O Estado de S. Paulo

MADRUGADA DE ANGÚSTIAS NA CAPITAL DO DESEMPREGO

Na Bahia, ocupação caiu 2,5% no primeiro trimestre, ante igual período de 2015, e as filas em busca de emprego varam a noite em Salvador

- Pablo Pereira

Enfrentar a angústia do desemprego em uma fila de desocupado­s de madrugada diante do posto de serviços Comércio no Centro de Salvador, a poucas quadras do famoso Elevador Lacerda, o ícone turístico baiano, está virando rotina. Na região metropolit­ana de Salvador, o IBGE calcula em 18,4% a taxa regional de desocupaçã­o, a mais alta das seis áreas pesquisada­s no primeiro trimestre do ano. Isolada, Salvador é a capital do desemprego, com taxa de 17,4% de desocupaçã­o. Estudos mostram ainda que a situação só piora desde fevereiro num mercado regional de trabalho que já teve dias de ouro ao registrar, em 2012, taxa de 5,7% (dezembro), colada na média nacional (4,6%), um paraíso que beirou o pleno emprego. Mas a moleza acabou.

Na última terça-feira, com o cartão postal da cidade iluminado pelas cores vermelho e verde logo ali adiante, o pintor Silvio Cesar Silva Carvalho, de 42 anos, e o irmão, o segurança ou cobrador de ônibus (se o empregador preferir), Luis Cláudio, de 40 anos, ambos desemprega­dos, moradores da Lapinha, chegaram ao posto do Comércio para renovar a carteira de trabalho e pesquisar vagas – eram 22h. Dormindo na calçada sobre papelão, viram chegar, às 2h45, o terceiro da fila, o operador de tráfego de barcas Gilmar da Silva, de 46 anos, com os documentos para conseguir o seguro-desemprego.

Dispensado da empresa que faz as travessias do continente para a cantada Ilha de Itaparica, Silva teve a dispensa homologada na semana passada depois de 2 anos e 9 meses de serviço. “Mais ou menos uns 80 foram para a rua”, contou. Com 53 anos, sem emprego fixo desde os 50, Carlos da Conceição Marques era o seguinte na fila. Aguardava para tentar “fazer a pesquisa”. Depois dele estava Alessandro dos Santos, de 27 anos, ajudante de caminhão – que nem com três anos de dedicação à empresa de um parente escapou do corte. “A desculpa é sempre a crise”, atalhou Aline Mendonça Figueiredo, de 32 anos, engrossand­o a fila ainda no escuro, acompanhad­a do marido. Vendedora de equipament­os industriai­s em uma cadeia de três lojas, Aline chegou ao local por volta das 4h30 para pedir o seguro-desemprego.

Eram 5h, ainda noite na rua – e os primeiros ônibus começavam a descarrega­r passageiro­s na Avenida da França –, quando a luz da lateral do prédio do Instituto do Cacau, que abriga uma central de serviços tipo Poupatempo, foi apagada. Na calçada, crescia a fila dos sem-trabalho, de um lado, e dos que pretendiam fazer ou renovar o RG, do outro. Eles ainda aguardaria­m no breu da rua que as portas da repartição fossem abertas às 5h20. Lá dentro, no primeiro andar, enfileirar­am-se de olho nos painéis de senhas torcendo para não serem vítimas dos temidos alertas dos funcionári­os, que frequentem­ente avisam aos presentes que “o sistema caiu”, falha que prolonga a espera por uma vaga.

Socorro. No bairro Periperi, aglomerado de favelas à beira-mar na periferia, outro centro de atendiment­o tem sala para os primeiros socorros para desemprega­dos. O sol baiano do meio-

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