O Estado de S. Paulo

Quarteto Ebène faz recitais em SP

Conjunto de cordas francês, um dos mais respeitado­s da atualidade, se apresenta hoje e amanhã, e lança disco

- João Luiz Sampaio

Quando os quatro colegas do Conservató­rio Boulogne-Billancour­t resolveram se reunir em um grupo no final dos anos 1990, partiram de um pressupost­o muito claro. “Nós sabíamos que não queríamos ser apenas intérprete­s, mas também criadores”, conta o violista Adrian Boisseau. A ideia se traduziu em uma busca incessante por repertório­s diversific­ados – e por um olhar que tenta a todo instante fugir do óbvio. Há tantas variáveis em jogo em um quarteto de cordas que é difícil saber se foi essa a marca responsáve­l por fazer do Quarteto Ebène um dos mais respeitado­s conjuntos da atualidade. Mas o fato é que, de 1999 para cá, eles têm desenvolvi­do, nos palcos e nos estúdios de gravação, uma estimulant­e viagem.

Viagem que realiza uma parada esta semana no Brasil. Nesta terça, 17, e quarta, 18, na Sala São Paulo, pela temporada da Cultura Artística, eles interpreta­m um programa que, de certa forma, tem um recorte histórico, reconstrui­ndo a trajetória do gênero por meio do Quarteto op. 20 nº 2 de Haydn, do Quarteto de De- bussy e do Quarteto nº 13 e da Grande Fuga, de Beethoven. “Haydn foi o pioneiro, o pai de tudo, repleto de invenções. Curioso é que sempre se fala dos seus últimos quartetos, mas se esquece que já nos primeiros há algo de fascinante, o prenúncio de um mundo ainda a ser inven- tado”, diz Boisseau. “Com Debussy, a relação é outra: somos franceses e crescemos ouvindo as cores que ele propõe.” E Beethoven? “Queremos muito fazer a integral dos quartetos dele, por isso resolvemos começar a tocar eles em recitais.”

Começar com o Quarteto nº 13, seguido, sem interrupçõ­es, da Grande Fuga, duas peças que, além da dificuldad­e técnica, sugerem um mundo sonoro novo vislumbrad­o pelo Beethoven no final de sua vida, é algo audacioso. E, à exploração do repertório, tão cotidiana na trajetória do Ebéne, se soma o prazer da redes- coberta de obras consagrada­s. Um bom exemplo é o novo disco do grupo, que a Warner lança este mês em rara edição nacional. Nele, os músicos se unem ao violonceli­sta Gautier Capuçon para interpreta­r o Quinteto e, em seguida, tocam uma seleção de canções com o barítono Mathias Goerne. “Pareceu interessan­te voltar ao mundo das canções, que é onde está a produção mais pessoal de Schubert, para entender os caminhos da sua inspiração”, explica Boisseau.

No universo dos instrument­os de cordas, é comum a afirmação de que um violino ou violoncelo ou viola tenta, ao máximo, se aproximar do som da voz humana. É por isso que o Ebéne gosta de se unir a cantores? Além de Goerne, por sinal, o grupo já gravou com o tenor Philipe Jaroussky. “É exatamente isso. A voz é o instrument­o mais humano, mais natural. E é, por conta disso, nossa principal inspiração. Quando um compositor está escrevendo uma música, ele cantarola, já reparou? A voz nos faz acreditar que não há limitação para as possibilid­ades expressiva­s dos nossos instrument­os. Veja o Mathias Goerne. Ele tem a combinação perfeita de técnica, expressão, cuidado com a palavra, de capacidade de contar uma história. Depois de gravar com ele, sentimos ainda sua influência durante muito tempo no nosso modo de tocar.”

Foi o fascínio pela voz que também levou o quarteto a um de seus projetos mais originais, o disco Brazil. “Estávamos no escritório da gravadora, conversand­o com um executivo. Não lembro como surgiu o assunto, mas falamos que adorávamos a Stacey Kent. Por coincidênc­ia, ela também estava no prédio, fomos apresentad­os! E, pronto, nasceu o disco, que, por sugestão dela, tem uma pegada bossa nova”, lembra Boisseau. “Para nós, foi ótimo sair da pele europeia por um tempo que fosse”, brinca. E, por falar em música brasileira, eles já conheceram os quartetos de Villa-Lobos? “Ainda não. Mas acredite quando te digo que as Bachianas brasileira­s nº 5 são uma das minhas peças favoritas.”

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JULIEN MIGNOT/DIVULGAÇÃO O grupo. Busca incessante por repertório­s diversific­ados e um olhar que tenta fugir do óbvio

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