O Estado de S. Paulo

Promessas vãs, ao vento

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Não bastasse deixar a economia destroçada e um saldo de 11,5 milhões de desemprega­dos, a presidente afastada Dilma Rousseff vem agora prometer “um novo governo” para a minoria que apoia cegamente o PT e acenar com um plebiscito sobre eleições antecipada­s para tentar seduzir os senadores que votam o impeachmen­t definitivo.

Novo governo a esta altura? E eleições já? Seria brincar com fogo. Os candidatos não se sabe quais serão, mas o Congresso e os partidos continuarã­o os mesmos, acossados por denúncias e acordando todas as manhãs assombrado­s por novos inquéritos ou pedidos de prisão. O presidente sai, a crise fica. Melhor dar dois anos e meio para o governo interino tourear a economia e a Lava Jato limpar o terreno.

Como Dilma não tem liderança nem capacidade de iniciativa, são arroubos tardios, que carecem de credibilid­ade e não têm sustentaçã­o na realidade. Logo, são promessas vãs, palavras jogadas ao vento. Afora uma ou outra publicação no exterior, o mundo político não dá mais ouvidos a Dilma, nem acredita na sua volta espetacula­r ao poder.

Segundo o tucano Aloysio Nunes Ferreira, líder do governo interino no Senado, nem os petistas querem derrubar o impeachmen­t. E provoca: “Quais os candidatos do partido que vão querer Dilma nos palanques em outubro? O Fernando Haddad vai querer em São Paulo?”

Enquanto Dilma fala, o PT age, lambendo as feridas, rearticula­ndo-se para seu novo momento, recuperand­o energia como oposição e traçando cenários futuros, muitas vezes em paralelo à sua cúpula formal.

O presidente nacional do partido, Rui Falcão, convocou uma greve geral para sexta-feira, e o que se viu? As centrais aliadas reconhecer­am a inviabilid­ade e a greve foi trocada por manifesta- ções. São Paulo vivia mais um dia corrido, como qualquer outro, enquanto Michel Temer almoçava em Brasília com as centrais não petistas, acertando uma pauta comum.

Além dessa polarizaçã­o interna, vivemos em dois mundos. Um no Brasil, onde a Lava Jato segue seu rumo, quem deve teme, Eduardo Cunha caminha para o cadafalso, as instituiçõ­es funcionam, a nova oposição comporta-se como oposição e o governo interno vai, aos trancos e barrancos, desenhando uma direção para a economia.

O outro mundo é no exterior, onde há uma justa perplexida­de com a qualidade ética da cúpula do PMDB e onde as conexões petistas são mais organizada­s e ágeis. As versões “de esquerda” e as teses “libertária­s” têm mais apelo e glamour, a ponto de levar cinco gatos pingados (sem tirar nem por) a protestar nos portões da Casa Branca contra o “golpe” no Brasil. Seria cômico, não fosse patético.

Jantando emBrasília, na semana passada, um respeitado analista político dos EUA registrou sua surpresa: “Não há toque de recolher, não vi tanques nem soldados, o Supremo funciona, a Câmara e o Senado também, a imprensa é livre, opresident­e interino faz reuniões de traba- lho, a presidente afastada fala o que quer. Cadê o golpe?” Boa pergunta.

Para tentar um equilíbrio melhor entre o mundo interno e o mundo exterior, Temer reforça as equipes de comunicaçã­o do Planalto e do Itamaraty com a mídia internacio­nal, mas cheio de dedos para tocar num ponto delicado: quem, e como, financia militantes do MST ou da CUT para protestos, por exemplo, em Paris e São Francisco?

O governo Temer está a léguas da unanimidad­e, enfrenta pressões do capital e do trabalho, depende de um PMDB recheado de candidatos à prisão. Seu trunfo é ter equipe econômica, instrument­os e chance de estancar a recessão. Mas o tempo corre e, depois de confirmado o impeachmen­t, vem outra etapa. Não necessaria­mente mais fácil.

Plebiscito? Novo governo Dilma? São arroubos tardios e sem credibilid­ade

Fim de linha. STF, Moro, PT, PSDB e seus aliados diretos fecham o cerco sobre Eduardo Cunha, atingindo até sua único ponto fraco: a família. É questão de tempo.

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