão que o País já encarou. É um momento dramático e nós estamos encaran- do esta decisão do Banco Central sobre os juros como decisiva para os rumos de 2016.”

Derrotas. Em conversas reservadas, dirigentes do PT afirmam que, se os juros subirem com esse quadro de desemprego, “pibinho” e perspectiv­as sombrias para a economia, não haverá mais investimen­tos e o partido sofrerá derrotas acachapant­es nas eleições municipais deste ano, compromete­ndo ainda mais o projeto de poder para 2018. “O desgaste para o governo, com juros ainda mais altos, será tremendo”, resumiu Lindbergh. “Temos de olhar para as empresas e os trabalhado­res, e não só para o mercado”.

Uma conversa reservada entre Dilma e Tombini, na segunda-feira, chamou a atenção dos agentes econômicos, mas os comentário­s sobre “interferên­cia” do governo no Banco Central, às vésperas da reunião do Copom, foram minimizado­s no Planalto. Um auxiliar de Dilma disse não haver “ninguém melhor” do que o presidente do BC para passar o quadro da política monetária para ela e enumerou as adversidad­es deste início de ano. Na lista dos problemas estão a queda na bolsa chinesa, um importante parceiro comercial do Brasil; barril do petróleo com cotação abaixo de US$ 30, e, ainda, a elevação, em dezembro, dos juros pelo Federal Reserve (BC americano) em 0,25 ponto porcentual, o primeiro aumento desde 2006.

Na sexta-feira, em café da manhã com jornalista­s, Dilma assinalou a linha de atuação que espera do BC. Para ela, embora autônomo, o BC não é independen­te e deve, sim, prestar contas. “Para o meu governo, o Banco Central não é uma instituiçã­o independen­te. Independen­te é a relação, pela lei brasileira, entre o Executivo, o Legislativ­o e Judiciário”, afirmou a presidente. “O BC é uma instituiçã­o autônoma. Tem autonomia para fazer sua política. Mas isso não significa que não preste contas a todos os órgãos e deve prestar contas, inclusive ao Congresso”.

Decisão Na última reunião do Copom, a taxa de juros foi mantida em 14,25% ao ano, mas a decisão não foi unânime: dois dos oito diretores votaram pela elevação da Selic.

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SERGIO CASTRO/ESTADÃO Protesto. Sindicalis­tas fizeram ontem manifestaç­ão na Avenida Paulista, em São Paulo, contra o aumento dos juros
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