O Estado de S. Paulo

O orçamento do conserto

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Oprimeiro ato do novo governo foi entregar ao Congresso a proposta de lei orçamentár­ia de 2017, poucas horas depois de concluído o processo de impeachmen­t da presidente Dilma Rousseff. Juntamente com a chefia do Executivo, o presidente Michel Temer assumiu de forma definitiva o encargo de iniciar o conserto da economia nacional, destroçada por uma longa série de erros e de atos irresponsá­veis e até criminosos. A tarefa começa com um plano de limpeza e de arrumação das contas públicas. A primeira etapa desse plano está inscrita no projeto de Orçamento-Geral da União, elaborado, segundo o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, de forma realista e conservado­ra. Mas será indispensá­vel avançar com rapidez em outras áreas, com medidas para reativar o investimen­to e dinamizar os negócios e, muito especialme­nte, implantar o já anunciado programa de reformas. Quanto mais pronta a ação do governo, na apresentaç­ão e na implementa­ção de sua agenda, tanto mais provável será seu sucesso.

Trabalhar pela criação de empregos deve ser a grande missão dos ministros nos próximos dois anos e quatro meses, até o fim deste governo, disse o presidente Michel Temer a seus auxiliares, na primeira reunião ministeria­l. Nenhum emprego produtivo será criado por milagre ou por um ato voluntaris­ta, sabe o presidente, e sua recomendaç­ão inicial a seus auxiliares tem um valor sobretudo simbólico. Para abrir oportunida­des de trabalho aos quase 12 milhões de pessoas hoje desocupada­s será preciso reconstrui­r o sistema produtivo e, como condição incontorná­vel para quase todo o resto, pôr em ordem as contas do setor público.

Este é o compromiss­o básico da nova política fiscal. A proposta de lei orçamentár­ia para 2017 ainda inclui a perspectiv­a de um enorme déficit primário – de R$ 139 bilhões. Se tudo der certo, será um avanço consideráv­el em relação ao resultado previsto para este ano, um buraco de R$ 170,5 bilhões. A proposta para o próximo ano é baseada na expectativ­a de um cresciment­o econômico de 1,6% (depois de u ma c o n t r a ç ã o d e 3 % e m 2016) e de inflação de 4,8%. A despesa total estará abaixo do limite correspond­ente à inflação deste ano, estimada, por enquanto, em 7,2%.

A receita deverá provir do aumento de arrecadaçã­o propiciado pela maior atividade e também de concessões, permissões e vendas de ativos. O déficit primário de R$ 139 bilhões deverá resultar da combinação de um superávit de R$ 42,25 bilhões nas contas do Tesouro Nacional e de um buraco de R$ 181,25 bilhões na Previdênci­a. Se as projeções se confirmare­m, o Tesouro voltará a ser superavitá­rio depois de dois anos no vermelho.

O conserto das contas públicas será necessaria­mente gradual. Do ponto de vista contábil, o objetivo é retornar à geração de superávits primários suficiente­s para cobrir a conta de juros, estabiliza­r e em seguida reduzir a relação entre a dívida pública e o Produto Interno Bruto (PIB). Enquanto houver déficit primário essa relação tenderá a crescer, dificultan­do a melhora da classifica­ção do Brasil na escala de riscos de crédito. Mas a imagem do País deverá melhorar bem antes disso, se a política de ajuste for conduzida com firmeza e credibilid­ade.

Do ponto de vista econômico, a arrumação das contas públicas deverá ser vinculada a uma melhora da administra­ção e, portanto, a uma aplicação mais eficiente das verbas disponívei­s. Isso dependerá também da aprovação da proposta de criação de um teto para o aumento das despesas.

Confiança será igualmente fundamenta­l para a retomada do investimen­to na infraestru­tura e também na atividade privada. Empresário­s, analistas e operadores do mercado estarão de olho principalm­ente nas ações do presidente e do ministro da Fazenda. Mas o sucesso de suas iniciativa­s dependerá em boa parte do apoio parlamenta­r. O grupo despejado do Palácio do Planalto promete fazer o possível para atrapalhar. Também por isso o presidente Michel Temer precisa agir com rapidez.

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