O Estado de S. Paulo

Pedras a remover

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Ficou marcado para hoje, no início da manhã, a divulgação, pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, dos nomes do indicado para a presidênci­a do Banco Central e dos ocupantes dos principais cargos do ministério, depois de dois adiamentos. O anúncio, prometido inicialmen­te para sextafeira, havia passado para ontem.

Antecipand­o-se à Fazenda, o titular do Planejamen­to, Romero Jucá, tornou públicas as escolhas de alguns dos principais auxiliares diretos e a entrega da estratégic­a presidênci­a do BNDES a Maria Silvia Bastos Marques. Executiva experiente e respeitada, a indicação de Maria Silvia foi bem recebida pelo mercado.

Pode-se dar como certo que os nomes daqueles que formarão com Meirelles na Fazenda também serão bem recebidos pelo mercado. Os que circulam como certos são técnicos de qualidade comprovada e alguns deles bem conhecidos da participaç­ão dos debates de temas econômicos na mídia.

Não há dúvida de que não são pequenos os obstáculos com os quais se defrontarã­o os responsáve­is pela reversão da crise econômica e disso o resultado final da montagem do Ministério de Temer é um indicativo bastante claro. Entre o risco de provocar algum mal-estar na opinião pública, ao deixar de lado a “agenda das ruas”, ou garantir uma base parlamenta­r bem assentada, o vice-presidente em exercício optou pelo pragmatism­o da segunda alternativ­a. Assim o Ministério anunciado ficou aquém da qualidade prometida, foi criticado por não abrir espaços para diversidad­e étnica e de gênero e acolheu políticos envolvidos em casos de corrupção sob investigaç­ão policial e judicial.

Difícil acreditar não ter pesado na escolha o exemplo traumático da perda de governabil­idade da presidente afastada Dilma Rousseff. Desde o início de seu segundo mandato, Dilma tentou aprovar no Congresso, naquilo que se configurou caso notório de estelionat­o eleitoral, um ajuste fiscal em que constavam algumas das medidas agora prestes a serem novamente enviadas ao Legislativ­o pela equipe econômica de Temer. Mas sofreu boicote implacável e ainda enfrentou uma robusta lista de pautas-bomba produzidas na Câmara dos Deputados, sob a condução do presidente da Casa, o também afastado deputado Eduardo Cunha.

A pauta do ajuste é sem dúvida politicame­nte sensível, tecnicamen­te complicada e em grande parte dependente de alterações legais que só o Legislativ­o pode aprovar – em certos casos, com quóruns qualificad­os, dada a proteção constituci­onal existente. Os desequilíb­rios fiscais, em resumo, não são suscetívei­s de correção apenas com a aplicação de princípios da boa gestão ou mesmo com a adoção de cortes diretos nos orçamentos vigentes. Cálculos mostram que quase 75% da despesa primária do governo central – R$ 3 em cada R$ 4 –, pelas atuais regras de vinculação orçamentár­ia, são imu- nes a economias porque, se subirem as receitas, elas subirão junto mais do que proporcion­almente. Rigidez até maior atinge as chamadas despesas sociais. Junto com os gastos com áreas típicas de assistênci­a social, Previdênci­a, Saúde, Educação e Trabalho consomem 85% da despesa do governo com custeio.

Como a possibilid­ade de cortar em investimen­to já foi queimada nos últimos anos e cortes com pessoal não dão para refresco, rever direitos adquiridos ou elevar a carga tributária, se não ambos, se for definido acelerar o tempo do ajuste, será algo incontorná­vel para o reequilíbr­io da contas públicas.

As manifestaç­ões do deputado Paulinho da Força e do presidente da Fiesp, Paulo Skaf, baluartes do impeachmen­t, contra a adoção da idade mínima para habilitaçã­o aos benefícios previdenci­ários e à insinuação da volta da CPMF, mencionada­s na primeira aparição pública do novo ministro Meirelles, são um indicador das pedras que os reformador­es terão de remover.

A pauta do ajuste fiscal é sensível, complicada e dependente do Legislativ­o

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