Caracas obstrui ação contra Maduro e assume poder de expropriar fábricas
Líder opositor Henrique Capriles confirma para amanhã marcha em favor de avanço no processo para revogar mandato de chavista, mas prefeito diz que bloqueará acesso de manifestantes ao local; indústrias da Polar são alvos de medida contra escassez
Entrou ontem em vigor o decreto do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, que, entre outras medidas, permite ao governo expropriar fábricas de alimentos e prender seus proprietários. Na véspera, em outra decisão controvertida, o governo venezuelano já tinha dado a entender que barraria a realização de um referendo para revogar o mandato de Maduro.
“Daqui, Maduro não vai sair por referendo”, disse no domingo o vice-presidente da Venezuela, Aristóbulo Istúriz. Como empecilho para o revogatório, Istúriz listou irregularidades na coleta de assinaturas pela oposição e a falta de condições materiais do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) para conduzir o processo. Para iniciar o processo de convocação a votação, a oposição deveria reunir 198 mil assinaturas (1% do registro eleitoral).
Segundo a oposição, mais de 1,8 milhão de assinaturas foram coletadas – e, afirma o governo, justamente esse fato inviabiliza o processo a tempo de realizar o revogatório ainda este ano, uma vez que cada uma das assinaturas deve ser verificada. Pela Constituição do país, se o mandato de Maduro for revogado até o fim do ano, novas eleições serão convocadas. Mas, excedido esse prazo, assumiria o vice-presidente.
Maduro atribui a grave crise econômica que o país atravessa à sabotagem do setor privado. Pelo estado de emergência decretado no fim de semana, fábricas consideradas improdutivas serão tomadas e empresários acusados de esconder mercadorias, presos. “Fábrica parada, fábrica entregue ao povo! (...) Vocês vão me ajudar a recuperar todas as plantas paralisadas pela burguesia”, declarou diante de milhares de partidários.
A Venezuela vive uma profunda crise agravada pelo colapso das receitas do petróleo, com a inflação mais alta do mundo – 180,9%, em 2015 – e uma queda de 5,7% do PIB em 2015. Isso tem levado à escassez de mais de dois terços dos alimentos básicos e dos remédios, cortes diários de água e energia elétrica e um aumento da violência.
Quatro fábricas cervejeiras da Polar, a maior produtora de alimentos e bebidas do país, estão na mira do governo. No dia 30, essas unidades paralisaram suas operações por falta de divisas para importar insumos.
A Polar cobre 80% do mercado cervejeiro, e suas marcas praticamente desapareceram dos supermercados.
Depois disso, os preços da concorrência duplicaram em
Emergência econômica Maduro passou por cima de uma decisão do legislativo, que negou-lhe poderes especiais para manejar a economia e o Tesouro Nacional. Ele já alterou a política cambial, numa tentativa – ineficaz – de controlar a inflação
Sem revogatório O vice-presidente, Aristóbulo Istúriz, disse no domingo que o chavismo não permitirá que a oposição aprove a realização do referendo revogatório do mandato de Maduro porque o projeto foi “mal feito, fora do tempo hábil e cheio de fraudes”
Ruas fechadas O prefeito do distrito caraquenho de Libertador, Jorge Rodríguez, prometeu vetar o acesso de militantes da Mesa de Unidade Democrática (MUD) aos arredores do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) para protestos
duas semanas. Maduro acusa o presidente do grupo empresarial, Lorenzo Mendoza, de estar no comando de uma “guerra econômica” para causar desabastecimento no país e provocar sua queda.
Atualmente, os empresários venezuelanos asseguram trabalhar com 43,8% de sua capacidade instalada, em razão de dívidas com fornecedores interna- cionais, falta de insumos e um rígido controle de preços que afeta a estrutura de custos.
Segundo o jornal El Nacional, os funcionários da Polar afirmaram que a fábrica tem milho branco para produzir farinha somente até o final de maio. O produto é ingrediente essencial da arepa, um dos itens básicos da alimentação dos venezuelanos.
“Parece que a decisão oficial é deixar a indústria nacional morrer com o consequente empobrecimento dos venezuelanos”, declarou o presidente da Confederação Venezuelana das Indústrias (Conindustria), Juan Pablo Olalquiaga.
Mobilização. O líder opositor Henrique Capriles confirmou a convocação de uma mobilização nacional para amanhã para protestar contra o governo e exigir rapidez no trâmite do referendo revogatório. Ele advertiu ainda que haverá uma implosão social caso o governo impeça a realização da consulta popular ainda neste ano.
Mas o prefeito de Libertador, uma das municipalidades que compõem a região da capital, Caracas, o chavista Jorge Rodríguez, assegurou que não permitirá que os opositores cheguem ao local, onde se encontra a principal sede do CNE no país.
Esta seria a terceira mobilização convocada pela oposição para pressionar o Poder Eleitoral a cumprir com rapidez o cronograma para a ativação do referendo.