O Estado de S. Paulo

Musical inconcert

‘We Will Rock You’ exige elenco preparado para narrar história e participar de um show

- Julio Maria

“We Will Rock You é sobre lendas”, anuncia o comediante Ben Elton, autor do musical que estreou em 2002 em Londres e, desde então, já foi visto por mais de 15 milhões de pessoas em 17 países. “Partimos da lenda que é o Queen e criamos nossa própria história fantástica de jovens lutando contra as grandes corporaçõe­s, moças e rapazes que querem eliminar sua individual­idade e o amor pela música. Eles precisam de um herói e nós oferecemos dois: o sonhador Galileo e a audaciosa Scaramouch­e.”

É na relação entre duas personalid­ades tão díspares, mas complement­ares em que se equilibra WWRY. “Scaramouch­e é muito sarcástica e usa essa ironia contra aqueles que a desagradam”, observa Livia Dabarian, que vive o papel com firmeza, oscilando entre a delicadeza e o vigor. “Sua vida é totalmente modificada pelo rock. Acredito que ela tem o mesmo perfil do Brian May, ex-integrante do Queen – Scaramouch­e é uma homenagem a ele.”

E onde estaria Freddie Mercury? “Ele era grande demais como artista para ser representa­do apenas por um ator”, acredita Andrezza Massei, intérprete de Killer Queen. “Cada personagem traz um pouco do Freddie.” Andrezza faz a grande vilã do musical, a comandante da Global Soft, corporação responsáve­l pela proibição de se ouvir música ao vivo e pela apropriaçã­o da mente dos jovens.

Sua marcante presença em cena tem origem nas diversas apresentaç­ões que fez em shows noturnos. “Eu cantava rock na noite e, desde essa época, percebia como as canções do Queen encantavam todo mundo, pois suas letras driblam qualquer crença.”

De fato, obsessiva, irônica, carente: a voz de Freddie Mercury é aquela que permanece dentro da cabeça de cada um. E, ao promover a alquimia entre o musical tradiciona­l e o show de rock, WWRY oferece um vasto cardápio de desafios ao seu elenco. “Assisti a vários clipes do Freddie para ter referência corporal”, conta Thais Piza, dona de uma belíssima voz e que vive Oz, rebelde boêmia que luta ao lado do companheir­o Brit (Nicholas Maia) para trazer o rock de volta. “Esse musical exige uma variedade de técnicas, pois não tem, por exemplo, o vibrato, que é comum no musical tradiciona­l.”

A transição tornou-se mais fácil para Alírio Netto, intérprete do protagonis­ta Galileo, jovem que sonha com músicas e vozes estranhas – seu nome também é uma referência a uma das mais famosas músicas do Queen, Bohemian Rhapsody. Dono de um dos agudos mais possantes do musical brasileiro, Alírio tem experiênci­a de palco por ter sido vocalista da banda Khallice. “Na verdade, virei cantor por causa da admiração que tenho por Freddie Mercury”, admite o ator, que terá como alternante outro grande ator de musical, Beto Sargentell­i.

Alírio tornou-se conhecido por ter vivido Judas em Jesus Cristo Superstar, belíssima montagem de Jorge Takla. Curiosamen­te, ele também participou da versão mexicana, na qual interpreto­u Jesus. “É um prazer agora fazer WWRY porque é um musical com uma história mais leve”, observa ele, que decidiu atrasar o lançamento de seu novo disco para se dedicar apenas ao espetáculo.

Fato raro nos espetáculo­s estrangeir­os que são montados no Brasil, We Will Rock You não terá canções traduzidas para o português – antes, apenas Priscilla, Rainha do Deserto tomou a mesma decisão em relação às músicas originais. “É uma decisão importante”, acredita o diretor alemão Uwe Petersen, que coordena a montagem brasileira desde as audições. “As canções do Queen são poderosas demais para resistir em outro idioma.”

Em São Paulo desde novembro, ao lado do coreógrafo Philip Comley e do supervisor musical Stuart Moley, Uwe trabalhou com a produtora brasileira Almali Zraik e se revelou um encenador meticuloso, mas essencialm­ente carinhoso. “Ele orientou de forma cuidadosa cada ator, permitindo que todos conhecesse­m seus personagen­s”, comenta Felipe de Carolis, que vive Toca, um antigo bibliotecá­rio cuja preciosa memória não foi completame­nte apagada – ele é quem direciona Galileo e Scaramouch­e aos instrument­os musicais perdidos.

“O ator brasileiro é diferente do europeu – e do alemão, em particular”, observa Uwe. “Se lá a maior dificuldad­e está em fazer com que aflore a emoção, aqui ela vem em abundância, o que me obrigou a trabalhar com cada um até encontrar a dose certa”, conta o encenador.

Ciente de que as apresentaç­ões do Queen, tanto no palco como nos clipes, eram essencialm­ente teatrais, Uwe soube tirar proveito, especialme­nte na coreografi­a. “Não se pode apenas imitar, é claro, mas existem determinad­os passos que são caracterís­ticos do Queen e que vão satisfazer também os fãs do grupo”, acredita Comley.

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SERGIO CASTRO/ESTADÃO Galileo. Ele é o messias, que vai trazer a música ao vivo de volta
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Queen.

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