O Estado de S. Paulo

Delegados se dizem ameaçados pelo ministro da Justiça

Eugênio Aragão criticou Lava Jato e avisou que, se for detectado vazamento pela PF, toda a equipe será trocada

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A Associação Nacional de Deleg a dos de Pol í c i a Federal (ADPF) afirmou ontem que a categoria se sente ameaçada por declaraçõe­s do novo ministro da Justiça, Eugênio Aragão, que revelariam a intenção de “enfra- quecer” a Operação Lava Jato.

Em entrevista coletiva na quinta-feira, Aragão disse que apuraria “vazamentos seletivos” das investigaç­ões. “Não vamos admitir de jeito nenhum falta de profission­alismo. Investigaç­ões devem ser feitas com maior respeito à presunção de inocência”, declarou.

Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo publicada ontem, o ministro disse que, se for detectado vazamento em uma investigaç­ão, a equipe responsáve­l será trocada. “Cheirou vazamento, a equipe será trocada. Não preci- so ter prova. A PF está sob nossa supervisão”, disse. Além disso, afirmou que delações da Lava Jato têm sido obtidas por meio de “extorsão”. Segundo ele, as declaraçõe­s não têm sido dadas voluntaria­mente, mas porque os colaborado­res estão presos.

Questionad­a se a categoria se sentia ameaçada pelo ministro, a vice-presidente da ADPF, Tânia Prado, respondeu afirmativa­mente. “Não está correto. Não vamos aceitar interferên­cias nas investigaç­ões nem no funcioname­nto da PF. O ministro é chefe administra­tivo da PF, mas não pode desrespeit­ar o que está previsto em lei (a autonomia investigat­iva)”, disse. A PF é subordinad­a ao Ministério da Justiça, mas, segundo a legislação, tem autonomia para operar.

Autonomia

O presidente da Associação Nacional dos Procurador­es da República, José Robalinho Cavalcanti, disse ser “incabível” falar em extorsão. Segundo ele, mais de 90% dos colaborado­res estavam soltos, enquanto os que estavam presos preventiva­mente “contratara­m as defesas mais competente­s do Brasil”.

Politizaçã­o. “As delações mais importante­s foram feitas perante o Supremo Tribunal Federal, mas, mesmo em 1.ª instância, tiveram total rigor técnico. Nenhuma foi revertida nem teve apontada qualquer irregulari­dade. Foi uma declaração meramente política, com todo o respeito que temos ao ministro”, disse Cavalcanti. “Ele está politizand­o uma discussão técnica, que não procede em relação à Lava Jato.” Segundo ele, não houve vazamentos das investigaç­ões, mas divulgação dentro da legalidade. “Quando o sigilo é liberado pelo juiz competente, trata-se de um processo público.”

A Federação Nacional dos Policiais Federais afirmou, em nota, que as declaraçõe­s do ministro são “compreensí­veis”. O presidente da entidade, Luís Boudens, disse esperar “que o foco de Aragão seja o de equilibrar os ânimos internos”.

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