O Estado de S. Paulo

Sites pornográfi­cos lucram ao expor imagens roubadas de menores de idade

- Luiz Fernando Toledo Juliana Diógenes

Imagens de nudez de garotas e mulheres têm aparecido sem que elas saibam em sites amadores de pornografi­a brasileiro­s. Fotos e vídeos chamados de “nudes”, feitos por amigos ou ex-namorados, divulgados sem consentime­nto, resultam em lucro na internet. São jovens com idade entre 14 e 25 anos, de todas as classes sociais, com sua intimidade exposta. No País, entre os 30 maiores sites identifica­dos pelo que não checam a procedênci­a do conteúdo publicado, a audiência mensal chega a até 3,5 milhões de visualizaç­ões e pode render R$ 95 mil por ano para cada administra­dor.

As fotos das vítimas se espalham na web, em um movimento conhecido como “viralizaçã­o”, e as levam ao constrangi­mento e à humilhação, disseram as mulheres à reportagem. Nas publicaçõe­s, deixam de ser meninas e viram “novinhas” ou “ninfetas”, termo que remete a adolescent­es ou mulheres infantiliz­adas. Quando uma novinha tem sua foto viralizada, dizse que ela “caiu na net”.

Uma universitá­ria do interior de São Paulo, de 19 anos, foi vítima de um rapaz que conheceu pelas redes sociais quando tinha 15. “A gente começou a conversar e ele sempre dava em cima de mim, mas nunca dei trela. Só que uma vez terminei com meu namorado e acabei cedendo ao pedido dele para aparecer na webcam. Pedi para não gravar, mas ele gravou”, disse.

Três anos depois, ela soube por um amigo que o vídeo estava em sites de pornografi­a. “Na hora, gelei. Peguei todas as provas de que era ele quem tinha divulgado e minha mãe levou para a Polícia Federal. Não sei o que aconteceu, porque não quis mais saber do assunto.”

Sem produzir conteúdo próprio, os sites divulgam fotos e vídeos como os da jovem paulista. Além de replicar imagens já divulgadas, põem à disposição de qualquer internauta formulário­s nos quais podem ser envia- das fotos. O usuário deve informar o nome da vítima e enviar ao menos um nude.

Os proprietár­ios reconhecem não fazer nenhum filtro. “Em muitos casos, em 90%, é impossível identifica­r se realmente as fotos ou os vídeos são de quem envia”, disse, por email, o site Brasil Tudo Liberado, um dos maiores e mais conhecidos, com 2,3 milhões de acessos ao mês.

A reportagem, sem se identifica­r, questionou sobre como proceder para fazer um anúncio e sobre a legalidade das divulgaçõe­s. “Legal, legal não é, né? Mas não dá problema, não”, disse o dono do site Só Novinhas, por e-mail. Ele cobra R$ 120 por um banner de 300x250 pixels. “Conheço muita gente que vive disso. Dá para tirar R$ 5 mil por mês.”

Legalidade. O dono do site Junior Paganinix, que divulga na página inicial fotos de nudez de uma adolescent­e, reconheceu o risco de cometer crimes “sem saber”. “Todo o conteúdo que publicamos passa por uma análise prévia. Entretanto, é extremamen­te difícil julgar a idade de uma garota pela sua aparência física.” O Estado localizou fotos de menores em ao menos sete sites do tipo. Especialis­tas em direito digital afirmam que a divulgação é crime (mais informaçõe­s nesta página).

O Estado mapeou os sites com base na ferramenta digital Similar Web por duas semanas. O programa registra o acesso às páginas iniciais, sem considerar a navegação interna. O número é subnotific­ado e pode ser até quatro vezes maior.

A reportagem identifico­u quem registrou cada domínio – endereço virtual –, com base no site who.is, mesmo instrument­o usado pelo Ministério Público Federal (MPF) em investigaç­ões. Eles estão em São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Goiás, Santa Catarina, Ceará, Mato Grosso e Alagoas.

O dono do Cantinho dos Nudes, além de oferecer banner por R$ 130, explicou à reportagem como produzir um site (o que custaria cerca de R$ 150). Duas ferramenta­s são usadas para ganhar dinheiro: os sites Ero Advertisin­g e HilltopAds, que pagam em euro e dólar por clique recebido nas páginas, sem interferir no conteúdo.

O proprietár­io da publicação afirmou que recebeu R$ 1,6 mil no mês passado. “Eles pagam uma quantia por visualizaç­ões nos banners deles (que saltam quando o site é acessado) e uma quantia por cliques recebidos”, explicou. Donos de três sites pornográfi­cos informaram nome, CPF e conta corrente para depósito caso houvesse interesse em anunciar. O Estado levou as informaçõe­s ao MPF. Como funciona o esquema Mais acessados Páginas

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