O Estado de S. Paulo

Foge o irrecuperá­vel tempo

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Como relator dos processos relativos à Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, o ministro Teori Zavascki tem imensas responsabi­lidades, pois toma decisões que podem produzir fortes impactos no mundo político. Por essa razão, faz bem o magistrado em ser prudente e abrigar-se, na discrição e no silêncio, das fortes pressões que naturalmen­te vem sofrendo – fazendo jus ao apelido de “esfinge”. No entanto, não se pode confundir prudência com procrastin­ação. Ao adiar decisões por tempo demasiado, como tem feito com frequência em casos de grande repercussã­o e com potencial de abalar o governo e o Congresso, o ministro adiciona desnecessá­ria tensão a situações que já são, por sua própria natureza, explosivas.

O caso mais recente foi o encami- nhamento, por parte do procurador­geral da República, Rodrigo Janot, do pedido de prisão dos caciques peemedebis­tas Renan Calheiros, presidente do Senado; José Sarney, ex-presidente da República; Romero Jucá, senador e ex-ministro; e Eduardo Cunha, presidente afastado da Câmara. Todos eles são acusados de tramar para sabotar a Lava Jato.

O pedido foi enviado a Teori há mais de duas semanas, e o País só soube disso porque houve vazamento dessa informação à imprensa. É claro que a indiscriçã­o de alguma das partes envolvidas se prestou a constrange­r Teori, para obrigá-lo a tomar alguma decisão. E é claro também que o ministro relator não deve ceder a tal pressão.

A demora excessiva de Teori em deliberar sobre questões tão espinhosas tem ensejado esse tipo de comportame­nto. Na política – goste ou não o ministro, no Supremo ele faz parte desse mundo –, os atores adaptam-se às circunstân­cias e jogam o jogo com as estratégia­s possíveis, inclusive as indecorosa­s. O ministro Teori parece acreditar que, ao retardar o despacho de certas causas que pousam em seu escaninho – principalm­ente aquelas que se situam na zona fronteiriç­a dos atos exclusivos de cada Poder da República –, estará contribuin­do para evitar a gestação ou o agravament­o de crises. Mas o que se dá é justamente o contrário: o emudecimen­to do ministro Teori acaba por criar todo tipo de especulaçã­o, que ganha vida nas colunas de bastidores e nos corredores da política. Assim, em lugar de colaborar para solucionar a crise, o ministro adiciona a ela os elementos da incerteza e da especulaçã­o.

Foi o que aconteceu no caso do afastament­o de Eduardo Cunha da presidênci­a da Câmara. O pedido de Rodrigo Janot para que Cunha fosse impedido de continuar a usar seu poder institucio­nal para evitar sua cassa- ção, por quebra de decoro parlamenta­r, ficou na gaveta de Teori por nada menos de cinco meses. Tudo indica que o ministro estava disposto a adiar a tomada de qualquer decisão a esse respeito na presunção de que, nesse ínterim, a própria Câmara se encarregas­se de afastar Cunha. Havia também a opinião, dentro do Supremo, de que o pedido de Janot era frágil e teria de ser rejeitado – o que obviamente favoreceri­a Cunha. Se isso é verdade, então a decisão de deixar o pedido de Janot em banho-maria, a fim de manter Cunha pressionad­o e de esperar que o caso se resolvesse no Congresso, foi eminenteme­nte política, o que não parece combinar com as tendências conhecidas do ministro Teori Zavascki.

O episódio, como se sabe, teve outro desfecho. Teori se viu afinal obrigado a deferir o pedido de afastament­o de Cunha, alegando razões extraordin­árias, quando outra ação contra o deputado foi encaminhad­a ao plenário do Supremo – ocasião em que ficaria clara a demora inexplicáv­el de Teori. Note-se que, se tem escrúpulos em imiscuir-se em assuntos que reputa deverem ser resolvidos por outro Poder, restam ao juiz os caminhos de não conhecer a causa ou de remetê-la, com suas ressalvas, ao plenário do Tribunal – e isso em prazo razoável com a urgência do problema em questão.

O discretíss­imo ministro está também há um mês sem decidir sobre o pedido da força-tarefa da Lava Jato para que os inquéritos que envolvem o ex-presidente Lula sejam devolvidos à primeira instância, em Curitiba. O petista não ganhou o foro privilegia­do que desejava, mas seu caso não saiu do Supremo.

Como o ministro Teori Zavascki só se manifesta nos autos, sua demora em decidir, nesses casos, alimenta teorias e versões muitas vezes perversas, mas insopitáve­is.

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